|
Próximo Texto | Índice
movimento
Mano Brown sem dúvidas
Manter-se na periferia ou crescer com a mídia? Para o líder dos Racionais, na estrada há 18 anos, a primeira opção é óbvia
André Caramante/Folha Imagem
|
Mano Brown, líder dos Racionais MCs |
DENISE BRITO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A descrição de uma
realidade dura e
crua, de pobreza e de
discriminação pela
polícia e pela sociedade são constantes nas letras
do rap, como é o caso do pioneiro Racionais MCs. Em 18 anos
de estrada, prestes a lançar o
quinto CD e mantendo a mesma formação original, Ice Blue,
Edy Rock, KL Jay e Mano
Brown conseguiram uma posição ímpar no cenário do rap.
Trata-se do único grupo que
obteve projeção nacional mantendo-se à distância da grande
mídia.
Mano Brown, 35, falou ao
Folhateen sobre o fato de
companheiros ingressarem na
grande mídia e sobre outros temas ligados aos rumos do país.
FOLHATEEN - Qual a sua opinião sobre os colegas que fizeram contratos com a grande mídia?
MANO BROWN - Somos jovens
cheios de vontade de vencer e,
às vezes, somos arrogantes.
Quando a mídia abriu as pernas
e disse "vem", a gente falou
"não". Mas, se hoje chegou o
momento de alguns companheiros ocuparem a mídia, eu
não vou oprimir a vontade deles. Sou a favor da liberdade.
FOLHATEEN - Você se refere também ao Thaíde, que começou junto
com vocês e hoje está numa minissérie da Globo ?
BROWN - O Thaíde não tem o
pensamento igual ao nosso,
mas temos mais coisas em comum do que diferenças. Ele conhece o rap, está na estrada há
anos e conhece os espinhos.
Cada um defende com amor as
suas razões, e elas não são
iguais. Porque os pretos não
têm todos as mesmas idéias.
FOLHATEEN - Você apoiou o Lula
nas eleições? Chegou a pedir voto?
BROWN - Democracia é isso.
Pedi voto para o Lula em
shows. Fui pelo olhar e pelas
idéias dele.
FOLHATEEN - Houve mudanças no
panorama da vida na periferia nesses últimos anos?
BROWN - Eu não sei até que
ponto conseguimos fazer esse
tipo de análise. Vejo pequenas
mudanças. Uma que me deixou
contente foi um aumento do
pequeno comércio nas ruas das
favelas. Salões de beleza, pizzarias, locadoras, e os bares perdendo espaço. Acho que prefiro
não ver as mudanças para não
perder a ambição de fazer outras. Eu sempre quero mais.
FOLHATEEN - O que você gostaria
de ver mudar?
BROWN - Tenho sonhos românticos, com a população ouvindo música nas ruas, se dedicando a uma atividade dentro
de seu próprio bairro, fazendo
academia, cuidando do corpo,
tendo uma boa alimentação...
Mas isso tudo não está tão longe. Há metas próximas, como a
divulgação da prática de esportes. O ser humano atrás da favela também pode ser sensível.
FOLHATEEN - O crescimento do rap
atrapalha ou ajuda o movimento?
BROWN - Quando você se impõe e passa a ser uma coletividade não é ruim; é bom para o
rap. Ao mesmo tempo, os valores não são aqueles que se gostaria de difundir. Há muita valorização de roupas, aparência,
cabelo. Ainda mais para nós,
que somos pretos, se vestir melhor faz muita diferença. Mas
não me agrada ver os irmãos escravos de marcas. É a escravidão do século 21. É ficar pondo
comida na boca do monstro.
FOLHATEEN - Como você vê o alcance do discurso do rap?
BROWN - Esse discurso contra
a elite foi defendido por toda
uma geração. De 1988 até hoje,
2006. Algumas idéias foram insistentemente repetidas durante uma época, em palavras,
em discos. Essa mensagem de
vencer, de lutar, seja negro, tenha orgulho, não abaixe a cabeça, responda, estamos juntos.
Como filosofia de vida, a primeira que aprendi e fielmente
tentei seguir foi "se imponha,
você não depende deles, muitos
de nós já foram esmagados".
Próximo Texto: Frases Índice
|