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COMPORTAMENTO
Vira, vira, vira
Curiosidade é a principal razão apontada pela maioria dos jovens para o primeiro gole de álcool; aos 15 anos, mais de 30% deles já tomaram porre
DIOGO BERCITO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Foi por curiosidade. Meus
amigos falaram
"bebe aí" e eu
disse "tá bom"." Assim, Caio*
provou uma bebida alcoólica
pela primeira vez, aos 15 anos.
A experiência precoce do garoto não é um caso isolado. Aos
15 anos, 75% dos jovens brasileiros já beberam ao menos
uma vez na vida. É o que aponta
a pesquisa "Este Jovem Brasileiro - Álcool", do portal
www.educacional.com.br,
divulgada no início do mês.
O estudo, coordenado pelo
colunista do Folhateen Jairo
Bouer, foi realizado com 11.846
alunos de 13 a 17 anos, de 96 escolas de todo o Brasil.
A curiosidade, motivo apontado por Caio para seu "batismo", aparece como a principal
razão que levou 54% dos jovens
a experimentar álcool. Outros
40% apontaram a diversão como o maior incentivo.
Segundo a pesquisa "Jovens
Brasileiros", realizada pelo Datafolha em 2008, 58% dos jovens de 16 e 17 anos que costumam beber disseram que seus
pais conhecem o hábito.
No caso de Caio, a prática,
adquirida após a primeira dose,
o levou a ser apelidado de "o do
Gorfo" na escola.
É que, durante um intervalo,
o rapaz saiu do colégio, tomou
vodca e voltou, bêbado, para a
aula de artes. "Vomitei no corredor principal", conta.
Mas, se a venda de álcool para menores de idade é proibida,
de onde veio a bebida? "Dei dinheiro a uma mulher na rua e
pedi que comprasse para mim.
Ela ficou com o troco", diz.
De gole em gole...
A história, que Caio narra
com orgulho, é motivo de preocupação para médicos.
"O sistema nervoso ainda está sendo consolidado nessa idade, e o álcool pode inibir esse
desenvolvimento", explica Arthur Guerra de Andrade, psiquiatra e supervisor do Grupo
de Álcool e Drogas da Faculdade de Medicina da USP.
"O comportamento de risco
fica fortíssimo quando o jovem
bebe", completa. Entre as possíveis consequências estão a
prática de sexo sem o uso de
preservativo e aceitar carona
de motoristas alcoolizados.
Mesmo conhecendo as implicações desse hábito, nocivas
à saúde, aos 15 anos 31% dos jovens já tomaram um porre -ou
seja, beberam até passar mal.
Renata*, 15, não faz parte
desse grupo. Mas diz que está
se esforçando para beber mais.
"Hoje, um gole já está bom!",
conta. "Ainda não consigo beber como minhas amigas, estou
indo aos poucos..."
Camila*, 19, começou há dois
anos, com três doses de tequila.
Ficou bêbada. Depois, entrou
na faculdade de administração
e passou a frequentar festas e
churrascos regados a álcool.
"Agora, precisa de sete doses
para me derrubar!", comemora.
Outro que aproveita a vida de
universitário para beber é Bruno*, 19, que cursa ciência da
computação e mora em uma república estudantil no interior
de São Paulo. Como Camila, começou com o álcool aos 17.
"Aqui tem festa três, quatro
vezes por semana, e, quando
não tem, a gente se reúne em algum bar", conta o garoto.
Os jovens ouvidos pela reportagem dizem ter começado
a beber devido à curiosidade.
Mas mantêm o hábito. Por quê?
"Fico mais solta, mais alegre,
e acho isso legal", sugere Luciana*, 15. E faz a lista dos lugares
em que é fácil comprar bebida
sendo menor de idade: lojas de
conveniência e supermercados.
A psicóloga social e da educação Ana Bock, da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica),
aponta uma possível razão para
essa facilidade. "Diferentemente de em um bar, nesses locais o cliente compra, mas não
consome a bebida na hora."
Para Bock, por trás da curiosidade do jovem em relação ao
álcool estão diversos valores
sociais, como a ideia -reforçada pela publicidade- de que a
bebida está associada ao poder,
ao sucesso e à atração física.
"O caubói empurra a porta do
bar, entra, bate no balcão e pede uma dose", exemplifica a especialista. "Todo mundo conhece essa imagem."
Perfis distintos
O consumo de álcool entre
jovens varia de acordo com a
classe social, segundo pesquisa
inédita do Cebrid/Unifesp
(Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas da Universidade Federal de
São Paulo), a ser divulgada ainda neste semestre.
"Percebemos que os estudantes de escolas particulares
costumam fazer "binge drinking" [beber mais de cinco doses em uma única ocasião], enquanto os de escolas públicas
apresentam consumo em mais
dias da semana", explica Zila
van der Meer Sanchez, farmacêutica bioquímica do Cebrid.
Para Sanchez, o álcool, que
atua no organismo primeiro
como estimulante e, em seguida, como depressor, não deve
ser consumido por adolescentes. "O ideal é a abstinência."
Além do Cebrid, o Cratod
(Centro de Referência de
Álcool, Tabaco e Outras Drogas), ligado à Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, deve lançar até o fim do mês estudo inédito sobre o uso de álcool
por menores de idade.
*Todos os nomes foram trocados
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