São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2004

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MOTOR

A culpa foi dele

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

A culpa já foi do sistema hidráulico. Já foi da telemetria, que não acusou falta de gasolina, e do motor, que explodiu. Já foi dele mesmo, como há três anos, quando bateu em Ralf.
Mas, no domingo, até Rubens Barrichello se enrolou para explicar o problema de pneu que jogou fora sua "vitória certa" em Interlagos. Numa inquisitória entrevista coletiva após o GP, chegou a ser socorrido por Montoya, que, da mesma forma, não conseguiu definir com muita clareza o que tinha destroçado o dia do amigo.
Os pneus intermediários não rendiam no chove-não-molha? Mas como, se ele ultrapassou Raikkonen e estava na liderança quando entrou nos boxes? E se não funcionavam, por que ficou na pista e não os trocou na mesma volta de seus adversários?
Barrichello e Montoya até deram algumas dicas, mas se embananaram nas respostas, ficaram irritados com a insistência dos repórteres e deixaram a sala de imprensa de Interlagos bufando.
Taí uma raridade. Qualquer pessoa que já tenha convivido o mínimo que seja com pilotos sabe que uma especialidade da profissão é uma retórica particular para explicar problemas na pista.
Do kart à F-1, desenvolvem, ao longo dos anos, um repertório enorme, criativo, engraçado, às vezes, tamanha a cara-de-pau.
Puro instinto de sobrevivência. É muito mais fácil colocar a culpa na quebra de uma rebimboca qualquer do que admitir um erro que pode abalar o ego, manchar a carreira ou até custar o emprego.
E há o outro lado, quando as próprias equipes criam histórias mirabolantes para encobrir uma falha infantil ou preservar algum componente secreto ou ilícito.
Já ouvi explicações absurdas, e não é difícil puxar na memória.
No fim de semana, um piloto começou colocando a culpa nos pneus (o mesmo de Montoya), passou pelo equilíbrio do carro (idêntico ao do companheiro, meio segundo mais rápido) e encerrou dizendo que estava com febre (ok, pára que eu vou chorar).
Não por coincidência, Cristiano da Matta, que em seus 28 GPs sempre confessou os erros com uma franqueza cortante, perdeu a vaga. Ele não dava desculpas.
Mas dá para compreender o que se passou com Barrichello e Montoya. Os dois estavam atônitos. O primeiro, pela surpresa da derrota. O outro, porque não imaginava a vitória. Por isso foi tão complicado, naquele momento, encontrar as palavras certas.
Bastava terem dito: "Aquela é a única condição, a única, que derruba a Ferrari. O asfalto estava seco demais para os pneus intermediários da Bridgestone e muito molhado para os secos. Era escolher entre ser mais lento ou rodar na primeira curva. A primeira opção pareceu mais sensata".
O caso de Barrichello e da Ferrari, no domingo, não foi para desculpas. Não havia o que encobrir, nenhuma peça misteriosa quebrou, ele não cometeu nenhum erro naquelas 71 voltas.
Não é o caso também de culpar a Bridgestone. No mano a mano, a Michelin perdeu feio neste ano.
Registre-se: a culpa em 2004 foi do mais pesado, abominável e implacável azar. E mais nada.

Tudo ou nada
A F-1 já está em 2005, e a Toyota deve ser a primeira a testar o novo carro, pouco antes do Natal. Será o primeiro modelo com a grife de Paul Gascoyne, que neste ano só pôde remendar um carro ruim. Acabaram-se as desculpas. O ano que vem será de vai ou racha.

Tudo
Michael Jordan causou alvoroço em Valência ao declarar que estuda montar uma equipe na MotoGP. Disse que é uma paixão antiga e que só largou sua Honda 60 por causa do basquete. Jordan e Rossi sob o mesmo teto? E assim a F-1 vai perdendo cada vez mais espaço...

Nada
Não estranhe se a Williams demorar a se decidir. A queda de braço é dura. De um lado, BMW e Heidfeld. Do outro, Petrobras e Pizzonia.

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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