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saúde
O mundo em preto-e-branco
Mesmo com todo o sofrimento que sentem, muitos
jovens não percebem que são vítimas de depressão;
saiba quais são os sintomas da doença e veja se é hora de pedir ajuda
LEANDRO FORTINO
DA REPORTAGEM LOCAL
Todos os dias, Mariana acordava e queria
que o dia passasse
muito rápido para
poder voltar de novo
para a cama. Com 15 anos na
época, só se sentia bem no
quarto, dormindo. Não queria
fazer mais nada, não tinha interesse em nada, nem emoções.
Obrigada a morar nos EUA
por conta do trabalho do pai,
Mariana não fazia questão de
conhecer pessoas. Não tinha
amigos e ficava ansiosa em ter
de corresponder às expectativas dos colegas de escola em relação a ela. Acabava sempre só.
A vida de Mariana, que hoje
tem 21 anos, se repete em adolescentes de muitas outras famílias. Mas, diferentemente
dela, muitos desses jovens não
procuram ajuda psiquiátrica ou
psicológica por não saberem
que esse comportamento é
uma doença chamada depressão. E, se não for tratada, ela
pode trazer graves conseqüências ou até levar ao suicídio.
Segundo Lee Fu I, psiquiatra
infantil do Instituto de Psiquiatria da USP e conselheira da
Abrata (Associação Brasileira
de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos), a depressão é causada por
uma soma de fatores biológicos, psicológicos e sociais.
Em primeiro lugar, há indivíduos que nascem com predisposição genética para a depressão. Mas doenças crônicas, esforço e estresse físicos também
podem ser causas, porque prejudicam processos mentais.
O fator psicológico é o que
aconteceu na vida, algo grave
ou a morte de um parente próximo, ou mesmo uma série sucessiva de coisas desagradáveis,
mas não tão graves, como o fim
do namoro, a morte do cachorro e um assalto.
Já o fator social são fatos que
acontecem há muito tempo e
devem continuar, como morar
em uma cidade violenta ou pais
que brigam o tempo inteiro.
"A soma das três coisas pode
levar à doença. Mas a principal
é a predisposição, já que muita
gente, por exemplo, perde entes queridos e não entra em depressão", explica a médica.
Porém, para quem sofre da
doença e não sabe, as causas
pouco importam, já que o sofrimento é grande. "Tinha muitos
amigos, mas, quando estava deprimido, não queria vê-los,
queria ficar no meu canto. Dava vontade até mesmo de me
matar. Depressão é um bagulho que faz você pensar de tudo", conta Marcelo, 17.
Aos dez anos, ele começou o
tratamento, feito com a associação de remédios antidepressivos, receitados por psiquiatras, e terapia, conduzida por
psicólogos ou psicanalistas.
Ao mesmo tempo que sofria
sozinho, Marcelo ficava irritado com tudo e tinha um comportamento muitas vezes violento. Até um aparelho de TV
ele chegou a jogar no chão.
"Melhorou muito quando
comecei a tomar os remédios.
Mas só fui me sentir bem com
15 anos, pois comecei a perceber que não adiantava ficar
bravo, que era uma coisa passageira. Comecei a me tocar. O
remédio ajudou muito, porque
ele faz você não se sentir mal."
A terapia também o auxilia
até hoje. "Converso sobre tudo
o que acontece comigo, falo o
que sinto, como está a minha
cabeça, o que eu posso fazer para melhorar o meu futuro", diz.
Depressão normal
Variações de humor nessa
idade são normais, por causa
das mudanças físicas e hormonais e pelo questionamento e
pela busca de uma série de novos valores que não eram claros
na infância. "Quando avaliamos adolescentes, somos mais
tolerantes, porque é um período turbulento. Nessa idade,
eles dormem, agitam um monte e depois dormem de novo. É
normal", explica Leila Tardivo,
profª. de psicopatologia do Instituto de Psicologia da USP.
"A depressão implica disfunção, em ter algum prejuízo na
vida. Todo mundo tem os sintomas da depressão, porque
são sintomas humanos. O que
precisa ver é se a pessoa tem sofrimento em razão desses sintomas, como a dificuldade para
fazer novos amigos ou o baixo
rendimento escolar", explica o
psiquiatra Marcos Tomanik
Mercadante, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Segundo a jovem Mariana,
que hoje leva uma vida normal,
o primeiro passo antes de procurar ajuda é admitir que você
está mal. Não é o mundo que
está mal com você. "Tenha certeza de que vai passar uma hora
ou outra, de que você não vai ficar assim pelo resto da vida. Se
procurar ajuda, vai resolver."
A sensação de que o sofrimento nunca vai acabar é outro
agravante nos casos de depressão, pois, na adolescência, surge a noção de tempo infinito,
segundo a médica Lee Fu I.
"Como eles passam a saber
que existe a possibilidade de algo ser infinito e não têm experiência de vida, acham que
nunca solucionarão seus problemas. Para quem está deprimido, esse fator contribui para
tentativas de suicídio. É uma
armadilha da adolescência."
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