São Paulo, quarta-feira, 31 de outubro de 2007

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análise

Dom Ricardo leva séquito e esquece Rei

JUCA KFOURI
COLUNISTA DA FOLHA

Viva! Temos Imperador! Dom Ricardo, Primeiro e Único, o Renascido.
Ele pôs aos seus pés um presidente da República e nada menos que 12 governadores, quase o número da sorte de Zagallo, que, desta vez, não estava lá.
Não fez mal. Lá estava Dunga, o anão do reino, que, como nenhum outro na função de pajem, reproduz exclusivamente a voz do dono e não fala com críticos de Sua Majestade.
A festa foi um show nunca visto na Fifa. O séquito era numeroso para uma cerimônia que não anunciaria nada não sabido: confirmaria o Brasil como sede da Copa-2014!
Mas não faltaram nem a arrogância e a má educação que caracterizam o Imperador nem as gafes históricas tão comuns ao presidente da República.
Violência há aqui como no Canadá, nos EUA e na Inglaterra, asseverou o Imperador. E faremos uma Copa tão boa que nem os argentinos acharão defeito, garantiu o presidente plebeu, para não falar do gol de pênalti de Michel Platini, na Copa de 1986, nada demais para quem já enfiou outro francês em enrascada, Napoleão Bonaparte na China.
Tucanos e outros bichos faziam a corte, na disputa por um lugar ao sol, perto do trono, quem sabe no braço direito do monarca.
Por mais que todos saibam que o todo-poderoso até hoje responde na Justiça pelo que se descobriu na CPI do Futebol, há sete anos, quando alguns dos governadores eram parlamentares com destaque nas denúncias, como o do condado de Pernambuco.
O show só está começando. Nos próximos sete anos teremos mais. Em breve, virão arenas, quanto mais suntuosas melhor.
Novos palcos para o esporte bretão e, quem sabe, para que o Imperador solte seus leões para devorar aqueles, cada vez em número menor, que ousam criticá-lo, bobos da corte sem graça. Ou até mesmo aqueles burocratas do Ministério Público que insistem em mostrar a nudez real, afronta cada vez mais insuportável e que precisa encontrar seu paradeiro.
Já há até entre os súditos mais céticos os que avaliam que, se tudo correr dentro de taxas normais de corrupção, o reino estará salvo. Sim, porque, argumentam, a corrupção existe desde que alguém inventou de pôr o homem no planeta Terra. E esta Terra é dos espertos.
Que os derrotistas se aquietem, os antipatriotas se calem, pois um valor mais alto se levanta.
A candidatura única brasileira é tão avassaladora que enterrou o rodízio de continentes, tal a força do acordo com outras famílias reais da Sul-América, lembrando que o Rei da Conmebol tem cargo vitalício, para admiração de índios e europeus.
Impossível, à guisa de finalizar esta ode ao Imperador, não lembrar que o que de melhor há em nossa intelectualidade também se fez presente e, espirituoso como sempre, lembrou que neste reino paradisíaco se fala mais de futebol do que de sexo.
Perfeito! Ou quase. Só faltou um detalhe, menor sem dúvida, mas que espantou o futebol: o verdadeiro Rei não estava no séquito do Imperador.
O tal do Rei Pelé.


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