São Paulo, sábado, 29 de setembro de 2007

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JOSÉ GERALDO COUTO

A hora e a vez da mulher

É possível que num futuro próximo seja mais fácil ver arte no futebol feminino do que no masculino

NO FILME "Quanto Mais Quente Melhor", Jack Lemmon e Tony Curtis, vestidos de mulher para fugir de gângsteres, observam fascinados o andar bamboleante de Marilyn Monroe, de saltos altos, na plataforma de uma estação de trens. Mal conseguindo se equilibrar sobre os saltos, Lemmon pergunta: "Como é que elas conseguem? Devem ter um sistema especial de molejo embutido".
Por mais incongruente que pareça, lembrei dessa cena memorável ao assistir ao baile que as moças brasileiras deram nas americanas na semifinal da Copa do Mundo feminina de futebol. Foi o maior espetáculo futebolístico -de qualquer sexo- que vi nos últimos tempos.
Não foi por acaso que a CBF se curvou e o próprio Dunga se encantou com o jogo das meninas. Já é tempo de deixarmos de olhar o futebol feminino com uma condescendência superior e reconhecermos que elas podem ter sobre nós algumas vantagens dentro de campo.
Pois, se todos admitem que uma grande virtude num futebolista é o jogo de cintura, as mulheres estão muitos pontos à nossa frente nesse quesito. Cabrochas de escola de samba, bailarinas de dança do ventre... Que homem é capaz de requebrar como elas? Já que no futebol masculino predominam cada vez mais a força bruta e o condicionamento físico, a ponto de Tostão ter observado que o último grande atacante baixinho foi Romário, é possível que num futuro próximo tenhamos mais chance de encontrar a arte do futebol entre mulheres do que entre homens.
Um exemplo evidente: é muito mais bonito ver jogar a seleção feminina alemã, que amanhã faz a final contra o Brasil, do que a masculina.
E não me refiro apenas à beleza das pernas, mas ao jogo em si.
Um lance como o drible de Marta, que, de costas para a adversária, deu um toque de calcanhar, girou o corpo e foi buscar a bola do outro lado, é de fazer inveja até a um Ronaldinho ou a um Messi. Vai jogar bem assim na China (de preferência amanhã).
Dunga enfatizou o "espírito de sacrifício" das garotas. Tudo bem. Mas Marta, Cristiane, Formiga e companhia estão mostrando muito mais do que isso. Estão mostrando talento, ousadia, invenção e prazer de jogar. É isso o que as torna únicas. Sacrifício por sacrifício, qualquer brasileira da classe média para baixo também faz, e não é de hoje.
E bem feito para o técnico dos EUA. Um sujeito que magoa, deixando no banco uma mulher tão linda quanto a goleira Hope Solo, merece o pior dos castigos.

Emoções tricolores
O coração são-paulino se dividiu na quarta-feira. Os mais jovens festejaram a bela vitória sobre o Boca Juniors. Os mais velhos choraram a morte de um dos maiores ídolos da história do clube, Roberto Dias, zagueiro de classe incomparável. O leitor Bento Bravo faz uma sugestão ótima: trocar o nome do estádio do São Paulo de Cícero Pompeu de Toledo ("um bom dirigente, mas que nunca entrou em campo") para Roberto Dias. Nada mais justo. Roberto Dias carregou e tocou o piano do time na época de vacas magras, nos anos 60, quando todos os recursos do clube eram canalizados para a construção do estádio.


jgcouto@uol.com.br

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