São Paulo, sexta-feira, 01 de março de 2002

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MÚSICA

Rui Mendes inaugura amanhã, em SP, mostra dedicada a retratar sambistas históricos em seus próprios ambientes

Fotógrafo do rock se rende ao samba

DA REPORTAGEM LOCAL

O Rui Mendes que se notabilizou como fotógrafo de nove entre dez bandas e discos do rock nacional dos anos 80 está de férias. Em seu lugar, entra em cartaz amanhã o autor da exposição "Heróis do Samba".
A mostra reúne, na Pinacoteca do Estado, em São Paulo, 23 imagens em preto-e-branco de grandes figuras do samba, das mais celebradas (como Guilherme de Brito) às mais marginalizadas (como Dona Shirley da Nenê, para Mendes uma "Aretha Franklin brasileira, que nunca teve chance de gravar um disco").
A tônica que une as fotos, de sabor "impressionista" segundo o autor, é a de flagrar sambistas cariocas e paulistas como Dona Ivone Lara, Nelson Sargento, Germano Mathias, Mestre Fuleiro, Osvaldinho da Cuíca e outros em seu habitat natural, quase como se fizessem parte da paisagem -as salas de suas casas, quase sempre.
A idéia surgiu em 1994, de uma reportagem que Rui Mendes, 40, fotografou para a extinta revista musical "Showbizz", inicialmente com cinco sambistas. De lá para cá, levou adiante a série, que já conta com 38 fotografados.
"O objetivo, para mim, era homenagear essas pessoas, tirá-las um pouco do ostracismo, mostrar que existem e que já foram muito importantes", define.
"O que mostro é a simplicidade e a precariedade em que essas pessoas tão importantes vivem. É uma denúncia, é dizer "acorda, gente"." Vários dos paulistas retratados prometeram presença na inauguração, amanhã.
O grupo reunido nas fotos inclui autores e intérpretes, mas não só. "Coloquei gente relacionada ao samba em geral. Dona Zica, por exemplo, está lá. A mostra ficou restrita a Rio e São Paulo, mas pretendo transformá-la em livro e documentário e aí fazer o Brasil todo, com Riachão da Bahia, Antonio Vieira do Maranhão..."
Na tentativa de institucionalizar o trabalho, encontrou os obstáculos de sempre: "Não consegui patrocínio, tive que investir do meu próprio bolso. Uma marca de cerveja me disse que não queria sua imagem atrelada ao samba".

E o rock?
Mais marcado por sua ligação com a geração rock, Rui Mendes se diz hoje desanimado com ela. "Sempre fui ligado ao rock, mas de uns anos para cá ele me encheu o saco. Na verdade, nunca ouvi muito rock. Nos 80 só ouvia porque era impossível não ouvir. Na época eu gostava, fazia parte, mas foi uma década de cópia, não há nada de original ali", esnoba.
Ainda assim, é imodesto ao citar sua participação naquela geração agora quarentona: "Criei um certo visual para as bandas, em mais de 300 capas de discos. Em muitos casos, criei a própria identidade das bandas. As atitudes do Ira! e dos Raimundos fui eu que criei. Eles vão dizer "não, imagina", mas é verdade".
Nega que a aproximação com o samba corresponda a qualquer desavença com o rock. "Gosto ainda de fotografar bandas, continuo fazendo. Mas meu trabalho pessoal, hoje, é com o samba".
Conta, então, experiências do Carnaval de 2002: "No centro do Rio, o Carnaval está renascendo. Vêm bandos de 60 bandidos da periferia, maravilhosamente indumentados, só criar confusão. Você passa por cadáveres no caminho e vê fantasias com Osama Bin Laden e Saddam Hussein estampados ao lado da frase "paz para quem merece". Ninguém sabe que isso tudo existe".
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


HERÓIS DO SAMBA - exposição do fotógrafo Rui Mendes.
Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, tel. 0/xx/11/ 229-9844).
Quando: a partir de amanhã, às 11h; de terça a domingo, das 10h às 18h.
Quanto: entrada franca.




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