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FUTEBOL
No fundo da alma
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
A memória é diferente da
lembrança. Esquecemos
muitas coisas, geralmente as que
não queremos lembrar, mas elas
continuam guardadas em nossa
memória. De vez em quando reaparecem no sonho, nos atos falhos
ou disfarçadas e encobertas em
nosso cotidiano.
Há passagens em nossas vidas
que não são boas nem ruins, porém marcantes e inesquecíveis.
Lembro-me de uma quando era
professor de medicina, orientador
dos alunos do último ano e dos jovens médicos residentes, futuros
especialistas em clínica médica.
No Hospital Universitário, havia um doente portador de asma
brônquica. Ele não melhorava. O
médico residente estava em pânico. Discutimos várias vezes o problema do paciente, trocamos os
medicamentos, fizemos reuniões
clínicas, estudamos a literatura
recente, consultamos os especialistas -sem resultado.
Havia algo errado que fugia à
nossa compreensão.
Uma noite, fui para o hospital
conversar com o paciente. Queria
conhecer melhor o doente, e não
apenas a doença.
Aproveitei o silêncio e o sono de
outros pacientes da enfermaria,
sentei-me ao seu lado e batemos
um papo. No final da conversa,
após idas e vindas, confissões e recuos, ele me disse: "Doutor, o jovem médico que cuida de mim
não tem culpa. Nem ele, nem você, nem ninguém vai resolver o
meu problema. Não melhoro porque no fundo da alma não quero
melhorar".
Aí ficou claro. Ele precisava tratar não somente do corpo, mas
também da alma.
O leitor deve estar curioso por
que conto essa história. Em parte,
porque estou sem assunto. Também me lembrei dela após ver o
Oscar tornar-se o maior cestinha
do mundo de todos os tempos e
chorar de emoção.
Para ser craque, um fenômeno
como o Oscar, não basta ter talento e a mão santa. É preciso desejar
não somente com palavras, mas
também no fundo da alma.
Oscar é um atleta entusiasmado, ambicioso e perfeccionista.
Quer sempre jogar melhor. Ele
simboliza a união da técnica e da
garra.
Nesse momento, o pensamento
voa, e retorno ao futebol. Além
dos problemas técnicos, o que falta às equipes como Flamengo e
Cruzeiro é desejar a vitória no
fundo da alma. Ninguém entra
em campo para não vencer, mas é
preciso algo mais, como o Oscar.
Há desejos e desejos.
As equipes do Flamengo e do
Cruzeiro estão doentes. Como o
paciente, elas precisam tratar
também da alma. Antes que seja
tarde.
Mudanças no futebol
Na semana passada, escrevi que
as seis primeiras equipes do Brasileiro estavam quase classificadas.
Hoje, não tenho tanta certeza se
o Palmeiras e o Fluminense vão
passar para a próxima fase. Estão
em queda e enfrentarão adversários difíceis.
Celso Roth não aguentou a
pressão. Um time que tem poucos
excelentes jogadores e permanece
durante todo o campeonato entre
os oito primeiros merece mais elogios do que críticas.
O treinador não é excepcional
nem burro. Está no nível dos principais técnicos do futebol brasileiro, o que não é lá grande coisa, já
que a média é baixa.
Internacional e Vitória ocupam
a sétima e a oitava colocação. A
Ponte Preta tem o mesmo número de pontos, mas perde no saldo
de gols. Essas e muitas outras
equipes têm boas chances de se
classificar.
O Internacional dirigido pelo
Parreira é um time modesto individualmente, mas faz uma ótima
campanha. A equipe sabe o que
quer e o que pode. É essencial.
Um leitor conta-me, endossado
pelo Parreira, que o jovem presidente do Internacional, Fernando
Antônio Miranda, faz um belíssimo trabalho.
Assim como acontece com os
técnicos, estão sendo formados
novos dirigentes que serão importantes na reestruturação do futebol brasileiro.
Há outros. A cúpula do Atlético-MG, comandada pelo presidente Ricardo Guimarães e pelos
diretores Alexandre Kalil e Bebeto de Freitas, melhorou as finanças do clube. Isso reflete nos gramados.
Estou otimista quanto ao futuro
do futebol brasileiro.
Brevemente teremos grandes
mudanças em todas as áreas,
dentro e fora de campo.
Para isso, será preciso colocar
pessoas com idéias novas na direção das federações, dos clubes, das
ligas e da CBF -e que não queiram se aproveitar do futebol para
dar outros saltos.
E-mail: tostao.folha@uol.com.br
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