São Paulo, sexta-feira, 01 de julho de 2005

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CDS

FOLK

Aimee Mann aborda relação tortuosa, enquanto KT Tunstall lança CD de estréia

Cantoras inspiram cenário das lágrimas na música pop

BRUNO YUTAKA SAITO
DA REPORTAGEM LOCAL

O rock tem um rei, mas são as mulheres quem dão as várias caras ao pop mundial. Uma dessas facetas, a de rainha das dores de amor, ganha representação nas vozes de diferentes gerações: a norte-americana Aimee Mann, 44, e a escocesa KT Tunstall, 28.
Nesse território, a veterana Mann só encontra concorrente à altura na inglesa Beth Gibbons. Sua abordagem, no entanto, difere-se da depressão corta-pulsos da vocalista do Portishead, como reafirma seu quinto álbum solo, o conceitual "The Forgotten Arm".
Se, nos anos 80, Mann liderava o colorido grupo pós-new wave 'Til Tuesday, na década seguinte, ela abraçou o folk, em carreira solo. Criou um mundo onde a felicidade é artigo raro e as relações amorosas são batalhas como a do viciado que, após uma overdose, tenta se livrar da droga.
De tão reais, os temas de suas músicas inspiraram o cineasta Paul Thomas Anderson a fazer o filme "Magnólia" (1999); são as canções de Mann que guiam os personagens, todos em busca de uma inatingível redenção.
Com "The Forgotten Arm", é como se a cantora dirigisse seu próprio filme. Todas as faixas contam a história do boxeador junkie John, veterano do Vietnã, e sua ingênua namorada, Caroline, que, a horas tantas, saem da realidade comezinha de uma cidade interiorana para se aventurar estrada afora. Do conceito clássico americano dos indivíduos que tentam um novo começo em um lugar qualquer, Mann cria caminhos tortuosos que se refletem em uma atmosfera setentista, tanto musical quanto cinematográfica.
O ápice sombrio dessa relação que irá se desgastar (o título versa sobre um "braço esquecido" do lutador que fica escondido e resguardado para, em um só golpe, derrubar o adversário) vem na seqüência das faixas "Video" ("Diga por que me sinto tão mal, querido"), "Little Bombs" e "That's How I Knew This Story Would Break My Heart" ("Como um fantasma na neve, estou pronta para ir"), que colocam a cantora ora na perspectiva de John, ora na de Caroline. O disco funciona melhor como um todo, não há faixa que se sobressaia, além do belo encarte. É daquelas raras obras que reafirmam o poder de um disco em tempos de iPod.
Já KT Tunstall, apesar de nem tão nova assim, estréia com "Eye to the Telescope", ainda em busca de uma identidade, entre o folk, blues e rock. Com ascendência chinesa, ela é filha adotiva de uma família escocesa e começa a despertar o interesse do público inglês, principalmente após sua participação no programa de TV "Later" (que reúne a nata do pop).
Cantando em primeira pessoa e revolvendo casos de amor mal resolvidos, Tunstall tem potencial para agradar tanto o cenário indie ("Other Side of the World" ou "Another Place to Fall" não ficam nada atrás dos românticos Coldplay e Travis) quanto aos fãs de cantoras "sofisticadas", como Norah Jones (em "Under the Weather", canta o verso "feel like home" -disco de Jones).
Aqui e ali surgem boas canções, como "Black Horse and the Cherry Tree", em que deixa a meiguice um pouco de lado, ou "Universe & U", embaladas pelo competente produtor Steve Osborne (U2, Happy Mondays etc.). Tunstall, no entanto, sofre do mal das inúmeras cantoras contemporâneas. Em determinado momento, fica difícil diferenciar sua voz de uma Norah Jones, de uma Nelly ou Joss Stone, ao contrário do timbre personalíssimo de Aimee Mann. Enquanto isso, os súditos pop escolhem e depõem rainhas.


The Forgotten Arm
   
Artista: Aimee Mann
Lançamento: Sum
Quanto: R$ 30, em média

Eye to the Telescope
  
Artista: KT Tunstall
Lançamento: EMI
Quanto: R$ 28, em média


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