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"Garfield é um sucesso porque ele só come e dorme"
Jim Davis, o criador do gato, afirma que a popularidade
surgiu porque ele foge de comentários políticos e sociais
Personagem é tema de livro,
de desenhos animados
e estrelará longa que chega
aos cinemas brasileiros
em março do ano que vem
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ele é um fenômeno: gordo,
preguiçoso, mal-humorado e
cruel. Mesmo assim, freqüenta
a casa de milhões de pessoas há
30 anos. Garfield, o gato marrento criado por Jim Davis em
1978, chega às três décadas com
motivos para manter a empáfia: sua tira, publicada na Folha
e em mais de 2.500 jornais, é
das mais populares do mundo.
O personagem é uma máquina de dinheiro: está presente
em 111 países e fatura globalmente, segundo seus administradores, quase US$ 5 bilhões
por ano em produtos licenciados - 20% desse valor apenas
no mercado brasileiro, onde estreou em outubro de 1985.
Para comemorar, ele ganha
um livro, "Garfield - 30 Years
of Laughs & Lasagna: The Life
& Times of a Fat, Furry Legend!" ("30 anos de gargalhadas e lasanha", que está sendo
negociado para publicação no
Brasil), e uma série de desenhos animados, já comprada
pelo Cartoon Network e pela
Record e que deve estrear nos
próximos meses.
Também terá um longa de
animação, "A Festa do Garfield", que chega aos cinemas
brasileiros em março.
A Folha conversou, por e-mail, com Jim Davis, 63, o homem que ainda cuida pessoalmente de cada tirinha do gato
que criou inspirado em seu avô.
Para ele, o sucesso do personagem é facilmente explicável:
"Comer e dormir são coisas
que todos fazem. Além disso,
por ser um gato, ele pode ser de
qualquer raça, etnia e religião".
FOLHA - Por que o sr. deu ao personagem o nome de seu avô?
JIM DAVIS - Tinha seis anos
quando meu avô Davis morreu,
mas minhas lembranças dele
são vívidas. Ele era um homem
grande, com um colo imenso.
Parecia ranzinza por fora, mas,
por dentro, tinha um coração
mole. Era assim que eu imaginava o Garfield. Ele é fanfarrão,
mas, no fundo, é um bom gato.
FOLHA - Há muitos paralelos entre
os personagens e as situações de
"Garfield" e sua vida real? Sua personalidade entra na sua criação?
DAVIS - Eu me identifico particularmente com Jon Arbuckle,
o dono do Garfield. Quando estou escrevendo [histórias] para
Jon, tudo que preciso fazer é
me lembrar de meus dias de namoro na época do colégio. Eu
era o que mais levava foras!
Sempre esperava até o último
minuto antes de chamar alguma garota para sair, não tinha
dinheiro para bancar um encontro de verdade. Mas, tudo
bem, não dá para não gostar do
Jon, porque ele sempre olha o
lado positivo das coisas.
FOLHA - Quais foram suas inspirações como artista?
DAVIS - Quando criança, adorava o "Steve Canyon", de Milton
Caniff. Ele me abriu para mundos que eu não sabia que existiam. "Peanuts", do Charles
Schulz, foi minha maior inspiração. Amava seu humor sutil e
seu traço simples. Schulz sabia
ver o mundo com olhos de
criança, ele me ensinou o incrível poder de tratar com leveza
as coisas simples da vida.
FOLHA - Houve uma era de ouro do
"Garfield"?
DAVIS - Honestamente, gostei
de cada ano. Às vezes revejo algumas tiras e lembro, "este foi o
ano em que fiz uma operação
na coluna". Consigo rever minha vida olhando o que ocorreu
nas tirinhas. Espero que a era
de ouro ainda esteja por vir,
mas, em termos da existência
da tira, o melhor dia foi aquele
em que recebi telefonema do
sindicato de HQs dizendo que
tinham selecionado "Garfield".
FOLHA - O sr. pensou no que faria
para a tira ser universal?
DAVIS - Mantive as tirinhas livres de comentários políticos
ou sociais. Ela é impressa no
mundo todo, quero que as pessoas se identifiquem com ela
independentemente de seus
ideais políticos, por isso me ative à comida e ao sono [como temas]. Todo mundo come, todo
mundo dorme, mas nem todo
mundo vai se interessar por minha visão de mundo. Só estou
querendo entreter as pessoas.
FOLHA - Como Garfield envelheceu
à medida que o sr. envelhecia?
DAVIS - Há muito mais piadas
sobre idade na tirinha. Garfield
se dá conta de sua idade uma
vez por ano, em seu aniversário, em 19/6. Assim como eu,
ele fica progressivamente mais
resmungão cada vez que ganha
mais um ano. Garfield se recusa
a crescer, e minha mulher diria
o mesmo de mim.
FOLHA - Garfield é famoso por ser
comilão e gordo. Com a obesidade
se transformando em um grave problema de saúde nos EUA, o sr. passou a receber muitas reclamações?
DAVIS - Algumas, mas a maioria das pessoas perdoa os maus
hábitos de Garfield porque ele é
um gato. Recebi um telefonema
de alguém que achava que o
Garfield deveria fazer um vídeo
de exercícios para compensar
os maus hábitos. Garfield e
exercícios, é forçar a barra.
FOLHA - Com que freqüência o sr.
desenha? Planeja se aposentar?
DAVIS - Uma vez por mês me
reúno com dois assistentes e
trocamos idéias, rimos. Nos
concentramos nisso por três ou
quatro dias. Ainda escrevo os
roteiros, mas tenho ajuda para
desenhar. Não planejo me aposentar por ora.
FOLHA - A tecnologia mudou a maneira como o sr. cria?
DAVIS - Mudou o modo como
fazemos quase tudo, mas ainda
começamos com um rascunho
de lápis em papel, depois desenhamos em uma cartolina e aí
recebe contorno de tinta e as letras. O computador só entra no
processo quando ele é digitalizado, colorido e distribuído.
FOLHA - Que impacto a internet teve nos cartuns?
DAVIS - Um impacto imenso.
Adoro jornais e ainda gosto de
virar as páginas, mas muita
gente procura por notícias e
cartuns on-line. Nos demos ao
trabalho de criar um mecanismo de busca para
as tiras do Garfield, para que
fosse possível digitar a palavra
"café", por exemplo, e achar inúmeras tirinhas
que falam disso.
Além disso, ela
está disponível
on-line em espanhol. Um dia desses vai ser divertido animar cada
tirinha. A outra
coisa que a internet fez foi democratizar os cartuns. Qualquer
um pode publicar sua tira.
FOLHA - Do que o sr. se lembra de
suas visitas ao Brasil?
DAVIS - Estive aí duas vezes, tive um jantar memorável com
Mauricio de Sousa. Recebo
muita correspondência do Brasil, as pessoas parecem se identificar bastante com Garfield.
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