|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PORTUGUÊS
Perífrase ajuda a eliminar repetições
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Não é novidade que a repetição
de palavras, quando não é fruto de uma escolha estilística, constitui um defeito do texto, pois chama para si a atenção do leitor, detendo-o em vez de deixá-lo livremente deslizar no encalço de um
raciocínio.
Para evitar as repetições, existem alguns artifícios, como a simples substituição de um termo por
um sinônimo (o que nem sempre
traz bons resultados, pois não
existe sinonímia perfeita), o emprego dos pronomes e o uso das
perífrases, que, grosso modo, são
expressões ou frases que tomam o
lugar de palavras.
Há perífrases que se tornaram
verdadeiros lugares-comuns:
quem diz que "caiu nos braços de
Morfeu" quando pretende contar
que adormeceu certamente não
está sendo original. O vasto estoque de expressões perifrásticas de
que a língua dispõe faz que muitos creiam ser o seu emprego uma
prática antiquada e infensa ao
princípio da objetividade.
É preciso observar, no entanto,
que esse recurso de estilo é muito
fértil e nem sempre está associado
aos desagradáveis clichês. Um
exemplo bastante conhecido está
em "Os Lusíadas": "O caso triste,
e digno de memória,/ Que do sepulcro os homens desenterra,/
Aconteceu da mísera e mesquinha,/ Que, depois de ser morta, foi
rainha". Ora, aquela "que, depois
de ser morta, foi rainha" é Inês de
Castro, cuja história é contada por
Camões no canto 3º da epopéia.
No dia-a-dia, também se usa a
perífrase com freqüência. É o que
se vê no seguinte trecho, extraído
de notícia de jornal: "E aí uma série de lesões atrapalhou seus planos. Em dez jogos, Edmundo balançou a rede apenas duas vezes".
O redator foi original ao optar pela perífrase em vez de apenas dizer que Edmundo fez dois gols.
"Ignoro se Rosa gostava de futebol (...), mas certamente ele se encantaria com a riqueza vocabular
associada ao esporte mais popular
do mundo." Nesse trecho, a perífrase veio socorrer o redator, que,
com o auxílio dela, evitou a repetição da palavra "futebol".
Há situações em que a perífrase
coabita com o eufemismo. Nos
conhecidos versos de Manuel
Bandeira: "Quando a Indesejada
das gentes chegar/ (Não sei se dura ou caroável),/ talvez eu tenha
medo", a perífrase substitui a palavra "morte" -com clara intenção eufemística.
Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da
Folha.
E-mail: tnicoleti@folhasp.com.br
Texto Anterior: Matemática: A matemática da sua impressão digital Próximo Texto: Física: A lei do deslocamento de Wien Índice
|