São Paulo, segunda-feira, 28 de julho de 2008

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comportamento

Tolerância Zero

Surpreendidos pela lei seca quando finalmente tiraram carta de motorista, jovens contam como estão se virando para sair à noite


Rodrigo deixa o carro em casa na hora do chope

LETICIA DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Para muitos jovens, fazer 18 anos e tirar a carteira de motorista era o momento mais aguardado da adolescência, quando finalmente teriam liberdade para circular pela cidade sem depender da carona dos pais.
Há um mês, no entanto, uma nova lei de trânsito, a chamada lei seca, passou a punir severamente (veja quadro ao lado) quem tomar um trago e se aventurar no volante.
Em pleno mês de férias, as baladas se tornaram uma ameaça. Quem insistir em estrear o carro novo e tomar um drinque, corre o risco de perder a carteira por um ano ou ainda ir para a delegacia. A saída foi improvisar ou manter o esquema anterior.
"Foi uma decepção. Acabei de tirar carta e já tive que voltar ao esquema da adolescência", lamenta o estudante de administração David Steuer, 18.
Apesar de achar a lei muito rígida, David não se arrisca a desrespeitá-la. "Uso o carro para outras coisas também, não quero correr o risco de perder a carta por um ano", diz. O jeito foi apelar para o táxi ou pedir carona para os pais.
Com carteira de motorista há dois meses, Isabel Hering teve de pedir aumento da mesada por conta dos gastos com táxi para baladas. "Estou gastando mais, mas não deixo de sair", garante a estudante, que também adota o rodízio na turma: quem dirigir, não bebe.
Para Rodrigo Olivé, 18, três meses de carteira de motorista, a balada deu uma "miada". "Agora tem que ser tudo mais programado, tem que decidir se vai beber ou não, se vai de carro ou não", comenta.
Ele também adotou o esquema de revezamento de motoristas na turma, mas, quando sai só com a namorada, o passeio acaba ficando mais careta mesmo. "Não tem graça beber sozinho, então ficamos os dois no refrigerante", lamenta.
Com essas limitações, ele decidiu explorar melhor o bairro onde mora. Assim, quando a namorada passou no vestibular, a comemoração foi no boteco na esquina da casa dele. "Foi todo mundo a pé, foi muito mais prático".
Quem não quer ou não pode gastar dinheiro com táxi e mora longe dos bairros badalados acaba sofrendo mais. É o caso do estudante de engenharia Fabiano Linhares, 23, que mora no Jabaquara e freqüenta os bares da rua Augusta.
Como não dispensa uma cervejinha, a saída é deixar o carro na garagem e usar ônibus ou metrô. "O problema é que o transporte público deixa muito a desejar", reclama.
Para ele, o maior problema é o horário de funcionamento do metrô (que termina à meia-noite), além da escassez de linhas de ônibus.
Ele conta que, uma vez, chegou a dormir na rua por uma hora, em frente à estação de metrô esperando pela abertura. "Foi a maior roubada. Se funcionasse 24 horas, todo mundo iria preferir sair à noite de metrô a pegar o carro."
Ele acha que ficou mais difícil se divertir em São Paulo após a lei seca. "Tenho saído menos de casa. Agora, a balada tem que valer muito a pena."
Filipe Bragança, 18, observa que também ficou mais difícil paquerar. "Um chopinho ajuda a quebrar o gelo, deixa as pessoas mais soltas. Sem tomar nada, fica mais difícil xavecar."
Na internet, o assunto também tem dado o que falar. Além de centenas de comunidades no Orkut, há correntes de e-mail dando conselhos para os motoristas se safarem do bafômetro: colando adesivos religiosos no carro ou tomando Coca com gelo na hora do teste.
Mas, por mais que tenha dificultado a vida dos baladeiros chegados no drinque, a lei foi aprovada pela maioria dos entrevistados. "É uma questão de bom senso. Eu não me importo em deixar de beber numa balada para garantir a minha segurança", defende Iolanda, 18.


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