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Luvas de cetim
Os dois mundos de um campeão de boxe
Emile Griffith, dono de 6 cinturões, é 1º campeão a admitir homossexualismo
Em livro, membro do Hall da Fama fala sobre opção sexual e lamenta morte de rival que pôs em coma após ser chamado de "maricón"
EDUARDO OHATA
DA REPORTAGEM LOCAL
Membro do Hall da Fama, ele
levantou seis títulos mundiais
no mais viril dos esportes, o boxe. E foi também o primeiro
campeão a admitir seu homossexualismo, por meio da recém-publicada biografia, ""Nine... Ten... And Out!", que mostra o trânsito de Emile Griffith,
70, por seus ""dois mundos".
Essa encruzilhada, porém,
deixou como legado conseqüências trágicas: Após ser xingado de ""maricón" [homossexual, em castelhano], o nativo
das Ilhas Virgens radicado nos
EUA, de sorriso fácil e maneiras gentis, pôs em coma no ringue o cubano Benny ""Kid" Paret, que morreu dias depois.
Griffith era, segundo conhecidos, pessoa ""boa demais",
com senso de prioridades incomum, segundo o autor Ron
Ross, que foi também consultor
do documentário ""Ring of Fire", sobre a vida do pugilista.
Não foram raras as vezes em
que faltou a entrevistas para
promover uma de suas lutas
por causa de outro compromisso: Dirigir a equipe de beisebol
""The Griffs". Afinal, não poderia decepcionar os meninos carentes que integravam o time.
Em outro episódio, enquanto
o manager de um de seus adversários alertava para os ""golpes sujos" de Griffith, o pugilista elogiava os bifes do restaurante do tal empresário, do qual
era freqüentador assíduo. ""Por
US$ 1,99, o prato vem ainda
com salada e fritas", festejou.
Outro detalhe que ajudou a
compor aura exótica em torno
de Griffith foi seu passatempo:
designer de chapéus. (Antes de
calçar as luvas, Griffith trabalhava na fábrica de chapéus de
seu manager, Howie Albert).
Apesar de haver burburinho
sobre as preferências sexuais
de Griffith -mesmo após ter se
casado e ter sido pai afirmava-se que era uma ""fachada"-, o
lutador jamais havia reconhecido. Temia ferir a mãe, Emelda, e seu técnico, Gil Clancy.
O restante da família, porém,
tinha conhecimento de seu estilo de vida. Um de seus maiores críticos era Franklin, seu irmão, que também ficou chateado por Griffith ter parado de
pagar sua faculdade. Mas quando isso ocorreu foi porque
Franklin havia se casado e sido
pai. Griffith acreditava que, no
caso, o irmão tinha de aprender
a ser responsável pela família.
Griffith considerava Paret
um amigo, ou ao menos um
igual: eram imigrantes de países da América Central, e seguiam trajetórias semelhantes.
Por isso o comportamento do
cubano na cerimônia de pesagem para seu segundo e terceiro combate o enfureceram.
Na primeira, Paret rebolou
enquanto apontava para o rival.
Na segunda, foi mais incisivo.
As imagens, chocantes, do
duelo, que teve transmissão ao
vivo pela TV, foram testemunhadas por aproximadamente
14 milhões de telespectadores.
No 12º assalto, Griffith atingiu 21 golpes consecutivos em
Paret, que àquela altura já tinha
metade do corpo para fora do
ringue e se mantinha em pé
graças somente à segunda corda. O cubano caiu, entrou em
coma e morreu dez dias depois.
O que se seguiu foi uma enxurrada de cartas, muitas delas
com ameaças. Mas não foi isso
o que mais perturbou Griffith.
Décadas depois, já figura assídua na comunidade gay, Griffith assumiu em 2006 a vice-presidência da Stonewall Veterans Association, uma associação homossexual de Nova York.
A Folha tentou agendar entrevista com Griffith, mas foi
informada por Ross que ele hoje sofre de problemas neurológicos e que por isso enfrenta dificuldade para se comunicar.
Ao perceber o tom de consternação da reportagem, o autor
informou: ""Emile está feliz. Vive em seu mundo, mas feliz".
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