São Paulo, terça-feira, 08 de setembro de 2009
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VALE A PENA SABER

FÍSICA

O que há de errado com essa máquina?

Se alguém construir um moto-perpétuo, as leis da termodinâmica terão de mudar profundamente

HUGO CARNEIRO REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A máquina ao lado é uma das primeiras propostas para a fabricação do chamado moto-perpétuo. Ele é composto de uma roda com martelos que podem oscilar como pêndulos.
Uma vez posto em movimento, os martelos no alto cairiam, empurrando a roda e fazendo com que os próximos martelos subissem. O movimento pendular de cada martelo ainda forneceria energia extra para o movimento da roda, que permaneceria girando indefinidamente. Dessa forma, poderíamos, em princípio, acoplá-lo a um sistema de transmissão e fazer uma máquina funcionar, como uma máquina de tear, por exemplo. Isso significa que o campo gravitacional forneceria energia para sempre! O tear nunca pararia de funcionar.
As propostas de motor perpétuo inundam os escritórios de patentes pelo mundo desde há muito tempo, mas sempre falham em seu propósito, que é o de construir uma máquina que produza mais energia ou trabalho do que consuma. Qual seria, então, o motivo da impossibilidade de construí-lo? Ou melhor, que leis da física impedem a humanidade de ter essa verdadeira maravilha?
Nesse caso, as leis da termodinâmica impedem a realização da imaginação humana. Um motor perpétuo viola um dos princípios fundamentais da física, o princípio de conservação da energia. Na história da humanidade, ninguém conseguiu construir uma máquina como essa. A primeira lei da termodinâmica nada mais é do que o princípio de conservação da energia para os fenômenos que envolvem o calor:
Q = T + U
Como a máquina realiza trabalho (T 0) ou transfere calor para o ambiente pelo atrito (Q 0), a energia interna U é menor que zero, o que significa que a energia interna final da máquina é menor que a energia interna inicial. Assim, em algum momento, ela esgotará toda a sua energia interna e deixará de funcionar. A máquina teria de criar energia para continuar funcionando, o que é impossível. Esse tipo de motor perpétuo é denominado moto-perpétuo de primeira espécie e produziria trabalho do nada ou criaria energia.
Existem ainda os motos-perpétuos de segunda espécie, que violam a segunda lei da termodinâmica. A segunda lei mostra que a energia fornecida para uma máquina não pode ser integralmente transformada em trabalho. Uma parte dela é perdida no processo. Ainda que pudéssemos eliminar o atrito (o que não pode ser feito), teríamos outro problema. Poderíamos imaginar um gerador elétrico ligado a um dínamo que recarrega uma bateria que alimenta o gerador.
Se não houver perdas por atrito, a energia fornecida pelo gerador é utilizada para manter o processo. No entanto, um motor perpétuo como esse seria inútil, pois ele consome toda a energia que produz. Não poderíamos acoplar nenhum outro tipo de máquina porque não haveria energia suficiente para os dois mecanismos. Motos-perpétuos desse tipo são de terceira espécie.
Mas então por que os projetos de moto-perpétuo continuam sendo propostos e colocados à prova nos órgãos responsáveis pelas patentes até hoje? Historicamente, as tentativas de construção de motos-perpétuos são anteriores à formulação das leis da termodinâmica. A cada tentativa fracassada, buscou-se compreender o motivo da falha. Isso, de certa forma, contribuiu para que os físicos formalizassem tais leis. No entanto, nada impede que os inventores continuem tentando. Caso alguém consiga construir um moto-perpétuo, as leis da termodinâmica necessitarão de profundas modificações.

HUGO CARNEIRO REIS é doutor em ciências pela USP e professor do colégio Móbile.

hcarneiro123@terra.com.br


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