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Scarface
Após quase largar o futebol, o meia Franck Ribéry surge como a revelação da França na Alemanha
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A HAMELN
Há dois anos, Franck Ribéry
disputava pelo Brest a terceira
divisão do Campeonato Francês, ganhava uns mil euros (R$
2.780) por mês e, desiludido,
pensava em largar o futebol.
Hoje o meia-atacante da
França é uma das revelações da
Copa, um fenômeno de popularidade em seu país e alvo da cobiça dos maiores clubes europeus. Autor do primeiro gol da
vitória por 3 a 1 sobre a Espanha que colocou os franceses
diante do Brasil nas quartas-de-final de sábado, Ribéry esconde por trás da sua enorme
cicatriz no rosto uma história
de vida que daria um livro.
"Scarface" ("Cara de Cicatriz", famoso filme com Al Pacino), apelido que ganhou da torcida turca do Galatasaray, nasceu há 23 anos em Boulogne-sur-Mer, cidade portuária no
norte da França.
Os nomes da sua infância hoje transbordam de simbolismo.
Cresceu no bairro pobre de
Chemin-Vert (Caminho Verde), no conjunto habitacional
Transition (Transição), uma
região de operários do porto e
da indústria siderúrgica.
Ribéry foi forçado a se dividir
entre os estudos, o futebol e o
trabalho, ajudando seu pai na
construção civil. Nessa época já
carregava a cicatriz, conseqüência de um acidente de carro quando tinha dois anos. Os
estragos atingiram a cabeça,
onde até hoje há um pedaço onde não cresce cabelo.
Foi assim, feio e estigmatizado entre os colegas, que deu
seus primeiros chutes, no Aiglons, o time da cidade. As marcas serviram de estímulo. Numa reportagem do jornal "Libération", o português José Pereira, um dos primeiros técnicos de Ribéry no Aiglons, conta
que a cara rachada "era provavelmente a sua força". "Ele dizia a si próprio: "Se vocês gozam
de minha boca, vou mostrar o
que faço no campo"."
À maneira de um Tevez francês (o argentino do Corinthians
também tem uma cicatriz e
também passou a infância num
conjunto habitacional pobre),
Ribéry sempre foi meio esquentado. "Sempre jogou muita bola, mas nunca foi disciplinado. Foi um garoto que cresceu na rua", diz Pereira.
Com 13 anos, foi jogar numa
escolinha em Lille, onde ficou
por três anos e de onde foi expulso por maus resultados escolares. Voltou à cidade natal,
ao Boulogne-sur-Mer, onde se
profissionalizou. Aos 18 anos
mudou-se para o Alès, da terceira divisão francesa, e ali jogou a temporada 2002-2003.
Em 2004 transferiu-se ao
Brest, da mesma divisão.
Tudo indicava que seria mais
uma carreira curta de um talento desperdiçado, até surgir
na história um certo Jean Fernandéz, técnico do Metz, da
primeira divisão, que viu um jogo do Brest e enlouqueceu com
o jovem veloz e driblador. No
dia seguinte já o levou para o
clube, por onde Ribéry disputou a temporada 2004-2005.
No ano passado, o Galatasaray (Turquia) o contratou. Chegou a virar ídolo, ganhar apelidos (além de Scarface, Ferraribéry, por sua velocidade). Mas,
após uma disputa de empresários que ainda se desenrola na
Fifa, o Olympique de Marselha,
sexto clube de sua curta carreira, o levou de volta à França.
Antes da Copa, Ribéry nem
aparecia na lista de prováveis
convocados. Três boas aparições, somando 56 minutos, e
respaldo popular (70% da
França o queriam no time) fizeram o técnico Raymond Domenech levá-lo à Alemanha. Estreou como titular no 0 a 0 com
a Suíça, mas não foi bem, e ficou
de fora no 1 a 1 com a Coréia do
Sul. Retornou nos 2 a 0 sobre o
Togo e começou a fazer jus ao
(por ora) exagerado título de
"novo Zidane", que confirmou
contra a Espanha.
No canto do cisne do maior
craque francês -Zizou vai se
aposentar ao final da Copa-, o
surgimento fulminante de Ribéry atiçou os franceses, que
crêem estar vendo a passagem
do bastão em pleno Mundial.
Contribuiu para a mística o
fato de o meia ter jogado sua
primeira partida completa pela
França na vitória por 1 a 0 em
amistoso contra o México em
maio, justo quando o ainda
"rei" Zidane fez seu centésimo
jogo pela seleção e se despediu
do Stade de France, palco dos 3
a 0 no Brasil na final de 98.
No bairro de Chemin-Vert,
onde visita familiares, Ribéry já
é tratado como rei. A depender
dos colegas, o lugar no trono da
seleção o aguarda. "Ele acrescenta muito ao time com sua vivacidade. Não tem medo de nada e é realmente bom. Tenho
certeza de que será alguém importante no futebol", elogia Zidane. "É fantástico o jeito que o
público o adotou imediatamente", completa Henry.
Com agências internacionais
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