São Paulo, segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NA ESTRADA

Mayra Dias Gomes - mayradiasgomes@uol.com.br

Os nu-excluídos

Encontre um roqueiro paulista que goste do Serra e eu paro de fumar. É claro que só digo isso porque você não vai encontrar, pois eu não planejo controlar meu hábito. Já farei isso depois e não imediatamente, naturalmente, ou não seria uma adicta.
Lembro perfeitamente de quando o antigo prefeito de São Paulo resolveu acabar com a farra dos frequentadores alternativos e sexuais do Atari, em 2006. Ele fechou a popular casa com um argumento homofóbico e um dedo na cara. Com isso, encerrou uma era. Muitas meninas que eu conheço beijaram outras meninas pela primeira vez no Atari.
Lembro do dia em que coloquei um cigarro na boca. Estava assistindo a Christina Ricci fumar em um filme e, com frio na barriga, fui e roubei um cigarro da minha empregada. Fiquei treinando na frente da tela, pois sabia que precisaria daquela muleta social. Estava em uma festa da escola quando tive a noção de que, se eu me sentasse sozinha, pareceria excluída. Já se sentasse sozinha para fumar, pareceria independente. Conheço muitos que começaram assim, por insegurança e autoafirmação. Acabaram viciados e hoje pertencem ao grupo de nu-excluídos da sociedade.
Calma, não sou uma revoltadinha sem causa. Deixo claro que não quero matar o outro com a fumaça fedorenta do meu Camel -as pessoas têm todo o direito de não respirar essa porcaria. Eu quero é poder viver em um mundo que permita que eu me mate se eu estiver a fim. E se for um mundo que se propõe a fazer o bem para mim, que seja um lugar onde os viciados são tratados como doentes. Que recebam informação e tratamento, adesivos de nicotina e chicletes, e tenham a possibilidade de dar um passo de cada vez para ganhar do que os controla. Você já lidou com um viciado? De crack, cocaína ou cigarro? Então sabe que repressão não é solução.
Nesse fim de semana, eu percebi o quanto as pessoas estavam brigando na balada. Bebendo mais, tentando conviver com dedos inquietos, filas intermináveis, esperas frustrantes. Fico pensando: quanto tempo até o número de acidentes por conta do álcool começar a crescer? Essa lei é uma solução ou estamos empurrando um elefante cor-de-rosa para debaixo do tapete?


Texto Anterior: Televisão: Você na TV
Próximo Texto: Livros: Princesa rejeitada
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.