São Paulo, quinta-feira, 01 de março de 2007

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Ai, Jesus!

Cantora luso-canadense estoura com álbum multiétnico, grava músicas em português e conta à Folha que negocia apresentação no Brasil

Mario Anzuoni - 9.fev.2007/Reuters
A cantora Nelly Furtado durante apresentação em Los Angeles


SYLVIA COLOMBO
EM LONDRES

"Vocês querem o dinheiro de volta?", pergunta timidamente Nelly Furtado ao auditório lotado do Hammersmith Apollo, tradicional casa de shows da capital britânica, na noite do último dia 21. As pessoas dão risada. Autoconfiança, definitivamente, não é o forte dessa cantora luso-canadense de 28 anos que, horas antes, distribuía bronquinhas aos integrantes da banda durante a passagem de som, por conta de detalhes do espetáculo. "Estou nervosa, essa é uma produção muito grande para mim", explicou Nelly à Folha, em entrevista feita no backstage do local, pouco antes de a cantora subir ao palco.
Parte da insegurança provavelmente vinha do fato de o prestigiado diário inglês "The Guardian" ter dito que faltara bom humor na esperada estréia da turnê "Get Loose", dias antes, em Manchester.
Entretanto, razões para ficar feliz Nelly tem hoje aos montes. Na semana anterior, ela havia faturado o prêmio de melhor cantora internacional no Brit Awards; seu CD mais recente, o variado e multiétnico "Loose", já ultrapassou a marca dos 4 milhões de cópias vendidas e, só como termômetro para medir o estouro no mercado dos EUA, sua participação em um episódio da série "CSI" foi recorde de audiência na mesma noite em que o seriado "Lost" voltou a ser exibido.
Nelly está bombando. E por trás de seu sucesso está uma mistura muito particular de descarado apelo comercial com um interesse por explorar as diferentes tradições musicais que a cantora vivencia por conta de suas múltiplas raízes.
Nascida no Canadá, ela é filha de pais açorianos e fala bem português e espanhol. "Mas, se penso muito rápido, preciso dizer as coisas em inglês", conta, em seu tom típico de quem está sempre se justificando.
Nelly vive em Toronto, cidade canadense conhecida pelo cosmopolitismo e volumosa presença de imigrantes.
Fã de música brasileira, ela diz que a língua portuguesa anda batendo às portas do seu repertório. "Tenho trocado e-mails com Gabriel O Pensador, penso que podemos realizar uma parceria logo." Duas faixas de "Loose" -"Te Busqué" e "All Good Things (Come to an End)"- ganharão versões em português. "Também quero gravar um fado, mas ainda tenho que amadurecer. É um gênero muito difícil."
Uma vinda ao Brasil para shows ainda neste ano está em negociação. "O certo é que o próximo álbum terá mais coisas em português e bastante percussão brasileira."
Em seu segundo álbum, "Folklore", lançado em 2004, Nelly já havia contado com a participação do seu ídolo número um, Caetano Veloso. O cantor gravou um trecho da faixa "Island of Wonder" em português -com o sotaque de Portugal. "Essa idéia foi dele. Eu adorei. Uma das coisas que mais aprendo ouvindo-o é que sempre é possível buscar uma solução original para as coisas", disse a cantora, cujos olhos brilham ao falar do baiano. "A tropicália é inspiradora porque apontava para a fusão, o experimentalismo, que hoje são tão vibrantes no pop."
De fato, o ecletismo faz de "Loose", produzido pelo norte-americano Timbaland, um álbum bastante original. Há reggaeton ("No Hay Igual"), que a cantora conheceu nas ruas de Miami; pop dançante ("Maneater") -às vezes pegajoso ("Wait for You")- ; rap e drum'n'bass; canções com muita percussão ("Say It Right") e uma balada latina pra tocar no rádio ("Te Busqué", dueto com o megastar pop colombiano Juanes).
Resta saber se essa globalização pop toda seguirá agradando tanto quem gosta de bossa nova como quem curte rap; quem prefere o exagero kitsh do cenário de seus shows ou está mais para os momentos em que toca guitarra sozinha. O risco de perder os fãs de um lado ou do outro não é pequeno, depende só de suas apostas.
Por enquanto, a "portuguesinha" segue dançando à vontade por aí, com gregos e troianos.


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