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entrevista
Para autor, longa recria obsessão com assassino
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Robert Graysmith, 64, é
desenhista e diz que até seria
capaz de escrever um roteiro
para cinema se ele fosse feito
só de imagens, mas sua vocação para detetive, aliada a
método e obsessão, o levou a
"Zodíaco" (Ed. Novo Conceito, 416 págs., R$ 39,90), um
dos dois livros que serviram
de base para o filme.
Graysmith produziu um
minucioso relato dos crimes
atribuídos ao assassino serial
que se autodenominou Zodíaco. Incomodado com os
limites da investigação policial, reuniu informações dispersas por diferentes cidades
e ouviu centenas de relatos.
O livro traz ainda cartas e
mensagens cifradas enviadas
pelo Zodíaco ao diário "San
Francisco Chronicle", onde
Graysmith trabalhou como
cartunista durante 15 anos, e
um posfácio sobre a realização do filme que, diz ele em
entrevista por e-mail à Folha, "trouxe de volta o sentimento daquele período".
FOLHA - O filme conseguiu recriar a atmosfera urbana gerada
pelos crimes do Zodíaco?
ROBERT GRAYSMITH - Completamente. [David] Fincher foi
além dos fatos e descobriu
novas pistas. Ele e sua equipe
recriaram a Redação do
"Chronicle" à perfeição. Tudo era autêntico e funcionava. Fincher foi muito cuidadoso. Sei que ele tem relação
pessoal com o caso. Em 1969,
quando tinha sete anos, ele
vivia em San Anselmo, na região de San Francisco [EUA],
e andava nos ônibus escolares que o Zodíaco ameaçou
explodir. Isso o torna o único
diretor capaz de contar de
forma verdadeira a história.
FOLHA - O personagem feito por
Jake Gyllenhaal corresponde, de
fato, a você?
GRAYSMITH - Ele capturou o
meu sotaque e os meus modos e ficou com a mesma
aparência que eu tinha. Temos ainda os cabelos da mesma cor. Jake interpretou a
mim como um ator, e não como alguém que me imitasse.
FOLHA - A dedicação ao livro colaborou para o fim do seu primeiro casamento, como no filme?
GRAYSMITH - Tristemente,
em certa medida. Estávamos
todos obcecados pelo caso,
com a diferença de que fui
mais longe. É surpreendente
que tenhamos sobrevivido
ao Zodíaco. A demorada perseguição a ele, com seus mistérios, tragédias e perdas, arruinou casamentos, desestabilizou carreiras e destruiu a
saúde de um repórter brilhante [Paul Avery, interpretado por Robert Downey Jr.].
FOLHA - Qual foi a sua participação no roteiro?
GRAYSMITH - Fincher, James
Vanderbilt [roteirista] e eu
conversamos muito, durante
anos. Estive em reuniões e os
abasteci com informações
sobre os obstáculos que enfrentariam na busca por testemunhas desaparecidas e
novas pistas. Como Fincher
e Jake, Jamie estava atrás de
algo mais do que diversão.
Ele queria capturar a essência de uma época e o sentido
da obsessão que nos atingiu.
FOLHA - Você não pensou em
escrever o roteiro?
GRAYSMITH - O único roteiro
que me sentiria qualificado a
escrever seria um sem palavras, apenas com imagens.
FOLHA - Como avalia o filme?
GRAYSMITH - Vi o filme pela
primeira vez com David Toschi (interpretado por Mark
Ruffalo). Nossas bocas se
moviam junto com os diálogos, nos sentimos como se
estivéssemos lá outra vez.
FOLHA - Seus colegas do "Chronicle" acreditavam na sua capacidade de escrever o livro?
GRAYSMITH - Não. Acho que
os repórteres do jornal ficaram surpresos, porque precisei me ensinar a escrever.
"Zodíaco" foi publicado em
1986 e se tornou um grande
sucesso, mas ele, meus livros
seguintes e os dois filmes de
que participei foram recebidos com frieza pelo jornal.
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