São Paulo, sábado, 29 de julho de 2006

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JOSÉ GERALDO COUTO

A um passo do fascismo

As torcidas ditas organizadas agem muitas vezes como corpos sem cérebro, contra os interesses do próprio clube

TENTEI algumas vezes desafinar o coro dos que condenam em bloco as torcidas organizadas como bandos de arruaceiros violentos. Procurei ponderar que, num país de instituições desacreditadas e baixo grau de organização da sociedade civil, participar de uma torcida uniformizada pode ser um momento importante de socialização e aprendizado para amplos setores da juventude, sobretudo da que mora nos bairros mais pobres.
Algumas organizadas de grandes clubes, como a Gaviões da Fiel e a Mancha Alviverde, são entidades sócio-culturais que ultrapassam o âmbito estritamente esportivo: têm escolas de samba, desenvolvem atividades assistenciais etc.
Mas o fato é que existe, sim, um perigo latente nessas agremiações: o de fomentar e dar cobertura às manifestações mais selvagens do espírito de facção. Dependendo da situação, vestir uma camisa de organizada pode ser um salvo-conduto para agredir quem é de outro time (ou de outra torcida do mesmo), tombar carros, jogar bombas, fazer arrastões, ameaçar de morte.
Nada diferente, portanto, do que faziam -e ainda fazem- milícias paramilitares fascistas pelo mundo afora. Mudam os alvos de acordo com a cultura e o país: num lugar são os árabes, em outro os negros, em outro os judeus ou os gays. Mas a essência de ignorância e fúria cega, de pulsões juvenis mal compreendidas, é quase sempre a mesma.
Quando membros de uma organizada agridem rivais (geralmente quando estes últimos estão em menor número) ainda é possível minimizar o evento como caso isolado, que não condiz com os propósitos da entidade em questão. É discutível, mas deixemos passar por enquanto.
Muito mais grave, a meu ver, é quando vemos dirigentes dessas torcidas anunciarem que usarão todo o seu poder de fogo para "dar uma prensa" num determinado jogador ou dirigente. É o caso, no momento, da Gaviões da Fiel com Tevez. Um líder dessa que é a maior organizada de São Paulo chegou a dizer algo como: "Vamos atacar no ponto mais vulnerável, que é a vida pessoal".
Além de eticamente intolerável, a atitude me parece politicamente burra e contraproducente. Ora, Tevez é o principal jogador do Corinthians, um craque que tem honrado como poucos a camisa alvinegra com seu talento e sua garra. Até os alambrados do Pacaembu sabem que o Corinthians é um time com Tevez e outro sem ele.
Mas os "organizados" que se julgam donos do time -e cujas práticas selvagens afastaram dos estádios tantos torcedores autênticos- acham que um gesto de pedir silêncio à torcida justifica todo o tormento que puderem impor ao jogador.
Mais cedo ou mais tarde Tevez iria mesmo embora, por força das leis econômicas do futebol globalizado. Mas os verdadeiros corintianos deveriam ser os últimos a querer apressar essa partida. Ou não?

CLÁSSICOS ESVAZIADOS
A justificada prioridade que o São Paulo e o Inter estão dando à semifinal da Libertadores tem o efeito indesejado de esvaziar dois dos principais clássicos de amanhã: o San-São, no Morumbi, e o Gre-Nal, no Beira-Rio. Tricolores e colorados jogarão desfalcados, poupando atletas para os duelos da próxima semana. Já no Maracanã, Fluminense e Botafogo estarão focados, o primeiro tentando se manter perto do topo, o segundo buscando ficar pelo menos entre os dez primeiros.

JOGO DE CENA
A CBF está mais interessada em jogar para a torcida do que num trabalho de longo prazo. Os torcedores acharam que faltou fibra e liderança à seleção na Alemanha? "Traz o Dunga, que tem imagem de xerife. Se não der certo a gente troca." O ex-capitão que se cuide.


jgcouto@uol.com.br

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