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VALE A PENA SABER
FÍSICA
O que há de errado com essa máquina?
Se alguém construir um moto-perpétuo, as leis da termodinâmica terão de mudar profundamente
HUGO CARNEIRO REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA
A máquina ao lado é uma das
primeiras propostas para a fabricação do chamado moto-perpétuo. Ele é composto de
uma roda com martelos que
podem oscilar como pêndulos.
Uma vez posto em movimento, os martelos no alto cairiam,
empurrando a roda e fazendo
com que os próximos martelos
subissem. O movimento pendular de cada martelo ainda
forneceria energia extra para o
movimento da roda, que permaneceria girando indefinidamente. Dessa forma, poderíamos, em princípio, acoplá-lo a
um sistema de transmissão e
fazer uma máquina funcionar,
como uma máquina de tear, por
exemplo. Isso significa que o
campo gravitacional forneceria
energia para sempre! O tear
nunca pararia de funcionar.
As propostas de motor perpétuo inundam os escritórios
de patentes pelo mundo desde
há muito tempo, mas sempre
falham em seu propósito, que é
o de construir uma máquina
que produza mais energia ou
trabalho do que consuma. Qual
seria, então, o motivo da impossibilidade de construí-lo? Ou
melhor, que leis da física impedem a humanidade de ter essa
verdadeira maravilha?
Nesse caso, as leis da termodinâmica impedem a realização da imaginação humana.
Um motor perpétuo viola um
dos princípios fundamentais da
física, o princípio de conservação da energia. Na história da
humanidade, ninguém conseguiu construir uma máquina
como essa. A primeira lei da
termodinâmica nada mais é do
que o princípio de conservação
da energia para os fenômenos
que envolvem o calor:
Q = T + U
Como a máquina realiza trabalho (T 0) ou transfere calor
para o ambiente pelo atrito
(Q 0), a energia interna U é
menor que zero, o que significa
que a energia interna final da
máquina é menor que a energia
interna inicial. Assim, em algum momento, ela esgotará toda a sua energia interna e deixará de funcionar. A máquina
teria de criar energia para continuar funcionando, o que é impossível. Esse tipo de motor
perpétuo é denominado moto-perpétuo de primeira espécie e
produziria trabalho do nada ou
criaria energia.
Existem ainda os motos-perpétuos de segunda espécie, que
violam a segunda lei da termodinâmica. A segunda lei mostra
que a energia fornecida para
uma máquina não pode ser integralmente transformada em
trabalho. Uma parte dela é perdida no processo.
Ainda que pudéssemos eliminar o atrito (o que não pode
ser feito), teríamos outro problema. Poderíamos imaginar
um gerador elétrico ligado a
um dínamo que recarrega uma
bateria que alimenta o gerador.
Se não houver perdas por
atrito, a energia fornecida pelo
gerador é utilizada para manter o processo. No entanto, um
motor perpétuo como esse seria inútil, pois ele consome toda a energia que produz. Não
poderíamos acoplar nenhum
outro tipo de máquina porque
não haveria energia suficiente
para os dois mecanismos. Motos-perpétuos desse tipo são
de terceira espécie.
Mas então por que os projetos de moto-perpétuo continuam sendo propostos e colocados à prova nos órgãos responsáveis pelas patentes até
hoje? Historicamente, as tentativas de construção de motos-perpétuos são anteriores à
formulação das leis da termodinâmica. A cada tentativa fracassada, buscou-se compreender o motivo da falha. Isso, de
certa forma, contribuiu para
que os físicos formalizassem
tais leis. No entanto, nada impede que os inventores continuem tentando. Caso alguém
consiga construir um moto-perpétuo, as leis da termodinâmica necessitarão de profundas modificações.
HUGO CARNEIRO REIS é doutor em ciências
pela USP e professor do colégio Móbile.
hcarneiro123@terra.com.br
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