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Crítica/"Sobre o Islã"
Ali Kamel enfoca afinidades monoteístas
PAULO DANIEL FARAH
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Como podem [os extremistas] envolver
Deus nisso? Que
processo leva essas pessoas a
criar, a partir de uma religião
que se quer pacífica, um dos
movimentos políticos mais violentos que o mundo já viu, uma
das maiores ameaças ao nosso
estilo de vida, às liberdades essenciais do ser humano? Quem
são essas pessoas? O que elas
pensam?" Essas são algumas
das questões que Ali Kamel formula nas páginas iniciais do livro "Sobre o Islã - A Afinidade
entre Muçulmanos, Judeus e
Cristãos e as Origens do Terrorismo".
O autor se propõe uma missão dupla: ressaltar que há mais
pontos em comum do que discórdia entre as religiões monoteístas (os títulos e os subtítulos dos capítulos explicitam
questões vinculadas ao islã e
que são abordadas no texto
com analogias ao cristianismo
e ao judaísmo) e oferecer respostas a questionamentos contemporâneos complexos.
Embora as análises políticas
sejam tema de divergência (sobretudo no que concerne às
motivações de ocupações territoriais), perpassa a obra o argumento de que deturpações das
mensagens religiosas provocam ações radicais. Destarte, os
textos considerados sagrados
comportam muitos significados e as distintas interpretações geram ações e movimentos adaptados a interesses particulares movidos por "uma espécie de Alcorão sob medida".
"É evidente que há elementos de fé que não são passíveis
de discussão, como a unicidade
de Deus, para citar apenas um,
nas três religiões monoteístas.
Mas a revelação é tão rica e a vida é tão cheia de possibilidades
que, em torno de pontos imutáveis sem os quais uma fé não é
uma fé, toda sorte de nuances é
possível", afirma Kamel sobre a
diversidade do campo religioso
monoteísta.
O autor cita o historiador inglês Paul Johnson, que descreve o islã como violento com base no quinto versículo da nona
surata do Alcorão ("Matai os
idólatras onde quer que os encontreis, e capturai-os e cercai-os e usai de emboscadas contra
eles"); esse trecho corânico o
impele a uma conclusão taxativa: "Paz não é uma palavra que
possa se encaixar facilmente
nessa forma de pensamento",
alega Johnson.
Passagens do Pentateuco
Em seguida, Kamel menciona diversas passagens do Pentateuco (a Torá judaica que corresponde a parte do Antigo
Testamento cristão, seguido
também pelos muçulmanos)
que incitam à hostilidade. Uma
delas sentencia: "Se teu irmão
-filho do teu pai ou da tua
mãe-, teu filho, tua filha, ou a
mulher que repousa em teu
seio, ou o amigo que é como tu
mesmo, quiser te seduzir secretamente, dizendo: "Vamos servir a outros deuses", deuses que
nem tu nem teus pais conheceram, deuses de povos vizinhos
próximos ou distantes de ti, de
uma extremidade da Terra à
outra, não lhe darás consentimento, não o ouvirás, e que teu
olho não tenha piedade dele;
não uses de misericórdia e não
escondas o seu erro. Pelo contrário, deverás matá-lo! Tua
mão será a primeira a matá-lo
e, a seguir, a mão de todo o povo
apedreja-o até que morra..."
(Deuteronômio, 13, 7-11).
Em ambos os casos, argumenta o autor, retirar do contexto histórico a passagem provoca impressões falsas. A mensagem consiste em que, quando
o Reino da Terra assume prerrogativas e atributos do Reino
do Céu, independente da inspiração, a mistura revela-se freqüentemente explosiva.
PAULO DANIEL FARAH é professor na Faculdade
de Filosofia , Letras e Ciências Humanas da USP
SOBRE O ISLÃ - A AFINIDADE ENTRE MUÇULMANOS, JUDEUS E CRISTÃOS E AS ORIGENS DO TERRORISMO
Autor: Ali Kamel
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 34,90 (320 págs.)
Avaliação: bom
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