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      São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2003
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PORTUGUÊS

Perífrase ajuda a eliminar repetições

THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Não é novidade que a repetição de palavras, quando não é fruto de uma escolha estilística, constitui um defeito do texto, pois chama para si a atenção do leitor, detendo-o em vez de deixá-lo livremente deslizar no encalço de um raciocínio.
Para evitar as repetições, existem alguns artifícios, como a simples substituição de um termo por um sinônimo (o que nem sempre traz bons resultados, pois não existe sinonímia perfeita), o emprego dos pronomes e o uso das perífrases, que, grosso modo, são expressões ou frases que tomam o lugar de palavras.
Há perífrases que se tornaram verdadeiros lugares-comuns: quem diz que "caiu nos braços de Morfeu" quando pretende contar que adormeceu certamente não está sendo original. O vasto estoque de expressões perifrásticas de que a língua dispõe faz que muitos creiam ser o seu emprego uma prática antiquada e infensa ao princípio da objetividade.
É preciso observar, no entanto, que esse recurso de estilo é muito fértil e nem sempre está associado aos desagradáveis clichês. Um exemplo bastante conhecido está em "Os Lusíadas": "O caso triste, e digno de memória,/ Que do sepulcro os homens desenterra,/ Aconteceu da mísera e mesquinha,/ Que, depois de ser morta, foi rainha". Ora, aquela "que, depois de ser morta, foi rainha" é Inês de Castro, cuja história é contada por Camões no canto 3º da epopéia.
No dia-a-dia, também se usa a perífrase com freqüência. É o que se vê no seguinte trecho, extraído de notícia de jornal: "E aí uma série de lesões atrapalhou seus planos. Em dez jogos, Edmundo balançou a rede apenas duas vezes". O redator foi original ao optar pela perífrase em vez de apenas dizer que Edmundo fez dois gols.
"Ignoro se Rosa gostava de futebol (...), mas certamente ele se encantaria com a riqueza vocabular associada ao esporte mais popular do mundo." Nesse trecho, a perífrase veio socorrer o redator, que, com o auxílio dela, evitou a repetição da palavra "futebol".
Há situações em que a perífrase coabita com o eufemismo. Nos conhecidos versos de Manuel Bandeira: "Quando a Indesejada das gentes chegar/ (Não sei se dura ou caroável),/ talvez eu tenha medo", a perífrase substitui a palavra "morte" -com clara intenção eufemística.


Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha.
E-mail: tnicoleti@folhasp.com.br


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