São Paulo, segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

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AUTOESTIMA OU VIOLÊNCIA?

AULAS DE JIU-JÍTSU SÃO USADAS COMO TÉCNICA "ANTIBULL YING", MAS PODEM COLOCAR JOVENS EM RISCO MAIOR

Guilherme Pupo/Folhapress
O professor Júlio Migliorini durante aula de jiu-jitsu no colégio Opet, em Curitiba

CHICO FELITTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Aulas de jiu- jítsu têm sido ofertadas a adolescentes como ferramenta "antibullying", na contramão da máxima que diz "violência gera violência".
Na teoria, o aumento da autoestima do praticante pode ajudá-lo a superar provocações de colegas. E as técnicas dessa arte marcial permitiriam ao jovem se esquivar de uma agressão.
Na prática, fica a sugestão de que golpes podem resolver conflitos adolescentes.
"Treinar alunos para se defender com luta é estimulá-los a usar a violência física para combater a violência psicológica", diz Rosa Maria Macedo, da psicologia da PUC. "Melhor é resolver conflitos pacificamente."

PROPAGANDA
Na porta do colégio Dante Alighieri, em São Paulo, circulou um panfleto com o título "Proteja seu filho" no topo do desenho de um garoto prestes a apanhar de outro.
A filipeta vendia aulas particulares de jiu-jítsu e foi distribuída pelo professor, o faixa-preta Renato Esteves.
Os pais de seus alunos, diz ele, querem que os filhos mudem de comportamento. "Eles passam de vítimas a pessoas mais confiantes."
Aluno de outro "personal mestre", Filipe Carese, 17, diz que procurou a luta para "estar pronto". Pronto para o quê? "O que pintar na vida. Nas aulas, a gente aprende mais a ter visão de vencedor do que a lutar."
O pai, Nelson, ficou com medo de o filho se machucar nas aulas. "Nunca aconteceu. Agora, ele sabe se virar."
Achar que a luta evitará o "bullying" é simplismo, diz Suraya Darido, especialista em ensino de lutas da Unesp. Para ela, a propaganda foca em pais que são tão ou mais frágeis do que os filhos.

NAS ESCOLAS
No ano passado, o jiu-jítsu se juntou a futsal e judô como atividade no colégio particular Opet, em Curitiba.
A aula é "focada no "bullying" e também em aceitação e igualdade", diz o professor Júlio Migliorini, vice-campeão sul-brasileiro.
"Se um colega maior e mais forte vem me bater, por que não tenho o direito de me defender?", pergunta Julio Migliorini. "A recomendação é aprender a se livrar da agressão. Quando você derruba o agressor no chão, pode até machucá-lo depois, mas a orientação é dizer apenas que aquilo não pode voltar a acontecer."
Para o psicólogo Miguel Perosa, a violência nunca é a melhor resposta. "Mas pode ser um recurso para o último caso", diz. "A denúncia é o primeiro passo. Mas não há diálogo com quem espanca."

AGRESSÃO X DEFESA
As técnicas aprendidas em aula podem, no entanto, servir de motor para agressões, ao invés de defesa.
Foi assim com um aluno de 17 anos do Opet. Ele bateu em outro de 14 anos. Foi suspenso das aulas de jiu-jítsu e transferido para outra unidade do colégio. "Era só um encrenqueiro", diz Migliorini.
Para a especialista da Unesp, "essas aulas podem passar uma lógica perigosa de que bater resolve os problemas. "Ensinar jiu-jítsu com o intuito de defender jovens pode, no fundo, colocá-los em risco maior."
O conselho: relate provocações para os pais e a escola. A psicóloga Ana Olmos resume a questão: "É no diálogo que se vence de verdade."


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