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saúde
Vegetarianismo na balança
Vista como "cool'
pelos jovens, dieta
sem carne pode
esconder distúrbios
alimentares -mas, se
benfeita, é saudável
CHICO FELITTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Você passou a vida
ouvindo sermão de
vegetarianos sobre
como quem não come carne é mais
saudável? Contra-argumente:
20% dos jovens que se dizem
vegetarianos na verdade sofrem de distúrbios alimentares,
aponta uma pesquisa da Universidade de Minnesota (EUA).
Foi analisado o hábito alimentar de 2.516 americanos
com idades entre 15 e 23 anos.
Quase um em cada 20 deles
(4,3%) disse não comer carne.
Dentre os vegetarianos, dois
de cada dez admitiram usar a
dieta verde para perder peso ou
para mantê-lo. No controle da
balança, usam táticas como comer pouco e vomitar.
Um quarto dos jovens americanos disse que vegetarianismo
era "cool" (bacana) em pesquisa do instituto Teenage Research Unlimited.
No Brasil, o bacana é proteger os bichinhos: "A maioria
dos vegetarianos com distúrbios diz que parou de comer
carne por ter dó dos animais",
diz Henrique Torres, médico
do Núcleo de Investigação em
Anorexia e Bulimia da Universidade Federal de MG.
Cerca de 90% dos pacientes
dele são mulheres com menos
de 20 anos. "Elas muitas vezes
mascaram problemas graves
com vegetarianismo, que é
aceito por pais e por amigos."
Há poucos números oficiais
sobre esse tipo de dieta no Brasil. Mas em países como o Reino Unido, a porcentagem de
quem não come carne cresceu.
Foi de 1,8% da população nos
anos 80 para 7% em 2005. A
proporção de jovens "verdes" é
ainda maior: 12%.
Mas vegetarianismo não é
distúrbio: "Os vegetarianos,
quando comem "direito", têm
menos chances de ter doenças
cardíacas e diabetes", diz Ramona O'Brien, nutróloga que
fez a pesquisa americana.
O trabalho indica também
que os "vegetas" com dieta balanceada tendem a ingerir mais
vitaminas e menos gordura do
que quem come carne.
Carne? Que nojo!
Mais vitaminas e bem menos
comida, no caso de Bianca**,
20. Ela estuda medicina em
Florianópolis, onde mora só e
cozinha para si. Não come nada
que não tenha feito ela mesma.
Quando os amigos vão a um
restaurante em que se come
carne ("Que nojo!"), ela fica em
casa e faz um estrogonofe de
vegetais com leite de soja.
Ela perdeu 8 kg em nove meses de dieta "vegan" -não come ovos, leite e nenhum outro
produto que venha de animais.
Ainda faltam 3 kg, afirma.
Por mais que diga comer
"bem", está com falta de nutrientes, diz sua nutricionista.
Essa mistura de "boa" alimentação com debilidade pode
ser ortorexia, diz Luciana Florenzano, médica do Ambulatório de Bulimia e Transtornos
Alimentares do Instituto do
Hospital das Clínicas de SP.
Como Bianca, ortoréxicos
têm obsessão por pratos "saudáveis" e têm horror a gordura
e a carne. "Todo ortoréxico é
vegetariano, mas o contrário
não é verdade", diz Luciana.
O distúrbio foi descrito há
pouco tempo e ainda não foi reconhecido pela Organização
Mundial da Saúde, diz Luciana.
Ana**, 20, é vegetariana há
um mês. Deu a notícia no blog
em que narra a epopeia para ir
dos 95 kg que tinha ao começar
a "postar" e os almejados 70 kg.
Na página, feita há dez meses, admite ter tomado remédios inibidores de apetite e pede desculpas para as leitoras
quando come três pães franceses. Pelos comentários, elas dão
broncas, mas perdoam.
A decisão de cortar a carne do
prato foi tomada sem consultar
um nutricionista. "Eles são
sempre contrários, então pesquisei na internet mesmo."
Desde então, perdeu 2 kg e diz que se sente "mais limpa". Quer deixar mais 15 kg
de lado e voltar à forma que tinha quando foi eleita miss estudante, na Paraíba,
há seis anos.
"Não faço essa dieta só com o intuito de emagrecer, e sim pelo bem-estar", afirma.
Só que osentimento bom ainda não veio. Sente-se mais fraca desde que trocou as proteínas
animais por chuchu e batata doce.
Lentilha na piscina
Cortar a carne da dieta sem
procurar um especialista é o
maior risco, diz a nutricionista
da USP Silvia Cozzolino. Pode-se acabar virando um "vegetariano de batata", que só come
carboidratos, por exemplo.
"O organismo do jovem tende a se adaptar a uma mudança
de dieta", diz Silvia. Mas é provável que se precise de complementos de vitaminas.
Há exceções: filho de vegetarianos, Juliano Vilela, 16, nunca
tomou pílulas. Tampouco comeu carne. "Não sei qual é o
gosto e nem quero saber."
Os resultados de seus exames
médicos são adequados para a
idade, dizem os pais, e ele tem
força suficiente para competir
na natação. "Mas tem que comer lentilha depois da piscina."
nomes fictícios
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