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São Paulo, segunda-feira, 05 de maio de 2003

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Desarmamento opõe interesses de ONGs e produtores de armas

DA REPORTAGEM LOCAL

Não é apenas nos Estados Unidos que a polêmica em relação à proibição da venda de armas de fogo é inflamada, como mostra o documentário "Tiros em Columbine". No Brasil, a discussão sobre o direito de ter ou não armas de fogo também é altamente combustível.
De um lado, ONGs como o Instituto Sou da Paz e a Desarme, do Viva Rio, pregam o desarmamento da população. De outro, a idéia da proibição da venda de armas de fogo enfrenta forte resistência de produtores e amantes de armas, representados por entidades como a ANPCA (Associação Nacional dos Proprietários e Comerciantes de Armas).
Mas, antes de entrar nessa polêmica, é importante entender um pouco como o país trata a questão das armas de fogo.
Hoje, não é fácil conseguir uma arma legalmente no país. Em primeiro lugar, há um controle sobre os tipos de armas vendidas. Para revólveres, o calibre máximo é 38, já, para pistolas, 380.
Para comprar uma arma é necessário fazer um registro na polícia, ter mais de 21 anos, não ter antecedentes criminais, apresentar RG, título de eleitor, CPF, comprovante de residência e registro de que está empregado. O processo de registro, segundo o Folhateen apurou, demora cerca de 40 dias. De posse desse registro, a pessoa tem o direito de ter a arma em sua casa ou no trabalho, mas não pode portá-la.
Para andar armado, é preciso ter um porte de arma. E, para tirá-lo, é preciso passar por um exame psicológico e por um exame que mede a capacidade técnica de uso a arma.
Hoje, há dois projetos para a proibição da venda de armas de fogo na Câmara e no Senado. Proposta pelo governo federal em 1999, a proibição está parada na Câmara, pois não há consenso em nenhum partido sobre a questão, e ela enfrenta o lobby da indústria de armas e munição. Na Câmara, o projeto inicial foi alterado e o texto final apenas aumenta as exigências para a comercialização e o porte fica restrito a policiais, membros das Forças Armadas e outras autoridades, esportistas e moradores de áreas ermas. No Senado, segue a proposta de proibição.
Favorável à proibição, o diretor do Instituto Sou da Paz, Denis Mizne, 26, argumenta que a maior parte das armas que circulam no país, mesmo na mão de bandidos, é feita no Brasil e de calibre permitido. "A maior porta de entrada de armas é a produção legal brasileira. É preciso barrar a venda no país, para que quem tenha sua arma roubada ou perdida não alimente ainda mais o mercado negro", diz. "O segundo ponto é controlar o contrabando. Porque a arma sai do Brasil, vai para o Paraguai e volta contrabandeada. E o terceiro é fiscalizar as empresas de segurança privada e a polícia, pois há casos de desvios", completa.
Também a favor da proibição, Jessica Galeria, 26, coordenadora da Desarme, defende que o excedente de armas apreendido pela polícia seja destruído para que essas armas não sejam desviadas para o mercado ilegal. Ela também chama a atenção para o fato de armas do Exército argentino terem sido apreendidas no Rio de Janeiro recentemente, uma evidência de que também há contrabando de armas daquele país. "O Brasil tem um dos mais altos índices do mundo de mortes por arma de fogo. A maior parte desses homicídios são feitos com armas leves, como pistolas e revólveres, que são vendidas legalmente no país."
O Folhateen contatou Leonardo Arruda, diretor de relações públicas da ANPCA, e, atendendo a um pedido dele, enviou-lhe perguntas por e-mail tratando da proibição da venda de armas e de sua relação com os jovens e não obteve resposta até o fechamento desta edição.
Contudo, suas idéias sobre a questão do desarmamento estão bastante claras em artigos disponíveis na internet, no site www.armaria.com.br. Em texto intitulado "O Mito da Sociedade Desarmada ou a Cartilha da Utopia", Arruda ataca as justificativas para o desarmamento, dizendo que os argumentos de quem prega essas idéias são "falaciosos" e que "não está na abundância das armas a causa da violência no Brasil".
Arruda afirma que a ANPCA estima que existam armas em apenas 5% dos lares brasileiros. "Para todos os efeitos, o Brasil é um país desarmado", escreve.
Por outro lado, estudos da Unesco dão conta de que o Brasil é o país onde mais se mata por arma de fogo no mundo, e que as principais vítimas são os jovens. O "Mapa da Violência 3" registra que 29,5% das mortes juvenis no ano 2000 foram causadas por armas de fogo. (FM e GW)


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