São Paulo, domingo, 01 de novembro de 2009

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Comentário

Atração era cosmopolita entre concorrentes provincianos

TONY GOES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O "Fantástico" era indispensável. Numa época em que não havia TV a cabo e muito menos internet, o programa tinha tudo: notícias, música, humor, esporte e mais um monte de coisas difíceis de classificar. Era um rolé pelo mundo no domingo à noite, um fecho de ouro para o fim de semana. Lá em casa assistíamos todos juntos, num ritual espontâneo, igual ao de milhões de famílias.
Achávamos maravilhosa a coreografia da abertura, aquelas pessoas fantasiadas fazendo uma espécie de dança da fertilidade. Além de glamouroso, o "Fantástico" talvez tenha sido o primeiro programa não provinciano da televisão brasileira. Tinha uma visão cosmopolita, enquanto seus concorrentes na época, como Silvio Santos, falavam apenas de suas paróquias.
Era uma delícia conhecer a clínica da dra. Aslan, vibrar com os gols da rodada e ver um clipe de Elis Regina, tudo na mesma noite. Aliás, a palavra "clipe" ainda nem existia, mas o "Fantástico" foi o pioneiro do gênero no Brasil. Até então, os cantores brasileiros se apresentavam na TV sempre num palco, de microfone na mão mesmo quando faziam playback. O "Fantástico" os libertou. Era assombroso o quanto a Globo investia nessas superproduções, ainda mais porque eram exibidas uma única vez. A emissora parecia ter orgulho de gastar tanto e assim impor seu famoso padrão de qualidade.
O tempo foi passando, o mundo foi mudando e o programa também. Sumiu a zebrinha, ícone dos primeiros tempos, que anunciava os resultados da então importante Loteria Esportiva. Hoje, ela parece ainda mais tosca: nem animação 2D era. Também sumiu a música. O programa, que antes tinha espaço até para "alternativos" como Tom Zé, passou a exibir apenas trechos de trabalhos dos medalhões. Hoje, a música só dá as caras quando morre algum cantor.
E sumiu também a abertura. O programa atual começa de sopetão, sem o famoso tema. Mesmo assim, basta surgir a vinheta do intervalo para detonar na minha cabeça a letra cafona e otimista, escrita pelo Boni: "Olhe bem, preste atenção".
Não dá para cobrar do "Fantástico" a mesma hegemonia de antes. A vida se fragmentou, as opções se multiplicaram. Hoje, nossa atenção se divide em mil coisas. Com o "Fantástico" aconteceu o contrário. O caleidoscópio de antigamente hoje tem menos cores e por isso é mais difícil de ser visto.


TONY GOES , 49, é diretor de criação da Publicis Brasil


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