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CINEMA
"Ken Park" aborda adolescentes encurralados por adultos
Quando não há para onde fugir
FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL
Na vida, nem tudo se pode escolher. Há coisas que fogem à nossa vontade. Uma delas é a família
-um presente que não podemos
recusar, mesmo que não seja de
nosso agrado.
"Ken Park", filme do controverso Larry Clark que estréia no início
de dezembro, trata justamente da
"sobrevivência à família", como
gosta de dizer o diretor, e cutuca a
ferida em que não se quer tocar: o
lado podre dessa instituição que se
esconde sob o preceito moral de
que o lar e os pais próximos são o
grande alicerce da juventude.
Clark atribui à família desestruturada o papel de vilã da vida dos
jovens -que, no filme, ora conseguem cair fora de um ciclo atordoante, ora não sobrevivem aos
pesadelos que ele proporciona.
"A família é um acidente na vida.
E o jovem tem de se livrar dela, seja
ela boa ou não. Caso contrário, a
vida não ganha um sentido próprio", comenta Rosely Sayão, psicóloga, consultora em educação e
colunista da Folha. "Mas não se
pode dizer que a família seja a
grande culpada por todos os problemas do jovem. Não se pode desconsiderar a liberdade de escolha
que começa a ser exercida na adolescência", pondera.
Juventude transviada
A saga de "Ken Park" começa
com o suicídio de um garoto (o
próprio Ken Park) em uma pista de
skate na cidade de Visalia, na Califórnia. A partir daí, o filme acompanha quatro de seus amigos, cada
um com uma história mais absurda
que a outra, de olho na tríade hipocrisia americana, conflito de gerações e hormônios atropelados.
Shawn (James Bullard) adora sua
namoradinha da escola, mas, enquanto ela vai à aula, ele passa horas transando com sua "sogra" e
comparando as performances da
mãe e da filha. Claude (Stephen Jasso) passa por momentos difíceis
com seu padrasto durão, que adora
malhar, beber caixas de cerveja e
fazer outras coisas que é melhor
nem dizer aqui. Tate (James Ransone) detesta seus avós, com quem vive, porque, além de trapacearem
nos jogos de tabuleiro, insistem em
entrar no seu quarto sem bater.
Peaches (Tiffany Limos) tem um
pai ultra-religioso e carinhoso, que
se transforma em um maluco depois de flagrá-la na cama com seu
coleguinha de missa.
O filme segue a linha dos polêmicos "Kids" e "Bully", mas abusa de
cenas de sexo e de violência. Foi banido da Austrália e, no Brasil, foi
classificado como impróprio para
menores de 18 anos. "A verdade é
mais cruel do que o cinema a retrata, por isso meus filmes parecem
atordoantes", declarou o diretor à
Folha, em 2002.
Com "Ken Park", Clark tem sido
acusado de transitar no limite entre
a abordagem da realidade crua e a
pornografia adolescente. O diretor
usa imagens explícitas de sexo, de
abuso, de violência doméstica e de
masturbação sem motivo maior. A
idéia, já caduca -tanto devido a
seus próprios filmes quanto a dezenas de outras produções ácidas-,
é mostrar a decadência da sociedade americana, que esconde a sujeira debaixo do tapete e dos discursos moralistas. Novidade não há.
Mas, se o objetivo de Clark era chocar, isso ele consegue.
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