São Paulo, domingo, 01 de março de 2009

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Ficção une devaneios de gênios da matemática

Romance de cientista traduz em prosa ideias de Alan Turing e de Kurt Gödel

Autora delineia conflito de ideias que geraram debates sobre os limites da lógica e o futuro da inteligência artificial de computadores

RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Não é preciso muito esforço para transformar as vidas dos matemáticos Alan Turing e Kurt Gödel em literatura. Com suas histórias atribuladas e suas mentalidades obsessivas, ambos já foram objeto de biografias convencionais que ganharam ares de drama teatral. Um livro que trata de conexões impensadas entre as ideias de ambos, porém, dá agora uma dimensão a mais para o trabalho dos dois pensadores, já reconhecidos como gênios. "Um Louco Sonha a Máquina Universal", romance histórico de Janna Levin, constrói um edifício imaginário sobre as elucubrações dos dois matemáticos, que viveram na primeira metade do século 20 mas nunca se encontraram (leia texto à dir.). Cosmóloga da Universidade Columbia, de Nova York, Levin talvez tenha encontrado uma forma de traduzir em literatura o âmago das ideias matemáticas de ambos. Mesmo quem é leigo suspeita que isso não seja tarefa fácil, mesmo para alguém acostumado a lidar com equações sobre buracos negros e sistemas caóticos. Com sua maneira de interligar os trabalhos de Turing e Gödel, porém, Levin conduz o leitor a uma visão de como duas descobertas no plano da matemática podem ter implicações importantes para a compreensão da mente humana.
Turing, que é tido por muitos pesquisadores como o primeiro cientista a conceber a idéia formal de um computador, também foi o primeiro a imaginar como uma modalidade de inteligência artificial poderia tomar forma. Fundamentado em princípios filosóficos materialistas, postulou que nada em princípio impediria a criação de um cérebro tão hábil e criativo quanto o humano, mas com circuitos mecânicos ou eletrônicos no lugar de neurônios.
Hoje, robôs ainda estão a a anos-luz de reproduzir a complexidade da mente humana, mas isso não significa que Turing estivesse errado por princípio, argumenta Levin, ao transformar em literatura os pensamentos que ela imagina terem sido os do matemático quando concebeu suas ideias.
Se a mente for redutível a uma máquina, por fim, aquilo que acreditamos fazer por livre arbítrio não passaria mesmo de impulsos programados.
Gödel se contrapõe a Turing, segundo Levin, por ter oferecido uma prova rigorosa de que a lógica -um sistema formal de pensamento- é incapaz de prever a matemática -esta, fruto da criatividade humana para interligar informações.
Levin confabula como a mentalidade obsessiva paranoica de Gödel pode ter contribuído para a formulação de seus teoremas, mas deixa em aberto a conclusão sobre o conflito de ideias a que eles levaram.

UM LOUCO SONHA A MÁQUINA UNIVERSAL
Autor: Janna Levin
Tradução: Ivo Korytowski
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 44 (224 págs.)



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