São Paulo, sábado, 01 de setembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crítica/"Sobre o Islã"

Ali Kamel enfoca afinidades monoteístas

PAULO DANIEL FARAH
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Como podem [os extremistas] envolver Deus nisso? Que processo leva essas pessoas a criar, a partir de uma religião que se quer pacífica, um dos movimentos políticos mais violentos que o mundo já viu, uma das maiores ameaças ao nosso estilo de vida, às liberdades essenciais do ser humano? Quem são essas pessoas? O que elas pensam?" Essas são algumas das questões que Ali Kamel formula nas páginas iniciais do livro "Sobre o Islã - A Afinidade entre Muçulmanos, Judeus e Cristãos e as Origens do Terrorismo".
O autor se propõe uma missão dupla: ressaltar que há mais pontos em comum do que discórdia entre as religiões monoteístas (os títulos e os subtítulos dos capítulos explicitam questões vinculadas ao islã e que são abordadas no texto com analogias ao cristianismo e ao judaísmo) e oferecer respostas a questionamentos contemporâneos complexos.
Embora as análises políticas sejam tema de divergência (sobretudo no que concerne às motivações de ocupações territoriais), perpassa a obra o argumento de que deturpações das mensagens religiosas provocam ações radicais. Destarte, os textos considerados sagrados comportam muitos significados e as distintas interpretações geram ações e movimentos adaptados a interesses particulares movidos por "uma espécie de Alcorão sob medida".
"É evidente que há elementos de fé que não são passíveis de discussão, como a unicidade de Deus, para citar apenas um, nas três religiões monoteístas.
Mas a revelação é tão rica e a vida é tão cheia de possibilidades que, em torno de pontos imutáveis sem os quais uma fé não é uma fé, toda sorte de nuances é possível", afirma Kamel sobre a diversidade do campo religioso monoteísta.
O autor cita o historiador inglês Paul Johnson, que descreve o islã como violento com base no quinto versículo da nona surata do Alcorão ("Matai os idólatras onde quer que os encontreis, e capturai-os e cercai-os e usai de emboscadas contra eles"); esse trecho corânico o impele a uma conclusão taxativa: "Paz não é uma palavra que possa se encaixar facilmente nessa forma de pensamento", alega Johnson.

Passagens do Pentateuco
Em seguida, Kamel menciona diversas passagens do Pentateuco (a Torá judaica que corresponde a parte do Antigo Testamento cristão, seguido também pelos muçulmanos) que incitam à hostilidade. Uma delas sentencia: "Se teu irmão -filho do teu pai ou da tua mãe-, teu filho, tua filha, ou a mulher que repousa em teu seio, ou o amigo que é como tu mesmo, quiser te seduzir secretamente, dizendo: "Vamos servir a outros deuses", deuses que nem tu nem teus pais conheceram, deuses de povos vizinhos próximos ou distantes de ti, de uma extremidade da Terra à outra, não lhe darás consentimento, não o ouvirás, e que teu olho não tenha piedade dele; não uses de misericórdia e não escondas o seu erro. Pelo contrário, deverás matá-lo! Tua mão será a primeira a matá-lo e, a seguir, a mão de todo o povo apedreja-o até que morra..." (Deuteronômio, 13, 7-11).
Em ambos os casos, argumenta o autor, retirar do contexto histórico a passagem provoca impressões falsas. A mensagem consiste em que, quando o Reino da Terra assume prerrogativas e atributos do Reino do Céu, independente da inspiração, a mistura revela-se freqüentemente explosiva.


PAULO DANIEL FARAH é professor na Faculdade de Filosofia , Letras e Ciências Humanas da USP

SOBRE O ISLÃ - A AFINIDADE ENTRE MUÇULMANOS, JUDEUS E CRISTÃOS E AS ORIGENS DO TERRORISMO
Autor:
Ali Kamel
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 34,90 (320 págs.)
Avaliação: bom


Texto Anterior: Cinema: Filme Fashion premia "Casa de Areia"
Próximo Texto: Vitrine
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.