São Paulo, domingo, 30 de julho de 2006

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Floresta Negra volta a ser uma floresta

Após reforma que diminuiu o traçado de Hockenheim, vegetação retoma seu antigo espaço e pista é usada para lazer

Foi no meio da mata que momentos históricos da F-1 ocorreram, como a morte de Clark, o grave acidente de Senna e os socos de Piquet

FÁBIO SEIXAS
ENVIADO ESPECIAL A HOCKENHEIM

Um senhor de cabelos e bigode brancos coloca força nos pedais e de repente freia, derrapando a roda traseira de sua velha bicicleta diante de um contêiner de venda de ingressos.
O local, um trecho de asfalto em meio à floresta. E a demonstração de perícia do veterano ciclista é das manobras mais radicais realizadas ali, agora.
Agora. E nos últimos cinco anos. Porque até 2001 aquela era a reta que sucedia a Ostkurve -em alemão, Curva Oeste. Naquele ponto, pouco antes da chicane batizada em 1995 em homenagem a Ayrton Senna, os carros de F-1 chegavam a alcançar os 345 km/h.
Uma história de 67 anos que está em parte soterrada, em parte coberta de mato, em parte só servindo como apoio para o novo -e insosso- traçado, riscado pelo badalado arquiteto alemão Hermann Tilke e inaugurado em 2002.
O GP da Alemanha, 12ª etapa da temporada, hoje, a partir das 9h (horário de Brasília), será o quinto em Hockenheim sem os seus trechos da Floresta Negra.
Trechos que se tornaram lenda. Eram dois arcos, de raio tão reduzido que na prática funcionavam quase como retas velocíssimas, com dois quilômetros cada um.
No seu ponto mais veloz, David Coulthard, ao volante de um McLaren, atingiu 356,5 km/h em 1998, então o recorde da categoria -hoje, é 367 km/h, marca cravada por Juan Pablo Montoya, em Monza, em agosto do ano passado.
Foi no meio da floresta que Jim Clark, um dos maiores mitos do automobilismo, morreu em 1968, numa prova de F-2 -um pneu estourou e ele arrebentou sua Lotus numa árvore.
Foi também no meio da floresta que Senna, no mesmo local, quase morreu em 1991. E da mesma maneira: um pneu estourou em um teste, seu McLaren decolou na zebra, voou por 5 metros e capotou. Com ferimentos no pescoço e no ombro, o então bicampeão de F-1 teve de ser hospitalizado.
Lembrança menos dramática, foi no meio da floresta, em 1982, que Nelson Piquet desferiu socos e pontapés no chileno Eliseo Salazar, que, retardatário, acertou seu Brabham, tirando-o da liderança -e do GP.
"A antiga Hockenheim era maravilhosa. Você tinha que ter um carro muito bom para as freadas e conseguia fazer ultrapassagens, coisa que não se vê hoje", recorda Rubens Barrichello, que conseguiu sua primeira vitória na F-1 justamente em Hockenheim, em 2000.
"O único problema é que, no meio da floresta, quando chovia, você não via nada. Mas, no geral, era muito melhor do que este circuito novo", completa.
Após a corrida de 2001, pressionada pela FIA (entidade máxima do automobilismo) a modernizar o autódromo, a Prefeitura de Hockenheim encomendou a reforma a Tilke, especialista em autódromos.
A solução foi simplista. Para adequar o traçado aos padrões da F-1, cortou 2,251 km das retas. De 6,825 km, a pista passou a ter 4,574 km. Deixou de ser especial para se tornar comum.
"O mais estranho é que, no meio da floresta, a pista era estreita, mas mesmo assim todo mundo conseguia ultrapassar. A nova perdeu a graça, virou um circuito normal, sem curvas velozes", diz Ricardo Zonta, piloto de testes da Toyota e que correu na antiga pista com a BAR e com a Mercedes, no Mundial de Grã-Turismo.
Para compensar os novos prédios e arquibancadas construídos, o governo local fez um acordo com ambientalistas e plantou árvores onde desde 1939 havia asfalto.
A Folha percorreu o trecho. Cinco anos após a destruição, o que sobrou da pista ou está começando a ser invadida pelo matagal ou serve de atalho para torcedores e veículos de serviço durante a prova. Ou para estripulias de velhinhos alemães em suas bicicletas.
GP da Alemanha Globo, ao vivo, às 9h


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