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São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2003

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LIVROS

Romance traz de volta todos os temores de criança

Medos encaixotados e empoeirados

LEDA CARTUM
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Sentir medo é característica de todo mundo. Essas histórias de que os corajosos ou os heróis não têm medo de nada não passam de invenção. Não há nada mais evidente do que esse sentimento. Senti-lo começa quando somos crianças e não conseguimos dormir de noite por causa de alguma coisa ou quando víamos filmes de terror e depois não desgrudávamos do travesseiro. Pois medo que é medo aparece já lá no comecinho da vida, quando descobrimos que há coisas que não conhecemos.
Medos infantis são lembranças mal esquecidas que teimam em voltar às vezes, por mais que a gente não perceba direito. O lado bom é que, com eles, volta também um pouquinho da infância.
Em "Minha Querida Assombração", um livro de Reginaldo Prandi que acaba de ser lançado, esses medos estão presentes na forma de histórias de terror contadas por uma senhora chamada Dona Santa. Com um texto simples e fácil, é um livro rápido de ler, que traz de volta algumas de tantas coisas que já esquecemos.
Um pai viúvo e quatro filhos vão passar uma semana de férias num hotel-fazenda, na tentativa de relaxar e de esquecer um pouco da rotina. O lugar fica numa cidadezinha distante, sem TV ou outro entretenimento que não a própria fazenda e -por que não?- as histórias que Dona Santa conta toda noite, depois da janta. Acontece que essas histórias têm um quê de realidade, e seus personagens estão todos espalhados pelo hotel, revelando-se nas noites estranhas, quando se podem ouvir vozes, choros e barulhos.
Apesar da certa obviedade da narrativa (é fácil, sim, prever o que acontece no final e como as coisas se resolvem), é uma história gostosa para passar o tempo. Mesmo sendo voltada mais para um público mais infantil, é um bom jeito de o leitor mais velho se lembrar de medos já encaixotados e empoeirados e até de conhecer melhor e mais uma vez coisas que ouvíamos há um tempinho.
É interessante também ler a nota do autor no final do livro para conhecer a verdade que se esconde nessa história toda.
Afinal de contas, sentir medo não é nada mais do que desentender o que não conhecemos e, quando somos crianças, conhecemos menos do que quando crescemos. A gente deita na cama, fica olhando a linha de luz que passa pela porta entreaberta, o barulho do vento na janela que parece às vezes qualquer outra coisa, a torneira pingando lá no fundo e os carros passando lá atrás e, se a gente sente sede, é tão difícil levantar para ir até a cozinha pegar um copo de água... não faz tanto tempo assim e até hoje isso pode acontecer.
Que jogue a primeira pedra quem nunca sentiu vontade de ter uma cama dos pais por perto para se esconder rapidinho debaixo do cobertor.


"Minha Querida Assombração", de Reginaldo Prandi e Rodrigo Rosa
Editora: Companhia das Letrinhas
Quanto: R$ 23 (144 págs.)

Leda Cartum, 15, é aluna da primeira série do ensino médio do Colégio Equipe e publica seus textos no blog www.pedacodeunha.weblogger.com.br
ledacartum@hotmail.com.



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