São Paulo, segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

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comportamento

Meu verão na lan

Enquanto muitos aproveitam as férias para tomar sol, os LANmaníacos vão bater cartão na frente do computador

EDUARDO RIBEIRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Mês de dezembro, férias escolares, o solzão imenso tomando conta do céu e o calor batendo forte. Essa é a época perfeita para fazer aquela baladinha ao ar livre a que nunca se pode ir durante o ano letivo, descer para a praia, aproveitar a animação tropical para descolar uma namorada, tomar sorvete, andar de bike, ir ao clube, aos parques etc. Certo?
Errado. Ao menos no mundo dos LANmaníacos. Para essa turma, estamos mesmo é na temporada ideal para aproveitar o tempo de ócio e se entocar nos chamados "corujões" que rolam nas LAN houses. São maratonas em que os jogadores passam a madrugada inteira na batalha virtual.
"Nas férias fica bem cheio, só que lá pelo fim da tarde, porque o pessoal dorme bastante e depois vem correr atrás do prejuízo", afirma Tiago Batista dos Santos, 18. Para ele, que joga desde os 13 e se considera "fanático", "jogar na LAN é muito mais empolgante do que em casa por causa do clima. Dá mais emoção, a gente sente a energia da competição, coisa que em casa não rola".

Vips
Tiago costuma passar de 4 a 5 horas por dia na LAN, o que lhe custava boa parte da economia pessoal até se tornar ajudante e começar a jogar de graça. Os vips são uma política em todas as lojas que possuem clãs -os times competitivos que as representam em campeonatos. Se o cara mostrar que é craque e ainda por cima for cliente assíduo, do tipo que passa a tarde toda na LAN, ele acaba ajudando em tarefas simples e, em troca, ganha passe livre para treinar.
Ângelo Girardello, 17, por exemplo, é gamer de carteirinha e já chegou a gastar R$200 por mês durante um tempo até entrar para os clãs. "Com a grana que já gastei em LAN, daria pra comprar uns três computadores", calcula o rapaz, que já fez parte de três equipes diferentes: Shot, Zero e Reload.
Não à toa, já que Ângelo pratica todo santo dia e, aos finais de semana, vira a noite no corujão sempre que pode. Ele conta que já chegou a ficar 26 horas jogando direto, para desespero da mãe.
"Eu acho legal que meu filho tenha esse hobby, mas ele tem que procurar outras formas de se entreter, como ir ao cinema, jogar uma bola, sair com os amigos. Ele só pensa em LAN house, o esporte dele é só apertar botãozinho", reclama a comerciante Ana Maria, 42.

Superexposição
Na visão do médico Jou Eel Jia, clínico geral especializado em saúde mental, o mergulho no mundo virtual não é necessariamente algo ruim, mas casos de meninos que passam longos períodos jogando podem ser aquilo que chama de "narcotização da ansiedade", uma forma de "fuga dos desprazeres" que faz o jovem esquecer de si mesmo e criar uma espécie de segunda vida, onde ele pode conquistar objetivos com razoável empenho.
Isso, de acordo com o médico, prejudicaria as relações interpessoais e a formação do caráter. "É preciso ter regra, porque os games não são de todo mau, já é até mesmo provado cientificamente que eles podem ajudar no desenvolvimento das aptidões mentais, o que é bastante positivo", fala Jia, que já tratou de casos de estafa mental e insegurança causados pela superexposição aos games.

Nas férias, todo dia
Paulo Henrique Lima, 17, é colega de Ângelo e freqüentador de uma casa de jogos no Ipiranga. Agora, nas férias, tem ido à LAN uma vez por dia, mas sua rotina não é sempre assim. Durante as aulas, joga uma vez por semana. Porém, sempre faz a maratona do corujão, passando de 11 a 12 horas seguidas. "É um hobby extremamente viciante", comenta ele, ao dizer que tenta se policiar para não desapontar os pais, que confiam nele para não passar dos limites.
Lucas Nazue, 19, freqüenta a LAN quatro vezes por semana e não se considera viciado. "Mas já fui muito." Por conta disso, ficou mais de um ano sem jogar e voltou a praticar em 2005. Hoje, não joga mais que duas horas por dia, mas mesmo assim ouve um monte em casa: "Minha mãe odeia que eu jogue, fala que vou ficar maluco".


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