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FUTEBOL
Competência e invenção
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Dois gols me chamaram a
atenção nos jogos do meio
da semana do Campeonato Brasileiro: o de Kléber, do Atlético-PR, contra o Palmeiras, e o segundo de Luís Fabiano, do São Paulo,
contra o Goiás.
Talvez não tenham sido os mais
bonitos da rodada, mas foram os
mais... perfeitos.
Hesitei em usar uma palavra
tão grandiosa, mas não encontrei
outra para expressar aquilo que é
realizado com tamanha precisão
e competência. E os dois gols em
questão foram exatamente isso:
lances tão límpidos e sem "ruído"
que pareciam saídos daqueles videogames de futebol (do tipo "Fifa 2002"). Além disso, foram praticamente iguais.
Na quarta-feira, Adriano, do
Atlético-PR, foi até a linha de fundo e, um centímetro antes que a
bola saísse, cruzou alto para o
meio da área. Entre a marca do
pênalti e a linha da pequena área,
Kléber subiu mais que a zaga e
cabeceou com força e exatidão. O
segundo gol do São Paulo, no dia
seguinte, foi a mesma coisa, com
Júlio Batista no papel de Adriano,
e Luís Fabiano, no de Kléber.
Poucas coisas dão tanto prazer
na vida quanto contemplar um
trabalho bem feito, seja ele um
poema, uma feijoada, um muro,
uma tapeçaria ou mesmo uma jogada de futebol.
É um momento de admiração e
regozijo, em que nós pensamos:
"Puxa, o sujeito que fez isso é
mesmo do ramo".
Talvez pensemos também: "Veja só as coisas que um ser humano
é capaz de fazer".
Adriano, Kléber, Júlio Batista e
Luís Fabiano são "do ramo", não
há dúvida. Por meio desses jogadores, quero celebrar a competência profissional, a seriedade na
prática de um ofício.
Mas, pelo menos no futebol, a
competência nem sempre é suficiente. É preciso, muitas vezes,
uma qualidade muito mais rara:
a invenção.
Os jogadores celebrados acima
não inventaram nada. Poderíamos até usar isso como um elogio,
num certo sentido: em vez de "inventar moda", fizeram o básico, a
jogada mais mortal e infalível
que já foi concebida, o cruzamento da linha de fundo.
Em certas circunstâncias, porém, a invenção é imprescindível.
Quando a marcação adversária é
incansável e inteligente, não deixando espaços para as jogadas
costumeiras, é preciso imaginar
alternativas, fazer o inesperado,
reinventar o jogo num segundo.
Um exemplo: na partida contra
o Cruzeiro, o Corinthians até que
conseguiu manter a posse de bola,
trocar passes, impor um certo domínio territorial. Mas praticamente não chegou à área do adversário (tanto que seu gol foi de
falta, de média distância).
O que faltou? Faltou alguém
que descobrisse espaços insuspeitados, que desfizesse num instante o nó lógico da partida e desconcertasse a marcação adversária.
Em uma palavra: faltou um jogador como Ricardinho (ou ainda um Marcelinho).
Esse mesmo Ricardinho vai estrear amanhã no São Paulo, provavelmente no lugar do "apenas"
competente Júlio Batista. Com isso, o tricolor, que já tem Kaká, terá outro "inventor" no time.
Pode ser que os dois não se entendam e batam cabeça no meio
de campo. Pode ser que o vigor de
Júlio Batista faça falta ao time.
Mas eu não apostaria nisso. O
mais provável é que o São Paulo,
que já está forte, se torne um time
quase imbatível. Afinal, terá os
dois melhores jogadores em atividade no país. E isso não é pouco.
Novo calendário
O que há de positivo no novo
calendário que está sendo
proposto, a meu ver, é o reforço do campeonato nacional e o fim da Copa dos Campeões. Mas, como observaram vários leitores, talvez a
tentativa de ressurreição dos
estaduais seja demasiado artificial e ilusória, pois eles não
se sustentariam na prática
(com a possível exceção do
Paulista). De todo modo, não
é algo a ser decidido nos gabinetes de uma TV, tendo como parâmetros sua programação e tabela de anúncios.
Dança das cabeças
No futebol brasileiro, os treinadores estão sempre na
marca do pênalti. Figueirense, Flamengo, Goiás, Inter e
Bahia já mudaram de técnico.
Quando o time perde, a torcida quer que alguém pague
sua frustração. Sobra sempre
para o técnico, mesmo que as
razões da crise sejam outras.
Murtosa que se cuide.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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