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FUTEBOL
Só pessoas que carregavam foto de Serginho puderam assistir ao enterro
Família cria senhas para ter paz no adeus a zagueiro
GUILHERME ROSEGUINI
ENVIADO ESPECIAL A CORONEL FABRICIANO
THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CORONEL FABRICIANO
"O Senhor guardará a tua saída
e a tua entrada." Estampado atrás
da foto de Serginho em um prospecto distribuído a seus parentes,
o trecho do Salmo 121 não figurava apenas uma mera homenagem
ao atleta do São Caetano.
O extrato da oração poética foi
seguido à risca na manhã de ontem. Só as pessoas que o carregavam em punho puderam entrar
no enterro do jogador.
A manobra foi arquitetada pelos parentes da mulher de Serginho, Helaine Cunha, e posta em
prática em parceria com a Polícia
Militar de Coronel Fabriciano (localizada a 215 km de Belo Horizonte), cidade mineira incrustada
no chamado Vale do Aço.
O objetivo: evitar tumulto e dar
privacidade à família na despedida do corpo do zagueiro, 30, que
morreu na última quarta-feira
após uma parada cardiorespiratória sofrida no segundo tempo
da partida contra o São Paulo, no
estádio do Morumbi.
O plano começou na madrugada. A população pôde acompanhar o velório no ginásio do clube
Casa de Campo até as 5h, quando
os portões foram fechados -30
mil pessoas passaram pelo local,
segundo a PM.
Por volta das 8h20, antes de o
caixão ser cerrado e levado para o
cemitério Vale da Saudade, começou a entrega dos "santinhos".
Além do Salmo 121, o preferido do
jogador no livro da Bíblia que reúne cânticos de louvor e agradecimento a Deus, a folha continha
uma imagem do atleta atuando
pelo São Caetano, uma réplica de
seu autógrafo e o endereço de seu
site (www.serginho3.com.br).
Quando o corpo deixou o local e
foi colocado em um carro dos
bombeiros, a PM deu o aviso: "Só
vamos permitir a entrada no cemitério de pessoas que tiverem o
santinho na mão", explicou o comandante Moisés Marinho.
A medida frustrou uma multidão que se aglomerava do lado de
fora do ginásio. No cemitério, a
cena se repetiu -ao menos 200
pessoas não conseguiram passar.
Quem pôde acompanhar toda a
cerimônia observou, ainda no velório, momentos de comoção.
Dos sete atletas do São Caetano
que foram a Coronel Fabriciano,
só o atacante Euller pediu a palavra. Ele foi até o caixão nos momentos finais do velório e puxou
sozinho um canto religioso. No
segundo verso, o coro engrossou.
O pastor Renato tomou as rédeas na seqüência. Membro da
igreja Evangelho Quadrangular,
da qual Serginho fazia parte, ele
reiterava que "o garoto era do
bem, era querido, porque combateu o bom combate". Parentes e
atletas começaram a chorar.
Quando a tampa que cobriria o
rosto do zagueiro apareceu, a tristeza deu lugar à preocupação.
Virgílio Ribeiro Silva, 69, e Ana
Oliveira da Silva, 68, pai e mãe do
jogador, passaram mal. Ambos
haviam tomado remédios durante a madrugada para controlar a
ansiedade. Acabaram sendo afastados do caixão.
Depois de assistidos por um
médico, conseguiram recobrar a
saúde. Só então a comitiva partiu
para o Vale da Saudade.
Enquanto as 36 coroas de flores
eram colocadas ao lado do caixão
de Serginho no caminhão dos
bombeiros, um vendedor de jornal aproveitava para incrementar
seu orçamento.
À moda antiga, berrava "extra,
extra, extra", para atrair a atenção
dos transeuntes na calçada em
frente ao velório. Oferecia uma
brochura com a manchete "O Último Adeus de Serginho".
O comboio deu uma pequena
volta na cidade e parou no cemitério por volta das 11h.
A família seguiu direto para a
quadra Azaléia, jazigo 154, onde
Serginho seria enterrado.
Já próximo à sepultura, novo
momento delicado: Helaine pediu para o caixão ser reaberto antes de desaparecer na vala. Começou uma pequena discussão entre
os familiares do jogador. Por fim,
pediram para a mulher "se controlar" e decidiram declinar o pedido -o enterro seria sacramentado naquele instante. Helaine
acatou a decisão do grupo.
Alheia ao assédio para cumprimentos, a mulher de Serginho
preferiu o isolamento após o ato.
Assim que o caixão foi coberto
por terra, ela desgarrou-se dos
amigos. Dirigiu-se a uma região
descampada do cemitério, sentou-se na grama e chorou. Ficou
assim até que as pessoas começaram a deixar o Vale da Saudade.
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