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COLETÂNEA
Livro apresenta 49 histórias do dramaturgo americano, que giram entre o trágico, o lírico e o patético
Em contos, Tennessee Williams confirma seu apreço por desajustados
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
Tennessee Williams, claro, é
mais conhecido por suas peças: "Gata em Teto de Zinco
Quente", "Um Bonde Chamado
Desejo". Mas muita gente se esquece de que, criador incansável,
também escreveu romances ("A
Primavera Romana da Senhora
Stone") e contos, como os desta
coletânea.
O primeiro dos textos da coleção, por exemplo, sobre uma rainha egípcia que se vinga dos assassinos do irmão, foi publicado
em 1928, quando Williams tinha
17 anos. Contava com 66, quando
elaborou o último. E, desde os 14,
segundo afirma, já era "escritor
inveterado".
O leitor encontra, em muitos, o
embrião de suas peças famosas,
como a situação de "Retrato de
Uma Moça em Vidro", que se
transformaria na trama de "À
Margem da Vida", ou "A Noite do
Iguana", que inspiraria o drama
teatral homônimo.
Mesmo os motivos e as obsessões do autor já estão aqui, em semente. No conto "A Bolsa Aljofarada de Uma Senhora", de 1930, o
protagonista esquiva-se das luzes,
procurando o refúgio nas sombras, como Blanche Dubois de
"Um Bonde...". Ecos de Stanley
Kowalski estão em "O Maneta",
cujo protagonista, um michê de
Nova Orleans dotado de irrefreável energia animal, é descrito como "estátua mutilada de Apolo".
Os personagens se dividem entre os que, diante do mundo invariavelmente hostil, anseiam por
"seguir em frente" (atitude em
que se oculta o "segredo da sobrevivência heróica da vida") e aqueles que procuram a evasão por
meio da fantasia, da expiação ou
das sombras, como o livreiro de
"Alguma Coisa de Tolstói".
É evidente a predileção de Williams por esses bovaristas existenciais ou pelos desajustados
-garotos de programa, párias da
sociedade. Do mundo, terreno
para a devoração do homem pelo
homem tanto no plano econômico quanto afetivo (ou até literal,
em alguns casos), quase nunca
vale a pena fazer parte.
Tome-se o conto "A Maldição".
Nem Marx obteria uma descrição
mais pestilenta de um grupo de
acionistas, chamados de "ninho
de baratas negras", ou Sartre alcançaria uma visão mais desoladora do nosso planeta, esse "curioso incidente da matéria" que se
move como um boi estúpido
"num sulco circular, arando porções de tempo para a conveniência do homem".
São descrições de grande impacto, que se casam perfeitamente com o tom entre trágico, lírico e
patético destilados pelas histórias.
Não é certo, portanto, julgá-las
apenas como um trampolim para
as realizações maiores do autor,
no palco. Gore Vidal assegura
que, sem disporem da genialidade
de Chekhov, elas logram envolver
o leitor, como nenhuma outra
narrativa de escritor americano,
com exceção de Mark Twain.
É mais do que isso, porém. Nos
seus melhores momentos, estes
contos, em termos formais, alinham-se entre os grandes do gênero -e, mesmo quando não se
mostram tão bem resolvidos estruturalmente, deixam entrever o
brilho sombrio de um artista que,
sem nenhuma crença na humanidade, comprazia-se em perscrutar a alma do homem.
49 Contos
Autor: Tennessee Williams
Tradução: Alexandre Hubner e outros
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 46 (696 págs.)
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