São Paulo, segunda-feira, 25 de maio de 2009

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economia

Em crise

Pesquisa mostra que, no Brasil, crise aflige mais os teens do que os adultos

CHICO FELITTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A vida de Samia Pereira, 14, anda bem estressante.
Seu pai, metalúrgico, foi demitido em março por causa da crise econômica e ainda não conseguiu um novo emprego.
A menina tenta economizar em casa: parou de acessar a internet (discada) nos dias de semana e não gasta um centavo com compras supérfluas -seguindo o exemplo do resto da família. Nesse ritmo, as economias domésticas devem durar até dezembro.
Ela se preocupa muito com o que vem depois disso. E não é só ela. Pelo menos é o que sugere uma pesquisa feita em abril pela agência de publicidade JWT, com 546 brasileiros.
Entre os entrevistados, 69% dos jovens de 13 a 19 anos disseram estar nervosos com a crise econômica mundial. Já entre os maiores de 23 anos -geralmente responsáveis por sustentar suas famílias- o número dos que dizem estar tensos com a crise cai para 66%.
O fenômeno acontece só no Brasil. Nos outros cinco países onde o levantamento com jovens foi feito, eles nunca estão mais preocupados do que os adultos (veja gráfico ao lado).
Isso talvez se explique por motivos práticos: aqui, a crise chegou ao bolso da moçada. A mesada de um terço (34%) dos jovens entrevistados diminuiu de 2008 para 2009.

Carreira ou beleza
A queda na renda faz com que alguns jovens repensem suas prioridades.
Prestes a fazer 18 anos, Rafael Moraes trabalha à tarde em uma papelaria e faz bicos de informática. Com a renda mensal de R$ 200, paga as aulas de computação e o dentista.
"Tiro o aparelho, se for preciso, mas vou continuar pagando o curso, que é um diferencial na carreira", diz.
Não que ele precise, pois seu pai se deu bem com a crise. Fabricante de caçambas para entulho, ele não mudou seus preços. Mas a matéria-prima está mais barata, e seu lucro, maior.
Como Rafael, os jovens da pesquisa consideram seu futuro profissional uma prioridade. Carreira foi a segunda maior preocupação declarada -só atrás de poluição ambiental.
Quando o papo é consumo, a preocupação dos jovens de 13 a 19 anos é com o Orkut nosso de cada dia: 92% dos entrevistados disseram que sofreriam para largar a internet.
A fissura pela rede e por celulares (80% não falaria menos tempo no aparelho) é lógica, diz Ken Fujioka, diretor de planejamento da JWT.
"O que os adolescentes nunca abandonam é a relação entre eles. Internet e telefone celular ajudam essas relações a acontecer mais vezes e em diferentes níveis", diz Ken.
Para o executivo, os momentos difíceis podem mudar hábitos de consumo, mesmo os de quem não foi afetado pela crise.

Crise? Que crise?
Juliana Kaufmann, 18, integra a metade dos entrevistados que diz não haver crise em casa.
E aproveita: usa o salário do estágio numa agência de comunicação para pagar noitadas, maquiagem e roupas.
Mas, por mais que ache que "adolescente não liga muito para essas coisas", ela acredita que "uma hora, [a crise] chega".
Se isso acontecer, ela diz que deixaria as gastanças com figurino e "make", que chama de "o fútil", de lado -diferente dos 70% de teens que não diriam "tchau" às compras de roupas.
Mas ela acha que não vai precisar apertar o cinto: "Estagiários não estão sendo mandados embora do emprego. Por serem os cargos mais baixos, têm seu emprego garantido", afirma.
Mesmo com sua mãe, empresária, sendo obrigada a demitir funcionários, Juliana diz que nunca conversou sobre o abalo econômico em casa. Assim como 64% dos jovens da pesquisa.
Em uma coisa, no entanto, Juliana concorda com a preocupada Samia: é preciso ser otimista. Enquanto a primeira diz que "a gente tem que ter esperança, mas sempre se informando", a segunda torce para que tudo acabe: "[A crise] tem que passar rápido. Se não passar rápido, tá tudo ferrado!"

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