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      São Paulo, quinta-feira, 16 de janeiro de 2003
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HISTÓRIA

A atualidade do movimento modernista


ROBERSON DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Um vício nacional, porém, impera: o vício da imitação. Tudo é imitação, desde a estrutura política em que procuramos encerrar e comprimir as mais profundas tendências da nossa natureza social, até o falseamento das manifestações espontâneas do nosso gênio criador... Transplantados, são quase nulos os focos de reação intelectual e artística. Passa pelas nossas alfândegas tudo que constitui as bênçãos da civilização: saúde, bem-estar material, conhecimentos, prazeres, admirações, senso estético."
Nesse trecho de "Retrato do Brasil", ensaio clássico publicado pela primeira vez em 1928, Paulo Prado expôs um traço herdado do passado colonial que irradiou sua influência por todo o período independente e marca presença profunda até os dias de hoje.
Uma das críticas mais devastadoras a essa inclinação das elites políticas e culturais do país pode ser observada no conhecedor mais agudo da nossa forma de ser: Machado de Assis. Quem quiser se divertir com uma crítica demolidora à fé exagerada nos poderes da ciência, defendida pelos positivistas (doutrina fundada pelo francês Augusto Comte) e muito em voga no Brasil na transição do Império para a República, leia "O Alienista". Machado de Assis é a prova inquestionável de que é possível viver num país na periferia do capitalismo e pensar o mundo numa perspectiva de independência e vanguarda.
Uma crítica mais abrangente, sistemática e definitiva a essa postura submissa teve de esperar até fevereiro de 1922, com a Semana de Arte Moderna, em São Paulo. O movimento propunha um resgate das expressões culturais autenticamente brasileiras, incorporando o que existia de mais avançado em termos de recursos formais, veiculados, sobretudo, pelas vanguardas européias. A prática da imitação cedia à busca da síntese. O "Manifesto Antropofágico", de Oswald de Andrade, dava bem a medida do projeto: alimentar-se do estrangeiro para dele retirar a força e as virtudes que permitissem uma expressão renovada da nossa própria forma de ser.
Apesar do enorme avanço representado por essa percepção, é comum a recaída nos esquemas da imitação submissa, como a que aconteceu ao longo da última década, quando o país se limitou a aplicar o receituário econômico formulado pelo chamado Consenso de Washington. Talvez seja hora do resgate do núcleo da proposta da Semana de 22.


Roberson de Oliveira é autor de "História do Brasil: Análise e Reflexão" e "As Rebeliões Regenciais" (Editora FTD) e professor no Colégio Rio Branco e na Universidade Grande ABC.
Email: roberson.co@uol.com.br


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