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free way
Discursos de formatura
GUSTAVO IOSCHPE
especial para a Folha
À medida que se aproxima o
dia da minha formatura, começa a me dar um frio na barriga
-só de pensar em ter de
aguentar as formaturas de faculdades diferentes e seus intermináveis discursos já sinto
uma náusea. São todos sempre
iguais. "Estamos agora terminando uma nova etapa, e blablablá entrar no mercado profissional, e blabla blargh, e desafios, e blaaargh, e felicidades,
e progresso, e blaaaaargh, e
uma família,
e a realização
dos sonhos
de infância,
e..." Vômito
generalizado na platéia. Em
uma época
dominada
pelo entretenimento, precisamos de alguns
discursos mais
inspirados. Seguem algumas sugestões de estilo
para que os futuros
oradores não caiam
na modorra:
Xuxa - Queria
mandar um beijinho
pra minha mãe, pro
meu pai e pra você.
Politicamente
correto - Queria
repartir este diploma com todos os deficientes físicos e
mentais que não
tiveram a oportunidade de cursar esta instituição, pois é a eles que devemos nosso sucesso e é por eles
que devemos trabalhar no futuro.
Politicamente incorreto - Este canudo vai pros abobados,
que deixaram a minha vaga
aberta, pros anões, que não
conseguiram se inscrever por
não alcançar o balcão, pros balofos, que não passavam pela
porta, pros cegos, que acharam
mesmo que podiam acompanhar o pique lendo braile, e
também pro professor Gilberto, que, apesar de bicha e manco, é uma grande pessoa.
Comuna - Temos de dividir
este pedaço de papel que nos
dá acesso aos meios de produção com os marginalizados, os
oprimidos por uma superestrutura desigual e desumana.
Vamos criar uma sociedade solidária, em que todos possam
comer a professora Vera Lúcia
sem culpas.
Ecochato - É um absurdo que
ainda façam diplomas de papel. Sabem quantas árvores são
destruídas todo ano para imprimir estes diplomas? Silêncio. E quantas plantas de guaraná cerebral são arrancadas
durante a época de provas pra
que a gente fique acordado?
Roncos na platéia. Nós vivemos em um mundo que não vai
sobreviver até os nossos filhos terem idade suficiente
pra cursar a universidade.
Mais roncos. E vocês ignoram isso? Oh, não há solução, vou me suicidar para
salvar Gaia. Aplausos e gritos de "a-ti-ra, a-ti-ra".
Feminista - Passamos quatro anos de nossas vidas vivendo em uma instituição
patriarcal, onde o professor
significa a extensão da figura
paterna e as mulheres são
tratadas de forma depreciativa só porque as não-engajadas ficam retocando a maquiagem na aula e as engajadas estão engajadas com outras engajadas! É um abuso!
E ainda, quando nos formamos, recebemos este canudo, um
claro
simbolismo
do falo
que
nos
oprime. É
um absurdo ! Aqui pra vocês,
ó! Levanta a toga e balança um
pênis de borracha, pra delírio
geral.
Anarquista - E vocês acham
que eu vou reconhecer a legitimidade desta instituição só por
vocês me darem este diploma?
Existencialista - Será que eu
mereço este diploma? Por que
eu? Aliás, quem sou eu? O que
sou eu? Eu existo? Manhêêê!!
Lacônico - Valeu.
Lacônico, variações regionais
- No Rio: Maneiro, aí; na Bahia:
(Não chegou em tempo pra cerimônia... mucha preguiça);
em São Paulo: Noooooooossa.
Gustavo Ioschpe, 22, é escritor e estuda
administração na Wharton School e ciência
política na University of Pennsylvania, EUA,
e-mail: desembucha@cyberdude.com
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