São Paulo, sexta-feira, 01 de agosto de 2003 |
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Diretor José Henrique Fonseca diz que filme contesta tese da existência do criminoso nato assassino ACIDENTAL
"O Homem do Ano", que estréia hoje, retrata vida de homem comum que se transforma em bandido cruel SILVANA ARANTES DA REPORTAGEM LOCAL Com seu primeiro longa-metragem, que estréia hoje em cinco capitais brasileiras (São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Brasília e Porto Alegre), o diretor José Henrique Fonseca, 38, fez não um filme de tese, mas um filme de antítese. ""O Homem do Ano" é contra a teoria de Lombroso", afirma o cineasta, situando-se na oposição ao pensamento do médico italiano e teórico do direito Cesar Lombroso (1835-1909), autor da idéia do criminoso nato ("O Homem Delinquente"). Para demonstrar que ninguém nasce talhado para o crime -embora muitos não escapem de uma vida de delinquência-, "O Homem do Ano" acompanha a trajetória de Máiquel (Murilo Benício), um anti-herói surgido na literatura pela pena da escritora Patrícia Melo ("O Matador"). Morador do subúrbio, desempregado e sem perspectivas na vida, Máiquel "progride" na marginalidade quando se vê (contrariamente a suas expectativas) recompensado por um assassinato com que retrucou uma ofensa atirada em sua cara. A citação nominal a Lombroso, presente na obra literária, desaparece na versão cinematográfica, cujo roteiro foi desenvolvido pelo também escritor Rubem Fonseca, pai do cineasta estreante. Adaptação "O livro se permite ter histórias paralelas, como a questão da igreja, da banalização da violência nos meios de comunicação. Num filme, você tem de escolher uma linha. Quis fazer um filme inteiro, denso, em cima desse cara [Máiquel]", diz Fonseca -o filho, porque o pai, como se sabe, mantém há décadas uma recusa a entrevistas que, de tão sistemática, tornou-se proverbial. "Ih, dei uma informação inédita sobre meu pai", graceja o diretor, quando conta que o roteirista emprestou ao personagem de Benício um hábito que é seu -o de tomar Coca-Cola quente. Além das latinhas de refrigerante à temperatura ambiente, o implacável Máiquel convive com um porco como animal de estimação, abriga a namorada de sua primeira vítima (Érica, interpretada por Natália Lage) e casa-se com a mulher que lhe deu uma filha jamais planejada (Cledir, papel da atriz Cláudia Abreu). "É um filme bizarro, absurdo, escuro", afirma Fonseca. Por isso mesmo, a história lhe pareceu atraente. "É fácil fazer filmes com um texto ágil, um cara gostoso, inteligente, interessante, que fala rápido. Isso é fácil. Acho interessante fazer filmes sobre pessoas comuns, que não têm brilho. São essas que me interessam." Fonseca diz achar que "não haveria outro ator no Brasil" para o papel do protagonista, além de Benício. "Ele é o Garrincha dos atores. Não é técnico, é intuitivo. Mimetiza as coisas. E passa essa sensação de abandono, que é ótima para o personagem", afirma. Benício, que cogitou dirigir no cinema uma adaptação do mesmo livro, aceitou o papel preocupando-se menos com o desafio do próprio desempenho e mais com a possibilidade de fracasso de um elenco que listava, para interpretar a trinca de vilões, os humoristas Agildo Ribeiro (Zilmar) e Jorge Dória (dr. Carvalho) e o ator José Wilker (Sílvio). Ignorância "Fiquei apavorado com a idéia. Achava que nada ia dar certo", diz Benício. Filme pronto, ele diz que se sente "vendo um filme de Scorsese" ao observar a atuação de Ribeiro e conclui que "a gente tem uma ignorância muito forte quando pensa em elenco. E existe também uma preguiça de muita gente que escala. Há atores que fazem [papel de] padre há dez anos, porque não entendem que aquele ator é bom". "O Homem do Ano" foi filmado no Rio de Janeiro, numa decisão que deslocou para o subúrbio carioca a ação que, no livro, transcorre na periferia paulistana. "Filmei no Rio porque moro lá. É o quintal da minha casa. Mas esse não é um filme sobre a periferia carioca, é sobre a periferia do Brasil", diz Fonseca. Texto Anterior: Cinema: Stálin teria tentado matar John Wayne Próximo Texto: Frases Índice |
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