Patrícia Santos/Folha Imagem

A partir da esq., as estudantes Fernanda Nemec, Bruna Coletti e Derien Christofoletti, que ainda não deram o primeiro beijo

Frente a frente, os lábios entreabertos, o cheiro de um hálito que não é seu. Os batimentos cardíacos aumentam, surge um friozinho na barriga. Ou vai ou racha. Alguns centímetros mais perto, os olhos se fecham e as bocas se encontram num beijo.
Beijar seria uma ação como tantas outras, se não tivesse o particular de ser algo tão íntimo. Dar um beijo é mais que a contração de 29 músculos do rosto (17 só na língua) e a troca abundante de saliva e bactérias. É demonstrar afeto e compartilhar emoções. Por isso o primeiro beijo é tão marcante. Notoriamente, pelo simples fato de ser o primeiro, uma novidade.
Quem já beijou sabe que não há regra nem treino que substitua o contato da hora H. Quem ainda não beijou está enquadrado em um grupo, criado pelos próprios adolescentes, do qual poucos gostam de fazer parte: o dos BVs (bocas virgens).
Ser BV é nunca ter beijado de língua. E aqueles que já deram um beijo selinho (só com o toque dos lábios) não escapam da classificação. "É chato demais ser BV", admite Cristina (nome fictício), 14. Assim como muitos outros jovens abordados pela reportagem do Folhateen, Cristina preferiu não revelar seu nome verdadeiro. Nunca ter beijado é um tabu entre os teens. Ninguém quer admitir ser BV ou, mais ainda, ninguém quer ser BV.
"É muito ruim porque afasta os meninos. Ninguém quer ficar comigo porque sou uma BV", dramatiza a estudante Derien Christofoletti, 12. Ela e as amigas Bruna Coletti, 12, e Fernanda Moraes Nemec, 11, estão dentro da idade ainda considerada "aceitável" para dar o primeiro beijo. "É normal ser BV na minha idade", esclarece Fernanda. Mesmo assim, as meninas se angustiam um pouco com a espera, uma vez que muitas de suas amigas já se gabam por terem experimentado um beijo de verdade. São as chamadas LA, língua aprovada, que já beijaram e estão seguras quanto à sua performance. "As meninas ficam aflitas para deixar de ser BV porque quem já beijou tira um sarro da gente", lamenta Derien.
Ser BV não envolve só a falta de oportunidade mas também uma dose de medo e timidez. "Sempre penso por que nunca rolou beijo comigo e se um dia vou ter coragem de pedir um a uma menina", confessa Rodrigo (nome fictício), 13. "Tenho medo de errar e de levar um não", reconhece. "Mas a gente tem que beijar quando está preparado, não importa a idade."
Que o diga Andrea Lubrano de Castro, 23, que deu o primeiro beijo aos 22 anos. "Acho que sou a recordista entre as BVs", brinca. "Não saía muito de casa, minha mãe me prendeu demais e, ainda por cima, passei cinco anos estudando magistério só com mulheres", justifica.
Andrea conta que sofria preconceito das colegas quando era BV. "Já escutei até gente me chamando de sapatão por causa disso", lembra.
Enquanto amigos e colegas ficam atazanando a vida dos BVs, há quem não se importe com isso. "Acho que sou muito velho para ainda não ter beijado, mas tudo tem seu tempo", diz Lucas Garabini Sakamoto, 12. Andrea concorda: "A pressa é realmente inimiga da perfeição".
"O despertar para o beijo é cada vez mais precoce", diz a professora de psicologia da USP Leila Salomão (leia texto ao lado). E, por mais que o primeiro beijo aconteça mais e mais cedo entre os jovens hoje, os BVs não são poucos (veja resultado da enquete na pág. 2), e a espera pode se tornar um problema. "Se eu fizer 15 anos e ainda não tiver beijado, vai ser horrível", diz Derien.
Muitos BVs não se conformam com essa posição, fogem do assunto beijo e fazem de tudo para se verem livres do peso dessa sigla. "Tenho três amigas que ficaram com um menino só para deixarem de ser BVs. E, ainda por cima, uma delas mordeu a língua do menino três vezes porque não sabia beijar", conta Bruna. "Eu tenho medo de errar como ela e todo mundo ficar comentando que não sei beijar. Mas imagino que o primeiro beijo deva ser maravilhoso", completa.
Lucas discorda: "Acho que o primeiro beijo vai ser horroroso. Todo mundo me fala que é ruim". Mesmo assim, ele se prepara para o momento como pode e lança mão de técnicas mais que furadas para aprender a beijar. "Treino com um cubo de gelo ou chupando meia laranja, mas sei que não adianta nada", contradiz-se. "Acho que vou beijar no sábado. Estou combinando com a menina. Ela já beijou e praticamente vai me ensinar." Boa sorte!



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