São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 2008

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cinema

Concerto de jovens

Orquestras formadas por adolescentes de baixa renda inspiram dois filmes nacionais

Divulgação
Murilo Rosa no papel de Mozart Vieira, maestro que inspirou o filme "Orquestra dos Meninos"

LUANA VILLAC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Cena um: no árido agreste pernambucano, o sol abrasador fustigando a região, filhos de lavradores empunham clarinetes, trompetes e outros instrumentos e tocam uma peça de Bach.
Cena dois: jovens da periferia do Rio de Janeiro enfrentam mais de duas horas de transporte coletivo para chegar à sala de aula, onde tocam composições clássicas e populares.
As duas cenas correspondem a histórias reais, distantes na localização, mas parecidas no enredo, e que inspiraram a produção de dois filmes nacionais.
O primeiro, "Orquestra dos Meninos", estreou sexta-feira nos cinemas. Dirigido por Paulo Thiago, o longa é uma ficção baseada na história do maestro Mozart Vieira, que na década de 80 montou uma sinfônica com jovens sem recursos na pequena cidade de São Caetano, a 150 quilômetros de Recife.
O sucesso da orquestra despertou a inveja de políticos locais, e o Mozart do sertão foi acusado de seqüestro e de pedofilia. O filme relata as dificuldades enfrentadas pelo maestro para provar sua inocência e prosseguir seu trabalho de educação musical.
O segundo filme, "Contratempo", marca a estréia da atriz Malu Mader na direção. Co-dirigido por Mini Kerti, trata-se de um documentário sobre o projeto Villa-Lobinhos, que tem como objetivo a formação de jovens instrumentistas carentes no Rio. O longa, exibido na 32ª Mostra de Cinema de SP, deve estrear em fevereiro.
Creuza Viera, ex-aluna de Mozart e hoje sua esposa, se lembra que deu muito trabalho para o professor quando tudo começou. "Pessoas que têm uma situação financeira difícil não estão acostumadas a acreditar que são capazes", afirma ela, que entrou para o grupo aos 16 anos. "Eu era assim: quando ele chegava com novidade, era a primeira a dizer que era impossível. Aos poucos, ele nos mostrou que podíamos fazer arte. Ele foi um herói."
Maria Lauciete da Silva tinha dez anos quando entrou na banda de Mozart. "No início, minha família não entendia. Meus pais trabalhavam na roça e queriam que eu ajudasse, mas eu só pensava em tocar", relembra. "Chorei tanto que minha mãe acabou cedendo."
Hoje, Lauciete, como todos os integrantes da orquestra original, vive de música.
A filha de agricultores Claudia Aparecida Mendonça, que começou como flautista da orquestra aos 12 anos e hoje é bacharel em flauta transversal, teve a sorte de ter no pai um amante de música e um aliado. "Passar o dia todo soprando um instrumento no interior de Pernambuco é difícil", afirma. "Mas meu pai ficava orgulhoso ao nos ver tocar."
A mais de 2.000 quilômetros dali, Mayra Vieira de Oliveira, 19, também recebeu o apoio da mãe ao entrar para o projeto Villa-Lobinhos, há três anos.
Prestes a se formar em violão na instituição, Mayra atualmente ajuda em casa com o dinheiro que ganha dando aula e tocando. "Tudo isso foi o projeto que me proporcionou", diz.
"Quando cheguei lá, eu tinha o pior violão do mercado e só sabia tocar o que tinha aprendido sozinha, com essas revistinhas de banca de jornal."


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