São Paulo, segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

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COMPORTAMENTO

Alugam-se príncipes

Eles têm de 17 a 21 anos e levam até R$ 70 para valsar com debutantes

Adriano Vizoni/Folha Imagem
Os Príncipes de Honra fazem a valsa das espadas, na Mooca

CHICO FELITTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Se no conto de fadas o príncipe chega a cavalo branco, na Mooca ele chega de Gol 1.0 e em Pinheiros vem de van escolar, em patota. No mundo real, a realeza não chega por amor, e sim por cachês de até R$ 70.
Esses cavalheiros são garotos que, por grana ou por farra, dançam em festas de 15 anos.
O Folhateen acompanhou o trabalho de dois grupos desses estagiários em farda de cadete.
Por terem de 17 a 21 anos e serem quase todos universitários, estão cansados na noite de sexta, a menos nobre do ofício.
Quando, às 22h, Leandro Nobre, 19, chega ao bufê na Mooca (zona leste de SP) com os Príncipes de Honra, já passou pela faculdade de engenharia ambiental e pelo estágio.
Também já passou de carro para conduzir três amigos. Motorista dessa trupe é obrigado a transportar os colegas pedestres -e embolsa R$ 60 por isso.
O valor é três vezes o cachê pela festa, de R$ 20. "É pouco, mas trampo na sexta só para sair no sábado", diz André Moreira, 19, um ano de mercado.
Apesar de frequentador voraz de baladas na Vila Olímpia, Moreira diz não dançar bem. Como todos os entrevistados, fala que não fez aula de valsa.
Aprendem nas festas as coreografias, inclusive a complexa do túnel de espadas, que apresentam à 0h40. "Da primeira vez, dá nervoso. Depois, é fácil", garante Moreira.
Nem um príncipe infante precisava ter medo de errar e ficar mal nessa valsa. O trono de príncipe-maior já era do namorado de 1,90 m da aniversariante, Leticia Napolitano. O casal se fez há três meses, em uma festa de debutante.
Depois da dança, eles voltam às roupas civis no carro. Alguns fumam antes de tornar à festa.
Na noite seguinte, 14 garotos da Cavalheiros de Honra já se secaram ao chegar de smoking e de van escolar a um dos bufês mais chiques da cidade, em Pinheiros -zona oeste de SP.
É que um toró havia surpreendido o grupo (não confunda com os Príncipes de Honra) no metrô Tatuapé, onde todos se encontram para pegar o coletivo para ir trabalhar.
A festa de hoje é no salão servido por 30 garçons em que uma vez eles tiveram de usar "ponto" eletrônico para ouvir ordens do diretor de cena.
Só que, dessa vez, vão sem tecnologia e sem a tradição das espadas -escolha da aniversariante, que também pode selecionar "seus" príncipes, entre fotos de mais de 40 opções.
Além de desarmada, a comitiva real vai sem líder: o par da debutante Gabriela Camilo Teixeira na festa com tema "A Bela e a Fera" será o pai, vestido como o monstro da Disney.
Mas o desfalque não baixou o pagamento de R$ 70, mais transporte, para cada um deles.
Nada perto dos R$ 2.500 que uma mãe diz ter pago pelo "pacote" de 15 garotos, para a festa da filha, no mês passado.

E raspar a cabeça?
Como entrar no mercado? Não há olheiros vasculhando a rua atrás de príncipes, conta Nelson Neto, 17. Ele diz que indicação de alguém do grupo é coroação certa, pois "mais do que bonito, tem que ter índole".
Por ter índole, entenda-se respeitar as regras: príncipe não bebe, não fuma e não está no baile para "pegar" mulher -a reportagem viu 11 "ficadas" de príncipes e convidadas.
Há mais interdição: príncipe não pode ter cabelo colorido. Nem piercing. Brinco, às vezes. E raspar a cabeça... não pode.
Um descumprimento basta para a expulsão. Mas nunca rolou, garantem eles. "A aposentadoria é por aparência: você deixa de ser chamado para dançar, até desistir", conta Caio Barril, 21, o ancião da turma.
O truque, então, é parecer mais novo. "É bom fazer a barba logo antes da festa, para não arranhar o rosto das "minas'", diz Leandro Nobre, 19.
Seguindo o sobrenome, Nobre diz que não vai largar a lida: "Só saio dessa vida quando me arrumar uma princesa".


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