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FESTA LITERÁRIA DE PARATI
O britânico Julian Barnes, de "O Papagaio de Flaubert", é o destaque do dia
"Em Parati, eu quero esquecer a Europa"
CASSIANO ELEK MACHADO
ENVIADO ESPECIAL A PARATI
Com um papagaio empalhado,
é, um papagaio empalhado, Julian
Barnes conseguiu uma das vozes
mais originais da literatura contemporânea mundial.
Em "O Papagaio de Flaubert",
de 1984, ele fundiu ensaio, biografia e ficção em um fino romance
que conta a história de um médico obcecado por Gustave Flaubert
(1821-1880) a ponto de buscar no
autor de "Madame Bovary" todas
as respostas para sua vida.
A "trama" leva o doutor a encontrar em um museu na Normandia um louro empalhado que
teria servido de modelo para o escritor na criação do romance
"Um Coração Singelo". Ops, mas
havia outro papagaio exposto em
um segundo museu que levava os
mesmos créditos. O que é fantasia, o que é realidade?
Estavam na mesa as credenciais
que Barnes apresentaria obra afora, em até agora 14 livros (8 deles
lançados no Brasil pela Rocco):
humor, inteligência, flexibilidade
narrativa e assim por diante.
Com 57 anos, o escritor inglês
serve pela primeira vez amostras
desse coquetel pessoalmente ao
público brasileiro. Ele fala hoje às
18h em Parati, na primeira edição
da Festa Literária Internacional
da cidade fluminense, a Flip.
Na entrevista a seguir, o autor
de "História do Mundo em Dez
Capítulos e Meio" responde cinco
perguntas (e meia) da Folha.
Folha - É impossível escrever sobre sua literatura sem passar por
um elemento, o humor. Seus livros
sempre têm algo de ironia, sarcasmo ou sátira. Por que o humor ocupa um papel tão decisivo em sua
ficção?
Julian Barnes - Poderia responder de duas formas. A primeira é
que, como todos os romancistas,
eu penso em mim mesmo como
um escritor sério. Existem várias
maneiras de ser um escritor sério.
Uma delas é ser engraçado. A segunda resposta é que ser engraçado, e obrigado por achar isso de
mim, é só uma parte do que sou.
Não sento em minha máquina de
escrever e penso: "Oh, hoje preciso contar piadas". Humor e ironia
se expressam sozinhos.
Folha - O amor, e a impossibilidade de amar, é outro de seus temas
centrais, não?
Barnes - Tento nunca olhar para
meus livros como uma obra. Não
os releio e sempre que escrevo um
livro tento me esquecer dos anteriores. Claro que trato um bocado
sobre o amor, também sobre história, identidades nacionais, política e arte. Mas se pensasse em
uma lista completa isso me impediria de escrever sobre algo diferente na próxima vez.
Folha - Seu último romance,
"Amor, Etc.", foi uma retomada de
um livro seu de dez anos antes. Você pretende fazer algum outro "a
volta de"?
Barnes - Bem, deixei o final de
"Amor, Etc." ainda mais aberto
do que o de "Em Tom de Conversa", assim não ficaria surpreso se
voltasse a essa história. Mas não
posso me imaginar fazendo uma
sequência dos outros romances:
"O Papagaio de Flaubert Voa de
Novo". Não, melhor não.
Folha - Você esteve no famoso
primeiro levantamento que a revista inglesa "Granta" fez dos melhores escritores jovens britânicos, em
1983. Ao seu lado, estavam autores
como Martin Amis, Ian McEwan e
Salman Rushdie. Vocês se sentem
ou se sentiram como um grupo?
Barnes - Nunca fomos propriamente um grupo. Escrevemos livros muito diferentes. Suponho
que temos só características negativas em comum. Somos contra
uma postura insular, que pensa
pequeno, monótona. Escritores
são sempre agrupados em "novas
ondas". Mas, fora o fato de conseguirem alguma publicidade, não
acho que isso os faça felizes. Cada
um de nós pensa em si mesmo como elevados gênios imbecilmente
conectados a um bando de anões
literários.
Folha - Você é frequentemente
chamado de o mais francês dos escritores britânicos, acaba de publicar uma tradução de Alphonse
Daudet, sempre escreve sobre a
França. Qual sua opinião sobre a literatura que está sendo feita lá? É
mais forte do que a jovem prosa
britânica?
Barnes - O romance britânico está passando por uma fase interessante e bem diversa. Quão boa é
essa fase não saberemos até a nossa morte. Mesmo os críticos franceses mais patriotas defenderiam
que o romance lá não vive grande
momento. Talvez por que muita
energia intelectual foi direcionada
para a teoria literária, sociologia,
psicanálise e assim por diante,
energia que poderia teria sido
usada em romances.
Folha - O que você pretende fazer
em Parati? Falar sobre sua literatura, ler algum trecho?
Barnes - O que quero fazer em
Parati? Esquecer a Europa, comer
mariscos, falar de futebol, encontrar novas pessoas. OK, devo ler
algo de "O Papagaio de Flaubert"
e depois falar sobre meu trabalho.
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