São Paulo, terça-feira, 28 de dezembro de 2004

Texto Anterior | Índice

FUTEBOL

Ingresso caro e violência

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE OPINIÃO

Ingresso caro e violência nos estádios foram as duas explicações escolhidas por dirigentes, técnicos e jogadores para a queda de público no Campeonato Brasileiro deste ano, segundo enquete realizada pela Folha. Foi a pior média da história: apenas 8.085 torcedores por partida.
Antes de discutir as causas desse fenômeno, que não tem nada de novo, falemos um pouco sobre as conseqüências. A mais óbvia é o desperdício de uma fonte fundamental de receita para os clubes -a bilheteria. Esse é um problema que se tornou crônico no futebol brasileiro. Enquanto na Europa a bilheteria pode representar mais de 40% dos recursos dos clubes, aqui depende-se cada vez mais da venda de direitos para a TV e transferência de jogadores.
Um outro aspecto negativo reside no fato de que a perda de público é também a perda de uma "cultura": pais que deixam de levar seus filhos aos estádios interrompem o processo de renovação de público. O hábito de ir ao campo torna-se descontínuo e rarefeito. Não raro, pais que se enchem de coragem e elegem uma partida importante para ir com a família ao estádio acabam se arrependendo. O resultado é que se vai criando, especialmente na classe média, o torcedor de TV.
Não há dúvida de que a insegurança é uma das principais causas do esvaziamento. Não se trata apenas da violência dentro dos estádios, mas no caminho de ida e volta. O futebol como espetáculo ao vivo ficou no Brasil muito atrás de outras opções de lazer em termos de acesso e conforto.
Na grande maioria dos estádios, tudo conspira contra o público: meios de transporte públicos precários e lotados, ausência de estacionamento, assentos ocupados por terceiros etc. Não há cidadania, não há respeito ao consumidor. É como se os clubes não precisassem de público, tão mal tratam seus torcedores.
Quanto ao preço do ingresso, nessas condições, ele é de fato muito caro. A alternativa do chamado ingresso popular, no entanto, se realmente aumenta o público, acaba reproduzindo a desigualdade e o preconceito: para os mais pobres, que têm menos alternativas de lazer, podem-se oferecer péssimas condições que eles topam, desde que seja baratinho.
Não creio que no Brasil seja desejável simplesmente reproduzir o modelo europeu que elitizou o acesso ao campo. É preciso chegar a uma forma conciliadora, que reserve espaço para o público de menor poder aquisitivo e ofereça à classe média alternativas a preços mais altos.
O fundamental, no entanto, é que todos sejam tratados dignamente e que haja condições decentes de segurança, acesso e conforto. O Estatuto do Torcedor foi uma tentativa de melhorar a situação. Mas no Brasil as leis, como se sabe, nem sempre "pegam".
Ou os dirigentes se organizam com os representantes do poder público e com grupos de investidores para mudar esse modelo ou continuaremos no círculo vicioso: estádios anacrônicos e vazios, clubes pobres, êxodo de jogadores, times medíocres e assim por diante.

Tite fica?
Eleito o melhor treinador do Brasileiro pelo Júri Folha e tantos outros cronistas esportivos, Tite, ao que tudo indica, chegou a um acordo com o Corinthians e vai ficar. Apesar de ser o preferido de alguns representantes da diretoria, ele já havia entrado em conflito com a nova parceira do clube, a MSI, que sonhava com Vanderlei Luxemburgo. Chegou a dizer que o negócio com a empresa representada pelo iraniano Kia Joorabchian era "antiético", mas acabou cedendo. Não se sabe se isso quer dizer que tenha mudado de opinião. De qualquer forma, para o time é melhor assim. Tite faz ótimo trabalho no Corinthians. Resta saber se o futuro lhe reservará dias de glória ou de intromissões e confusões. Mas com dinheiro no bolso, tudo fica mais suportável.

E-mail mag@folhasp.com.br


Texto Anterior: Basquete - Melchiades Filho: Penso, logo existo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.