São Paulo, segunda-feira, 13 de janeiro de 2003

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ESCUTA AQUI

Festival de besteiras inglesas assola o Brasil

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA

A região mais próspera do Brasil é o vale do Itajaí, em Santa Catarina. "Señorita" é uma palavra da língua portuguesa. O idioma falado pelos descendentes germânicos de Santa Catarina é o mais puro alemão. A empresa aérea que liga São Paulo ao sul do país chama-se Rio du Sol. É comum mulheres bem-arrumadas pegarem avião em São Paulo só para almoçar em Joinville (SC), voltando no mesmo dia. O nome do compositor brasileiro de "O Guarani" é Carlos Gomez. Um restaurante de Blumenau fica encravado na selva.
Calma, "Escuta Aqui" ainda não enlouqueceu de vez. Todas as maluquices do parágrafo acima foram extraídas de uma reportagem sobre a imigração alemã em Santa Catarina, publicada na edição de janeiro/fevereiro de 2003 da ultraluxuosa revista inglesa "Wallpaper". Dá para acreditar?
A "Wallpaper", para quem não sabe, é uma daquelas revistas que ditam o que é ou não bacana, cool, hip, mundo afora. Imagine a coisa menos cool do mundo -"Escuta Aqui", por exemplo. Pois bem: se sair na "Wallpaper" que "Escuta Aqui" é legal, passa a ser legal, e ponto.
A última edição traz o que a "Wallpaper" chama de "The Hot 100", ou seja, a lista de "cem coisas bacanas", escolhidas pelo corpo editorial da revista.
A "coisa bacana" número um é nada menos que a imigração alemã no Brasil. Para nós, brasileiros, fenômeno manjado. Mas só aqui. Aos olhos dos ingleses da "Wallpaper", alemães vivendo no país tropical desde o século 19 são exotismo puro.
Como "homenagem" aos teuto-tiozinhos de SC, a "Wallpaper" traz reportagem de seis páginas sobre o assunto. O pequeno texto -as fotos ocupam a maior parte do espaço- é assinado por William Hodgkinson, jornalista inglês descrito como um "apaixonado pela América do Sul". Imagine se não fosse...
Mas o objetivo de "Escuta Aqui" de hoje não é uma defesa "patriótica" do Brasil, fulminado pela desinformação da "Wallpaper". Na verdade, o Brasil é mesmo um país exótico, estranhíssimo e muito pouco conhecido lá fora. Acaba sendo normal um artigo tão impreciso sobre nossa terra -por mais desconfortável que a gente se sinta ao lê-lo.
Antes que você se veja tomado de ímpeto verde e amarelo e mande uma carta xingando a "Wallpaper", pense bem. O que nós sabemos, por exemplo, sobre o México, para ficar em um caso de país de projeção mundial e grandeza econômica semelhantes à do Brasil? Nada, claro.
Se os ingleses que editaram a reportagem sobre SC são ignorantes, então a gente não fica muito atrás.
 
"Escuta Aqui" pede desculpas a quem escreveu para a coluna entre os dias 20/12/ 2002 e 6/1/2003. Pane na caixa postal mandou as mensagens do período para o ciberespaço, sem chance de recuperação.
Desculpas também pela coluna da semana passada, que:
1) Não falava de Joe Strummer, do Clash, morto no fim de 2002;
2) Citava como novidade o gerador de letras tribalistas na internet.
É que o texto foi entregue com muuuita antecedência, quando o grande Strummer ainda estava vivo, e quando o gerador ainda não tinha sido objeto de reportagem até no diário oficial de Bagdá.



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