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ESPORTE
Revelações dos Jogos Sul-Americanos viraram atletas quase por acaso
Gente de fôlego
FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL
Atleta não nasce com tocha na mão e
medalha no peito. Pode levar alguns
-ou muitos- anos para que se descubra a vocação para o esporte. No Brasil
dos contrastes, essa iniciação rende casos
curiosos: o da garota que chamou a atenção de um técnico brincando de pular
elástico nas ruas de uma pequena cidade
no interior de Perbambuco, o do menino
que se iniciou nas corridas zanzando pelas vielas de uma favela carioca e o da
paulista que conheceu o golfe por causa
da mania que empresários japoneses tinham de fazer reuniões de negócios com
o pai dela durante partidas do esporte.
As três histórias são de jovens esportistas que participaram, no início de agosto,
dos Jogos Sul-Americanos Brasil 2002: a
pernambucana Keila da Silva Costa, 19,
que participou das competições de salto
triplo e de salto em distância, levou dois
ouros e bateu os recordes sul-americanos das duas modalidades; o carioca
Bruno Pacheco, 19, foi medalha de ouro
na corrida de 200 metros, na qual também bateu o recorde juvenil sul-americano, e a paulistana Maria Priscila Iida, 22,
medalha de ouro na competição de golfe.
Keila, que hoje é considerada uma atleta de ponta, nunca teve condições ideais
de treinamento. Desde os nove anos, ela
corre em uma pista de terra batida da cidade de Abreu e Lima, no interior de
Pernambuco. Para os saltos, improvisou
uma caixa com tijolos e areia. "Quando
corro na pista sintética, sinto uma facilidade enorme", explica.
Ela chamou a atenção do técnico Roberto Andrade correndo e brincando de
pular elástico nas ruas da cidade. "Era
"amostrada". Pedia às meninas que colocassem o elástico lá em cima para eu pular. Queria ser a melhor", diverte-se.
Desde então, Keila precisou ganhar
muita competição em que o prêmio era
um pirulito ou um saco de pipoca para
chegar a receber medalhas de verdade.
"Hoje tenho patrocínio e sou uma atleta
de nível", gaba-se. Parte do que Keila ganha com patrocínio e competições vai
para as crianças e os jovens do projeto esportivo que integra. "Minha cidade é pequena, mas tem muita criança e hoje todo mundo gosta de esportes."
Bruno é outro atleta que influencia na
favela do Borel (zona norte do Rio de Janeiro), onde cresceu. "Hoje, há outros
garotos da favela no esporte. Estou servindo de espelho para eles", comemora.
O atleta conta que, antes do esporte, o
cotidiano difícil da favela onde vivia o levou a desenvolver "amizades erradas".
"Se não fosse o esporte, estaria provavelmente morto, envolvido com drogas ou
preso", especula.
"Acho que toda favela deveria ter uma
vila olímpica. É uma ótima maneira de
tirar crianças da rua. Eu, que costumava
correr pelas vielas da favela, agora compito nas pistas do mundo. Para mim, o
esporte foi uma luz."
Para Maria Priscila, foi mais fácil. Seu
pai teve de ficar sócio de um clube de golfe por causa dos clientes japoneses que
gostavam de fazer negócios nos campos.
Com isso ela teve, desde cedo, contato
com um esporte pouco praticado no
país. "Todo mundo acha que golfe é esporte de velho, mas a maior parte dos
competidores brasileiros são jovens."
Maria conta que o golfe tem-se popularizado no Brasil graças à pratica de alguns famosos como o craque Ronaldo e
o piloto Rubens Barrichello. "É um esporte que requer muito investimento
porque tanto o material quanto o aluguel
do campo são caros", queixa-se. Mas isso
não torna o golfe inacessível. "A maioria
dos profissionais do golfe do Brasil são
ex-carregadores de bolsas que fizeram
da proximidade com os campos um caminho para a prática e o ganha-pão."
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