São Paulo, segunda-feira, 05 de junho de 2006

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música

Aos 25 anos de estrada, banda supera desafios, "cano" de produtor, obesidade e até paternidade para detonar o sistema

Artilharia do Ratos de Porão fuzila emocore, Igreja e Lula

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois da bonança, o caos enfim volta.
Num mundo em que até as mães gostam do punk rock de rádio, "Homem Inimigo do Homem" cai como uma bênção. Mas, por causa dos filhos, a turnê do Ratos de Porão terá que ser mais pensada.
"Eu tenho dois pequenos, não dá para viajar tanto assim", diz o urrador João Gordo, 42.
A novidade é o ataque ao emo. "Crossover 2006 at War Against Emo Shit" é o que se lê no berço do CD e dá a pista da faixa "Equivocado": "Good Charlotte é uma bosta/ Simple Plan é uma bosta/ Tudo que você ouve é uma bosta". Aplausos.
"Emocore é som conformado, bunda-mole, música de loser que não trepa. Acho uma bosta", diz Gordo, ao seu estilo rápido de falar/cantar. No mais, o primeiro CD pela Deck é uma cartilha atualizada do hardcore, com a metralhadora de Gordo ao lado do peso e velocidade habituais de Jão (guitarra), Boka (bateria) e Juninho, novo baixista.
"O tripé somos eu, Jão e o Boka. Se sair um, a casa desaba. Mas um novo integrante sempre traz idéias", diz Gordo. Juninho é o quinto a gravar com o RDP.
Além das indignações, o disco traz uma decepção. O produtor americano Billy Anderson, que já trabalhara com o RDP antes, deu o cano.
"Depois de combinar tudo, parou de responder os e-mails. Botamos o Jello [Biafra, dos Dead Kennedys] para entrar em contato com ele. Fomos achá-lo na Argentina, produzindo o disco de uma banda stoner, Los Natas. Aí, ele deu uma de joão-sem-braço: "Pô, vocês sumiram...'"
Resolvido em São Paulo com o dedo de Daniel Ganjaman, o pé na porta voa com "Pedofilia Santa", baseada nos abusos sexuais perpetrados por padres, e vai até Lula em "Quem Te Viu".
Mas Gordo diz que não chegou a se decepcionar com Lula. "Primeiro porque não votei nele; não voto em ninguém. E assim que ele botou de ministro o Gilberto Gil, que é do reggae e curte um "cigarrinho do diabo", vi que não ia dar certo. O barato do Lula é churrasco e bola."

PCC
Talvez a mais atual das 12 faixas seja "PM de Satã", quase profética: ela veio antes da represália policial que matou mais de uma centena de suspeitos nos ataques do PCC em SP.
"Eu estava na Europa. Na internet, vi uma mistura de medo e euforia, nego achando legal, os motoboys querendo ver o circo pegar fogo, boatos. O objetivo do paulista era voltar cedo para casa."
Musicalmente, o trabalho atesta a coerência -a característica mais preciosa no gênero que fazem- de 25 anos de trash e hardcore, com frutos como "Crucificados pelo Sistema" (1983) e "Anarkofobia" (1991).
A peteca não caiu mesmo ante desafios como trocas de integrantes, a cirurgia contra a obesidade mórbida de Gordo e, não se pode esquecer, o sono dos filhos.
"Eu curto som porrada. Curto grindcore, curto Krisiun. Isso daí não muda, então foda-se", encerra Gordo, cada dia mais magro e agressivo.


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