São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

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carreira

Outro olhos

Tecnologia de filmagem mais barata encurta o caminho profissional de jovens cineastas

Joel Silva/Folha Imagem
Alice venceu um festival holandês de cinema ambiental com curta sobre o rio Tietê

LUANA VILLAC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Durante um passeio organizado por uma ONG pelas águas do Tietê, a estudante de cinema Alice Fany Riff, 24, teve a idéia de fazer um curta sobre a situação do rio moribundo que corta a cidade de São Paulo.
Com uma câmera digital emprestada, a ajuda do irmão e de um amigo e menos de R$ 50, ela fez o documentário curto "H2O?", que venceu o FIABCI Ecofilm 2008, festival de cinema ambiental universitário de Amsterdã.
Da viagem para a Holanda, que ela ganhou para receber o prêmio, ela levou para casa 5.000 dólares. "Foi totalmente inesperado. Já tinha feito coisas bem mais elaboradas na faculdade e não aconteceu nada", diz. "Foi bom ver que se pode atingir as pessoas sem a necessidade de grandes produções."
Para Alice, a acessibilidade da tecnologia digital é um grande trunfo para quem está começando. "Cinema em película gasta muito, é praticamente impossível. Eu prefiro fazer as coisas em digital porque assim consigo dizer o que quero com muito menos dinheiro."
Mas não é apenas na questão financeira que Alice defende o uso das novas tecnologias de filmagem. "É claro que a película é mais bonita, tem mais cores. Mas, por exemplo, um filme sobre o rio Tietê tem tudo a ver com a imagem mais chapada do digital. O cinema digital pode virar linguagem."
Colegas de Alice, os amigos Andradina Azevedo, 23 e Dida Andrade, 21, também se beneficiaram dessa facilidade para realizar um curta premiado.
Seu filme "Para Que Não Me Ames", que conta a história de um preso brutalizado que tem um relacionamento com o travesti da cadeia, ganhou os prêmios de melhor vídeo, melhor ficção e melhor atriz no Gramado Cine-Vídeo deste ano, e de melhor filme e direção no Mix Brasil 2008, festival de cinema da diversidade sexual.
"Como não tínhamos grandes patrocínios, se fosse em película, não teríamos conseguido fazer", afirma Andradina, o diretor. "Improvisamos bastante: o digital possibilita isso."
Além de dois amigos atores, os demais personagens que aparecem no filme são guardadores de carro da faculdade dos garotos. O cenário foi feito no depósito do restaurante da tia do diretor. "Tivemos que levantar paredes, até os garçons ajudaram", conta Andradina. "Foi muito na pegada, na correria, no esforço e com pouca grana", resume.
Para Dida, que assinou o roteiro e co-dirigiu o curta, o trabalho foi feito sobretudo com paixão.
"Durante um ano dedicamos nossa vida a ele", afirma. "Aprendemos a linguagem cinematográfica fazendo esse filme. É como se, antes, fôssemos analfabetos. Não dá para explicar o quanto aprendemos."
Para Pedro Bezerra Jorge, 26, poder experimentar é fundamental. Pedro já freqüenta os sets de filmagem desde os 17 anos e transita pelas áreas de montagem, direção e som.
No ano passado, trabalhou como editor de som do curta "Maria Sem Graça", dirigido por seu colega de classe Leandro Goddinho. Os dois receberam menções honrosas do júri do festival de cinema de Villaviciosa de Odon, na Espanha.
"Fizemos uma festa e conseguimos arrecadar 800 reais para ajudar na realização do filme", diverte-se. "Quando você gosta do projeto, aceita comer PF no boteco mesmo."
O diretor Carlos Gerbase, professor de cinema da PUC-RS, acredita que é muito mais fácil produzir um filme de baixo custo atualmente do que quando ele deu seus primeiros passos na profissão, na década de 70. "Hoje os equipamentos são mais acessíveis, e as possibilidades de distribuição, como YouTube e outras ferramentas da internet, fantásticas."
Em 2007, ele dirigiu o filme "3Fs" com uma equipe formada praticamente apenas por alunos e ex-alunos, cuja média de idade girava em torno dos 20 anos. Exibido na rede, o longa já foi visto por mais de 140 mil espectadores.
"Trabalhar com eles foi como voltar a um esquema parecido ao de meus primeiros filmes, onde todo mundo fazia de tudo um pouco, mas a diferença tecnológica é muito grande."
Lucas Moesch, 22, que já foi aluno de Gerbase, acha que as novas tecnologias são bem-vindas, mas não solucionam tudo. "Elas abriram o mercado para muitas pessoas, mas justamente por isso há muito filmes gratuitos sendo feitos", critica.
Apesar disso, o garoto, que foi diretor de produção do curta "Mesa de Bar" -vencedor do prêmio especial do Júri no Perro Loco, festival de cinema universitário latino-americano-, defende a popularização do vídeo. "Graças ao digital, nossos projetos saem do papel com muito mais facilidade."


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