São Paulo, segunda-feira, 18 de outubro de 2004

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ARTE

Na 26ª Bienal de São Paulo, dupla de artistas faz "colagem" de pinturas de jovens como símbolo da obsessão do século 21

Juventude sobre tela

ISABELLE MOREIRA LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

Imagine um editorial de moda. Meninas altas, magras, bonitas. Meninos idem. Todos jovens, com um olhar distante no rosto e roupas modernas no corpo. E as posições? Algumas estão no contexto fashion. Outras parecem ter saído de um livro de história da arte da estante da sua casa.
Quem já visitou a 26ª Bienal de São Paulo, no parque Ibirapuera, pode ter uma idéia do que estamos falando. Essa é uma das impressões que temos ao ver os trabalhos da israelense Adi Rosenblum, 42, e do austríaco Markus Muntean, 42, na mostra.
A dupla apresenta três pinturas e um desenho em grande escala de pessoas -a maior parte delas adolescentes- que mais parecem ter saído de catálogos de marcas famosas do que de uma obra de arte.
Adi Rosenblum afirma que a dupla escolheu mostrar figuras adolescentes atuais devido à "obsessão das pessoas pela juventude", exemplificada em revistas de comportamento. "O fato é que nós vivemos em uma sociedade que mostra, o tempo todo, imagens de jovens lindos. As pessoas estão completamente obcecadas por isso", diz a artista.
Mas defende que essa é apenas uma das muitas referências do trabalho, que deve ser visto em "várias camadas". "Nós não estamos tentando fazer o retrato de uma geração. Nós usamos os jovens pelas suas imagens e não queremos fazer um realismo social", completa.
Outros elementos reforçam a intenção dos artistas. Em cada tela, pelo menos uma figura remete às representações do passado ou até mesmo a uma situação religiosa -como no caso da pintura exposta na Bienal, que mostra um menino segurando um skate na mesma posição de Jesus Cristo crucificado de pinturas sacras.
As imagens dos adolescentes são construídas como em uma colagem. A dupla de artistas reproduz na tela a cabeça de um modelo mostrado em uma revista. Essa cabeça será completada com o corpo de outro modelo, de outra revista. Isso tudo é colocado em um cenário de uma terceira imagem, copiada de um anúncio publicitário ou de uma pintura famosa, por exemplo.
"Nós queríamos reciclar imagens da cultura de massa e colocá-las em um contexto totalmente novo, ligado à pintura", afirma.
O novo contexto buscado pela dupla seria o equivalente contemporâneo ao que pintores -como o italiano Caravaggio (1573-1610), sua forte influência- usaram no passado. "Alguns falam que nós mostramos jovens usando sempre roupas lindas. Mas, se você prestar atenção nas pinturas do passado, vai notar que os pintores também mostravam as pessoas em suas melhores roupas. Nós estamos tentando fazer a mesma coisa, de uma maneira atual."
Outra estratégia a que os artistas recorrem é o uso de uma borda branca ao redor das telas, que tem como intenção passar a idéia de que a pintura não está completa. A dupla deixa para o público a tarefa de pensar sobre o que mais poderia estar ali.

Storyboard
Para completar a composição das telas da dupla Muntean/Rosenblum, há frases no pé de cada um dos quadros, que não exatamente os explicam, mas fazem pensar.
Em um deles está escrito: "Fomos levados a acreditar que os tempos mudam rapidamente agora e que a história se move cada vez mais rápido. Mas o tempo não muda. É o ritmo, a nossa maneira de ler o tempo, que muda".
Adi explicou que as frases não são criadas unicamente por eles. Assim como as imagens, são copiadas aos pedaços. "Nós pegamos três palavras de um livro, mais outras três de uma revista e por aí vai."
Da maneira como estão dispostos, esses pequenos textos funcionam como um componente, quase independente, que deixa o trabalho próximo de HQs e de "storyboards".
Os temas escolhidos são bem genéricos -amor, morte, amizade. Adi acredita que isso faz com que a obra possa ser entendida em qualquer lugar do mundo. "Além disso, as revistas de moda e comportamento estão em todos os lugares."


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