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FUTEBOL
Perdeu o quê?
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
"O Brasil perdeu."
- O quê?
- O jogo.
- De quê?
- Do Paraguai, 1 a 0. O último
do Felipão.
As palavras que faltam acima
eram óbvias para o meu interlocutor - jogo de futebol, oras!-,
mas, sinceramente, não sabia o
que o Brasil tinha perdido. O rumo? A vergonha? A esperança?
Não, o jogo. De futebol, oras.
Meu informante, um americano (que adora futebol e adorou
seu oitavo lugar na Copa), trouxe
assim, abrupta e economicamente, a primeira notícia do mundo
exterior após semanas em que estive completamente fora do alcance de qualquer meio de comunicação -inclusive o boca-a-boca (não seria boca-a-ouvido?).
Como eu estava em um lugar
que valoriza a redução de tudo ao
mais simples, essencial; em que as
reações habituais da mente intempestiva são laboriosamente
apaziguadas, não tive muitos
pensamentos. Ou tive, mas menos
do que a torrente usual.
Perguntei (a mim mesma, não
era ocasião para esticar o assunto): Será que todos jogaram? O jogo foi horrível? O Paraguai jogou
muito bem? Os jogadores ficaram
chateados? O público reagiu com
indiferença, ironia, frustração ou
revolta? Os críticos do Felipão se
regozijaram com a derrota?
Parei por aí, deixei o assunto
pendurado em algum cabide para a volta a São Paulo e relaxei. A
não ser por um último pensamento: quer tenhamos jogado bem ou
mal, isso não prova nada.
Depois de saber que o dólar tinha passado dos R$ 3 e que houve
enchentes pavorosas na Iugoslávia, todas as outras notícias que
me apareceram no caminho de
volta também eram de esporte:
"O Inter estava ganhando do Botafogo por 2 a 0 e deixou empatar!" (eu estava no Rio Grande do
Sul, o que explica a relevância dada ao vacilo Colorado) e "O Pan-Americano vai ser no Rio".
Fiquei feliz com a última
-acho que o Brasil não tem condições de sediar uma Olimpíada,
mas um Pan está mais ao nosso
alcance. Os investimentos indispensáveis em instalações esportivas trarão muitos benefícios a
curto, médio e longo prazo, e a visibilidade do evento atrairá uma
atenção incomparável para as diversas modalidades em disputa, o
que é muito bom para os atletas,
eternamente em busca da sobrevivência, para os fãs de esporte e
para futuros atletas também.
Pena que oportunistas de todos
os tipos devem aparecer para tirar uma lasquinha, oferecendo
aquele apoio de ocasião ou comemorando conquistas que não são
suas (isso inclui políticos, empresários, dirigentes etc.).
O que preocupa, sempre, é a infra-estrutura urbana que temos:
trânsito, transportes, telecomunicações, essas coisas. O prefeito César Maia deu uma explicação curiosa para um item delicadíssimo:
"Só a área da Barra da Tijuca oferece segurança absoluta. Ela é
plana, pode ser patrulhada por
terra e ar, oferece quatro saídas e
não tem a presença de traficantes
em comunidades". Esse conceito
de segurança não me conforta
nem um pouco... Chegamos ao
ponto de considerar que uma região é "absolutamente segura"
porque é fácil vigiar as entradas e
saídas. Espero que um dia estejamos seriamente empenhados em
diminuir a violência, mais do que
em "aumentar a segurança". E o
esporte pode dar uma boa contribuição nesse sentido.
Zero quilômetro
Todas as outras notícias esportivas chegaram ao mesmo
tempo, e eu tive a sensação
muito divertida de ser completamente neófita no assunto, como se estivesse lendo a seção de turfe. As mesmas informações que, pingadas no
dia-a-dia, dão a impressão de
que tudo se repete, tudo é
muito monótono e previsível,
eram incríveis revelações, como se uma revolução tivesse
acontecido. Wanderley Luxemburgo saiu do Palmeiras?? Paysandu ganhou a Copa dos Campeões! Mário Sérgio é o novo técnico do São
Caetano? E o Jair Picerni, do
Guarani? O Galeano foi para
o Botafogo, e o Abel tá lá de
novo! Zinho no Palmeiras?! E
Dodô! Guilherme no Corinthians! Pet no Vasco!! E o Romário... no Fluminense! Delicioso esse espanto, esse frescor, que só o tempo e a distância podem proporcionar.
Férias, ah...
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
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