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Em junho, Serginho disse a médicos do Incor que nem risco de morte o faria encerrar a carreira
Doutor, vou jogar de todo jeito. É o que eu sei fazer, é como posso sustentar a família
FÁBIO VICTOR
DO PAINEL FC
Quando foi submetido à segunda bateria de exames cardíacos no
Incor, em junho passado, o zagueiro Serginho deixou claro para
os médicos que continuaria a jogar futebol independentemente
do resultado dos testes.
A Folha conversou com cardiologistas que examinaram o jogador do São Caetano na época. Por
duas ocasiões, durante e depois
da realização de um dos exames,
Serginho revelou oposição à possibilidade de ter de se aposentar
por causa de problemas de saúde.
"Vou jogar bola de qualquer jeito. É a única coisa que sei fazer, e
tenho família para sustentar. Preciso ganhar mais um dinheiro até
conseguir me aposentar", disse o
zagueiro, segundo relato de um
dos médicos do hospital.
A frase foi pronunciada depois
que o próprio Serginho questionou o cardiologista sobre o seu futuro. Diante do alerta de que haveria, sim, riscos caso ele continuasse a jogar, o atleta expressou
seu inconformismo.
Serginho, que tinha 30 anos,
sustentava a mulher, Helaine, e o
filho, Paulo Sérgio Júnior, de 4
anos, e ajudava os numerosos parentes que vivem em Serra, na região metropolitana de Vitória
(ES). A família é pobre. O jogador
deixou dez irmãos. O pai, Virgílio,
tem uma banquinha que vende
balas e miudezas no bairro Parque Residencial Laranjeiras.
Sem documento
Após a trágica morte do zagueiro, durante o segundo tempo de
São Paulo x São Caetano, na quarta-feira passada, no estádio do
Morumbi, pelo Brasileiro, surgiram especulações de que ele havia
assinado um documento isentando o seu clube de culpa no caso de
problemas em campo. A mulher
de Serginho negou a existência do
termo de responsabilidade.
De acordo com laudo do Serviço de Verificação de Óbitos de São
Paulo, a morte foi causada por
edema pulmonar e hipertrofia
miocárdica, decorrentes de doença congênita que causa o engrossamento das fibras do coração.
A primeira bateria de exames,
em fevereiro -da qual participou
todo o elenco do São Caetano,
pois o clube alegou preocupação
com a morte de dois jogadores em
campo-, já detectara problemas
cardíacos no jogador, entre eles
uma limitação na atividade do
ventrículo esquerdo, que injeta
sangue na artéria aorta.
O Incor (Instituto do Coração,
do Hospital das Clínicas da USP)
então solicitou novos testes, entre
os quais um cateterismo, que verifica a situação das artérias coronárias por meio de imagens obtidas com processamento digital, e
um holter, aparelho usado por 24
horas para avaliar a atividade elétrica do coração.
Ambos foram realizados em junho, mês em que Serginho atuou
quatro vezes pelo Brasileiro.
O cateterismo é o último procedimento que se faz em pacientes
com suspeita de problemas cardíacos antes que sejam necessárias angioplastias ou cirurgias.
Ou seja, se alguém precisa fazer
o cateterismo, também conhecido como cineangiocoronariografia, é sinal de que exames anteriores apontaram algum distúrbio
nas funções ou na capacidade
muscular do coração.
O cateterismo não apontou entupimentos nas coronárias, mas
diagnosticou um enfraquecimento no músculo do coração. Já o
holter apresentou sucessivas extra-sístoles (arritmias).
Com os resultados dos exames
prontos, Serginho e o médico do
São Caetano, Paulo Forte, foram
alertados por uma equipe do Incor que a continuação da carreira
do jogador representaria um risco
para a vida dele.
Forte -que atendeu Serginho
ainda no gramado do Morumbi,
tentando reanimá-lo com respiração boca a boca- não tem dado
entrevistas. O clube e amigos informam que ele ainda está muito
traumatizado com o episódio.
A interlocutores, o médico declarou que o Incor não entregou
ao clube nenhum documento
atestando a impossibilidade de
Serginho jogar futebol.
Ainda segundo a versão do médico relatada a amigos, o hospital
informou que o atleta corria riscos semelhantes aos que correm a
maioria dos jogadores, mas em
nenhum momento alertou que a
situação fosse grave ou que ele devesse parar de atuar.
Guerra de versões
O conflito entre os relatos de
médicos do Incor, de dirigentes
do São Caetano e de profissionais
que surgem a todo instante na imprensa para opinar sobre o caso
deve ser destrinchado na Justiça e
no Conselho Regional de Medicina de São Paulo.
Na quinta-feira, um dia após a
morte, a Polícia Civil do Estado
instaurou inquérito para apurar o
caso. O presidente do São Caetano, Nairo Ferreira de Souza
-que no dia do episódio disse
que Serginho não tinha problema
nenhum no coração e depois voltou atrás-, será um dos intimados a depor. O médico Paulo Forte também vai ser ouvido, assim
como jogadores do time do ABC.
Anteontem, o CRM abriu sindicância para apurar responsabilidades de médicos no episódio.
Integrantes da equipe do Incor
estão impacientes com a quantidade de palpites emitidos por colegas de profissão das mais diversas especialidades. Um dos médicos do hospital chegou a afirmar
que 99% das informações sobre o
caso divulgadas nos últimos dias
pela mídia são falsas.
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