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Museus podem perder obras de Edemar
Decisão sobre o destino da coleção será dada pelo STJ; Museu do Ipiranga, MAC e MAE seriam os maiores prejudicados
Julgamento previsto para março decidirá se as mais de 12 mil peças pertencem à União ou à massa falida do Banco Santos
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
O vaivém judicial que engolfou a antiga coleção de arte de
Edemar Cid Ferreira pode acabar em prejuízo para os museus. As mais de 12 mil obras da
coleção que foram distribuídas
para instituições como o Museu do Ipiranga e o MAC (Museu de Arte Contemporânea da
USP) podem ir para a massa falida do Banco Santos e serem
leiloadas.
A eventual perda dos museus
depende de decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) sobre quem tem direito sobre os
bens que pertenceram ao antigo banqueiro: a União ou a
massa falida do banco.
O julgamento do STJ deve
ocorrer neste mês de março.
Em decisão provisória, o ministro Castro Filho, do STJ, optou
pela massa falida. Agora, um
grupo de ministros julgará o
mérito da questão.
O destino da antiga coleção
de Edemar foi parar no STJ por
causa de uma decisão do juiz federal Fausto Martin de Sanctis.
Em novembro de 2005, o juiz
deliberou que as obras da chamada Cid Collection deveriam
ficar com a União porque Edemar cometera o crime de lavagem de dinheiro -na mesma
decisão, ele entregou mais de
10 mil obras para sete museus.
Presente dos deuses
Na sentença que condenou
Edemar a 21 anos de prisão, de
dezembro último, Martin de
Sanctis explica melhor por que
os credores não têm o direito de
serem ressarcidos -segundo
ele, eles eram cúmplices nas
fraudes. O Banco Santos deixou
um rombo de R$ 2,2 bilhões.
A distribuição das obras para
os museus "foi um presente dos
deuses", segundo a historiadora Eni de Mesquita Samara, diretora do Museu Paulista da
USP (Museu do Ipiranga) -a
instituição recebeu cerca de
8.000 obras.
Entre outras preciosidades, o
museu ganhou o sarcófago de
uma múmia egípcia (cerca 1069
a.C.- 945 a.C.), um monumento
maia (300 d.C.- 900 d.C), uma
bíblia impressa em 1493, menos de 50 anos após a de Gutenberg, e um tablete com escrita
suméria de 1900 a.C.
"A USP não teria como comprar um acervo desses nunca",
diz Eni.
Arqueologia
A decisão judicial entregou
ao Museu do Ipiranga todos os
processos usados desde a invenção da fotografia, na primeira metade do século 19
-daguerreótipo, ferrótipo, fotos em papel salgado, em carvão, gelatina, daguerreótipos
estereoscópicos coloridos. Essa
diversidade abre uma frente de
estudos que não existe em museus brasileiros, afirma a historiadora Shirley Ribeiro, responsável pela documentação.
"O museu está parado há seis
meses para catalogar todo o
acervo. Agora vamos jogar tudo
para o alto? Não tem sentido tirar do museu um acervo que
beneficia o coletivo", diz Eni. O
Museu do Ipiranga gastou R$
50 mil na catalogação.
Prejuízo maior pode ter o
MAE (Museu de Arqueologia e
Etnologia) da USP, que recebeu
2.100 peças arqueológicas que
pertenceram a Edemar. A instituição já investiu R$ 500 mil
para receber o acervo, gastos
com instalações, reserva técnica, segurança e um seminário
que será realizado até o final do
ano, segundo José Luiz de Morais, diretor do MAE.
O imbróglio legal das peças
arqueológicas é ainda maior.
Caso o STJ decida que a coleção
de Edemar deve ficar com a
massa falida, será criado um
novo conflito : peças arqueológicas não podem ser comercializadas, de acordo com a Constituição.
"Creio ser impensável a retirada dessas peças arqueológicas do MAE. Não há como colocá-las à disposição da massa falida, isso fere um dispositivo
constitucional", diz Morais.
No caso do MAC, que recebeu cerca de 2.000 obras de
Edemar, das quais 1.450 são fotografias, a perda do acervo interromperia algumas linhas de
pesquisa, diz Helouise Costa,
vice-diretora do museu. "Não
há nenhuma coleção brasileira
que se equipare à do MAC depois que recebemos a coleção
de Edemar. Seria uma perda
muito grande se essas fotos
saíssem daqui", afirma.
As obras de Edemar cobrem
a história da fotografia do século 19 aos dias de hoje. Helouise
criou uma divisão que começa
com os pioneiros (Edouard
Muybridge e Étienne Carjat),
passa pela fotografia moderna
nacional e internacional (Rodchenko, Edward Weston, Thomaz Farkas), tem representantes da fotografia humanista
francesa (Robert Doisneau e
Man Ray), dos fotógrafos de
moda (Richard Avedon e Helmut Newton) e desemboca na
fotografia contemporânea
(Cindy Sherman, Andres Serrano e Chris Bierrenbach).
A coleção virou matéria de
um curso de pós-graduação e já
há dois estudantes que querem
desenvolver teses sobre ela.
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