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QUÍMICA
Uma pequena grande diferença
LUÍS FERNANDO PEREIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Junho de 2003. Um erro em
uma indústria farmacêutica
provoca intoxicação em dezenas
de pessoas. Há uma morte confirmada e outras 15 suspeitas. A causa: um veneno chamado carbonato de bário (BaCO3). O Celobar
-medicamento que causou a
tragédia- deveria conter somente sulfato de bário (BaSO4). Mas,
na tentativa de transformar o carbonato em sulfato, algum erro fez
com que quase 15% da massa do
Celobar comercializado fosse de
BaCO3.
Pacientes tomam sulfato de bário para que os órgãos de seu sistema digestório fiquem visíveis
nas radiografias. É o chamado
contraste. O problema é que os
íons Ba2+ são muito tóxicos.
Quando absorvidos, causam vômito, cólicas, diarréia, tremores,
convulsões e até a morte. Cerca de
0,5 g é dose fatal. Mas, se a toxicidade é do bário, por que o BaSO4
não é perigoso e o BaCO3 sim?
É que o BaSO4 praticamente não
se dissolve na água. Sua solubilidade é de apenas 1,0 x 10-5 mol/L.
Isso significa que só há 0,00137
grama de íons Ba2+ dissolvidos em
um litro do medicamento. É muito pouco. O que os pacientes ingerem é uma suspensão aquosa desse sal em que a maior parte dele
não está dissolvida.
Sem dissolução, não há, praticamente, dissociação do sal
É por isso que os íons Ba2+ não são
liberados para serem absorvidos
pelo organismo. Não há perigo.
Ainda assim, só para garantir, essa suspensão costuma ser preparada em uma solução de sulfato
de potássio (K2SO4), um sal bastante solúvel em água. A função
desse sal é aumentar a concentração de íons SO42-. Desse modo, o
equilíbrio da dissociação do sal é
bem deslocado para a esquerda,
diminuindo ainda mais a presença de Ba2+(aq) na suspensão.
Com o BaCO3 é diferente. Apesar de pouco solúvel em água, ele
reage com o ácido clorídrico do
nosso estômago -o que não
acontece com o BaSO4- formando um sal solúvel, o cloreto de bário
Ao se dissolver, esse sal se dissocia, liberando íons bário para o
organismo. O corpo absorve esses
íons, e a intoxicação acontece.
Triste é saber que uma simples
gota de HCl, misturada ao Celobar, teria evitado a tragédia. Como você pode perceber pela reação acima, essa gota produziria
bolhas de gás carbônico (CO2), o
que evidenciaria a presença do veneno no medicamento.
Luís Fernando Pereira é professor do
curso Intergraus e coordenador de química do sistema Uno/Moderna. E-mail:
lula5@ig.com.br
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